Dirceu Travesso e Sebastião carlos ‘Cacau’, integrantes da Secretaria Executiva da CSP – Conlutas, também acompanharam as mobilizações na França realizadas no dia 23 de setembroCerca de três milhões de trabalhadores participaram em 230 cidades da França das manifestações contra a reforma da previdência proposta pelo governo de Nicolas Sarkozy.

Entre outras medidas, a proposta do governo retira conquistas históricas dos trabalhadores franceses e aumenta a idade mínima para aposentadoria.
Os argumentos são os mesmos dos governos capitalistas em todo o mundo: a falta de dinheiro para bancar o pagamento das aposentadorias. Motivo inaceitável, já que foram estes mesmos governos que, diante dos primeiros sinais da crise econômica imperialista internacional, entregaram trilhões dos cofres públicos aos banqueiros e às grandes empresas multinacionais.

As ameaças a essas conquistas não deixam dúvidas sobre o caráter reacionário do capitalismo e de seus governos. A ilusão vendida aos trabalhadores em todo o mundo de que um dia poderiam alcançar as conquistas dos trabalhadores europeus agora é o contrário. Os governas querem impor aos trabalhadores europeus retirada de direitos, demissões, rebaixamento salarial e diminuição dos serviços públicos. Tudo isso indica a necessidade do capitalismo, para se manter, de impor o padrão de exploração dos países de terceiro mundo. Ou pior que isso. Significa rebaixar as conquistas e direitos de todos, dos trabalhadores dos países ditos desenvolvidos e também dos outros países do mundo.

Não é à toa que no Brasil também começa a se falar da necessidade de uma nova reforma da Previdência Social com os mesmos objetivos de Sarkozy na França: retirar direitos. Mas os trabalhadores nas ruas em toda a Europa, e agora na França, demonstram que podem derrotar os governos e preservar seus direitos.

Estivemos marchando com os três milhões de trabalhadores que participaram em Paris das manifestações (dados da Intersindical, coordenação de oito centrais sindicais que convoca as manifestações). A concentração unitária ocorreu na Praça da Bastilha e de lá saíram duas marchas que cortaram a cidade.

Na concentração, a grande maioria das centrais sindicais e outros movimentos disputava espaço, cada uma com agitação própria, panfletos, carros de som e muitos balões gigantescos, não só das centrais, mas também de segmentos e categorias.
Participamos da coluna organizada por Solidaires. A marcha durou mais de três horas em direção à Praça Denfert Rochereau.

A coluna de Solidaires era das mais animadas, com forte presença de trabalhadores da saúde, PTT (correios e telecomunicações), rail (ferroviários), servidores públicos e outros setores. Havia muita gente jovem, garantindo muito entusiasmo à caminhada, impactante pela quantidade de gente, mas também pelas reações por onde passava.

Cada rua e praça por onde passava a manifestação lembrava a história de uma classe trabalhadora que, não por acaso, tem conquistas sociais das mais avançadas do mundo. No caminho, passamos pela Sorbonne, único local “protegido” pela polícia militar. Em todo o restante do trajeto não havia presença de policiais. A Praça Denfert Rochereau, local de chegada da passeata, é de onde saíram as manifestações estudantis de maio de 1968.

Durante o trajeto fomos apresentados a diversos militantes sindicais. A desconfiança nas direções majoritárias é grande, em particular na CGT, a principal central do país.

Crise institucional
Além das grandes manifestações, o governo Sarkozy vive uma grande crise. Denúncias de corrupção e escândalos de disputas entre famílias burguesas envolvendo ministros levaram o governo a contar hoje com a aprovação de somente 35% dos franceses. Índice dos mais baixos, que levou à derrota de Sarkozy nas últimas eleições regionais e aponta para mais uma derrota eleitoral nas próximas eleições nacionais.

As conversas com os manifestantes e as palavras de ordem cantadas nas colunas de cada uma das organizações refletem o debate e os desafios do momento no país. Professores, eletricitários, trabalhadores dos correios, ferroviários, aeroviários, bancários e tantos outros setores refletiam a alegria pelo tamanho da manifestação, mas também a dúvida sobre como vai continuar a luta.

Enquanto na coluna do Solidaires uma das palavras de ordem com mais força era “Todos juntos, todos juntos, greve geral”, na coluna da CGT se cantava desde os carros de som “Todos juntos, todos juntos, sim, sim”.

Essa palavra de ordem (Todos juntos, todos juntos…) foi introduzida no movimento operário pela greve dos ferroviários de 1995, que causou uma comoção nacional e “forçou” a unidade de um amplo setor de organizações e movimentos em defesa daqueles trabalhadores.

Até agora, com exceção do Solidaires, as outras centrais se negam a chamar a greve geral e defendem paralisações de um dia com manifestações.

Junto com esse debate vem outra diferença nas palavras de ordem: “retirada do projeto”, como cantavam os setores mais à esquerda e combativos, ou “não ao projeto”, como cantavam os outros setores.

No fundo, o debate sobre como conduzir a luta é: parar a França, abrindo inclusive uma crise maior com possibilidade de queda do governo Sarkozy, ou pressionar para uma negociação de alterações no projeto do governo, permitindo a reforma necessária para a burguesia e canalizando todo o processo para a via eleitoral e as próximas eleições presidenciais, via bloco PS–PC [partidos socialista e comunista].
No dia 15 de setembro foi votado e aprovado na câmara de deputados o projeto de reforma. Agora ele será votado no Senado, com previsão para meados de outubro. Os setores que defendem a via da negociação se recusaram a chamar uma manifestação no dia 15 e definiram a data de 23 de setembro.

Mais uma vez, está colocado o debate sobre a continuidade da luta e a possibilidade de derrotar a fundo os ataques do governo francês. Quem deve pagar a conta da crise? São os banqueiros e as multinacionais ou deve-se aceitar a lógica da burguesia de que os trabalhadores devem pagar a conta e negociar um ou outro detalhe no projeto?
Enganam-se os que acham que esse é um debate dos trabalhadores franceses. Está em questão na Europa a saída para a crise econômica em todo o mundo. Se os governos capitalistas europeus, particularmente o francês, impuserem esse ataque, derrotando os setores mais organizados da classe trabalhadora mundial, a burguesia e o imperialismo, como um todo, vão se fortalecer para atacar os trabalhadores e povos do mundo.

A vitória de nossa classe na Europa, ao contrário, fortalecerá a luta e a resistência em nível internacional.

Os trabalhadores da França não estão sozinhos. Estão ocorrendo mobilizações em vários outros países. Mas há dificuldades de coordenação e unificação dessas lutas, devido à política das direções majoritárias.

A CSP–Conlutas se fez presente nas mobilizações do dia 23, na França, levando nossa solidariedade de classe e buscando estabelecer contatos e fortalecer relações com setores sindicais combativos.

Post author Dirceu Travesso e Sebastião Carlos ‘Cacau’, da França
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