Plenária durante encontro de mulheres em Betim (MG)
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Setenta trabalhadoras da saúde estiveram presentes, nos dias 16 e 17 de janeiro, no I Encontro de Mulheres da Saúde, em Betim7hs da manhã. Mulheres chegam, com os olhos cansados, filhos no colo, malas nas mãos e muita disposição. Sim, elas são exploradas pelos patrões. Muitas passaram a noite inteira trabalhando. E não, elas não se rendem: juntam suas coisas, pegam os seus filhos e vão para a Praça da Estação, em Belo Horizonte, esperar um lugar entre os três ônibus que vão ao I Encontro de Mulheres da Saúde.

São 70 mulheres que trocaram de plantão, abriram mão do dia de folga ou passaram o turno da noite trabalhando para se organizarem contra a exploração dos patrões e a opressão machista. A maioria não trabalha em menos do que dois hospitais e não tem menos que dois filhos. No total, 105 crianças.

Auxiliares e técnicas de enfermagem, higienizadoras e profissionais da limpeza, em grande parte, e recepcionistas e telefonistas em menor número, participaram das atividades da manhã. Esta primeira parte foi toda construída à base de dinâmica, visando a conceituação e formação política trabalhando temas como opressão, exploração, sexo, gênero, capitalismo e socialismo.

Em seguida, a mesa de conjuntura composta por Iani, do Movimento Quilombo Raça e Classe, Rosângela, do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos (SP) e Ana Pagamunici, da direção nacional da Conlutas expôs a realidade da mulher trabalhadora no Brasil e no mundo.

A mulher trabalhadora da saúde
No geral, 50% da classe trabalhadora são mulheres. Na área da saúde, elas compõem 80% da mão-de-obra. Portanto, as marcas da opressão e da superexploração são muito mais gritantes.

Nos hospitais, acontece um fenômeno esclarecedor: o dono da empresa, na maioria dos casos, é homem. No entanto, as chefias de setor distribuídas por todo hospital são mulheres.

O fato de estas chefias serem mulheres não diminui a opressão, inclusive o próprio assédio moral contra as trabalhadoras da saúde. Muito pelo contrário, o fato das superiores serem mulheres acentua ainda mais o preconceito. “Minha chefe sempre diz ‘não quero mulher gorda e velha´, se ficar assim, vai ser mandada embora”, relata uma trabalhadora da limpeza. “As chefes mandam as ‘puxa-sacos´ saber tudo da vida da outra trabalhadora para desmoralizar na frente das outras”, denuncia a técnica de enfermagem.

Em relação à creche, a maioria dos hospitais ou não tem, ou oferece o auxílio-creche em quantia irrisória. E o pouco hospital que tem, vejam o que acontece: “Na Santa Casa [de Belo Horizonte] tem creche. Mas é só até 4 anos e para os filhos das chefes. Basta ficar na porta: é só carrão desfilando. A gente mesmo tem que deixar os filhos com a mãe, com o vizinho e se virar porque nunca tem vaga”, denuncia uma profissional da higienização.

Isto escancara um fenômeno que o Movimento Mulheres em Luta sempre ressalta: o corte classista do movimento feminista. Não basta ser mulher para avançar no combate à raiz da opressão. É preciso ser trabalhadora. Pois só ela e os homens trabalhadores serão capazes de destruir este sistema que oprime e explora.

Depoimento:
“A gente começa a perder o pensamento

“No [hospital] Felício Rocho, é proibido trocar plantão. Se acontecer qualquer catástrofe, não tem jeito, você tem que ir lá bater o cartão”, desabafa a auxiliar de enfermagem.

Helena* trabalhou em três hospitais durante cinco anos. “A gente começa a perder o pensamento. Era muito comum eu entrar no ônibus e não saber para onde eu estava indo. Tinha que ser tudo anotado em um papelzinho na bolsa. Se por acaso, eu o perdesse, ia parar no hospital errado”, conta a higienizadora.

Helena também contou a história de uma amiga que foi demitida por perder vários dias indo ao hospital errado: “Era dia dela ir em um, ela ia em outro. E assim sucessivamente. Até que ela foi faltando muito e não conseguia compensar os dias porque acumulava dos três hospitais. Eu a via entrar em desespero várias vezes. Hoje, ela faz tratamento sério para depressão”.

Quanto à Helena, ela afirma “agora só trabalho em dois, mas dobrado”, esclarece.

*nome fictício

Saúde que não é para todos, quem dirá para todas

“No hospital é assim: se você, paciente, tem convênio, entra pela porta da frente. Se você não tem, entra pela porta lateral. O cobertor para o convênio é o melhor; para o público é o pior; e por aí vai com alimentação, atendimento etc”, explicam as trabalhadoras.

Um fato alarmante é que a maioria das mulheres do setor da saúde privada não possui plano médico. “Se quisermos usar os serviços médicos da clínica ou hospital onde trabalhamos, temos que pagar. É descontado no nosso contracheque”, conta a trabalhadora.

Resoluções
A vitória do encontro expressou-se na disposição de muitas mulheres em construir o movimento Mulheres em Luta em seus hospitais. Uma comissão organizadora foi formada para tocar as campanhas do próximo período e construir um 8 de março feminista, classista e anti-governista.

Campanhas:
– Pela implantação de creches nos locais de trabalho e que elas atendam a todas as trabalhadoras (es). Contra a prioridade dos filhos de chefes e superiores nas creches!
– Inclusão da reivindicação da licença-maternidade de 6 meses, sem isenção fiscal, nas pautas de negociação com os hospitais, com mobilizações e campanhas específicas para isso.
– Pela redução da jornada para 30h, como medida que gera empregos e beneficia todos os trabalhadores, mas especialmente as trabalhadoras, esgotadas pela tripla jornada de trabalho.
– Combater e mobilizar contra o assédio moral e sexual freqüente no setor
– Organizar o 8 de março nas ruas.

VÍDEO – CURSO DE MULHERES DO SINDEESS (SIND. TRAB. SAÚDE BH)