A histórica resistência do povo palestino vem dando sinais, há alguns anos, de que caminha para uma nova intifada (levante popular). Podemos estar no início da terceira intifada (a primeira foi entre 1987 e 1993 e a segunda, de 2000 a 2004). É preciso que os sindicatos, os partidos de esquerda e o movimento de massas de todo o mundo apoiem decididamente essa luta.

O fracasso dos Acordos de Oslo
Há mais de 67 anos – desde a nakba (catástrofe) palestina, com a criação do Estado de Israel em 15 de maio de 1948 –, o povo palestino enfrenta uma contínua limpeza étnica, com ordens de demolição de suas casas, expulsão, apartheid, colonização e ocupação.

A vitória do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu nas últimas eleições israelenses expôs com mais clareza a política israelense que vigora desde sempre, de garantir Israel, em toda a Palestina histórica, como um Estado sionista homogêneo, portanto, sem palestinos.

Para dar um ar “democrático” perante o mundo, Israel não pode exterminar todos os palestinos. Assim, busca manter uma minoria sem direitos, em guetos, como fazia o regime do apartheid da África do Sul, para servir de mão de obra barata. Mas o extermínio continua, seja via bombardeios periódicos em Gaza, seja via ataques de colonos na Cisjordânia, seja via envenenamento dos presos nos cárceres israelenses, seja via limpeza étnica nos campos de refugiados ao redor – com a colaboração de regimes árabes, como o de Bashar Al Assad e a monarquia jordaniana – ou a imposição de uma vida miserável.

A política do imperialismo para a região se expressa nos acordos de Oslo, firmados em setembro de 1993 entre o governo de Israel e o presidente da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), Yasser Arafat. Hoje se expressa com clareza perante o mundo o fracasso dessa política. A opressão sobre os palestinos aumentou, a miséria também. Mais de 20 anos depois, os resultados são mais de 7 mil palestinos mortos, mais de 12 mil casas destruídas. Entre 1993 e 2000, o número de assentamentos israelenses construídos dobrou e hoje é de 600 mil. Esses assentamentos são ocupações de territórios palestinos por israelenses armados até os dentes e apoiados pelo exército  sionista. Israel desvia a água dos palestinos para esses assentamentos. Existem efeitos catastróficos para a economia palestina pelo fechamento das fronteiras aos trabalhadores palestinos, que seriam substituídos por novos imigrantes russos. Em 1993, segundo escreve a jornalista Naomi Klein, o PIB per capita nos territórios ocupados despencou quase 30%. A pobreza entre os palestinos subiu 33%. Em 1996, 66% da força de trabalho palestina estava desempregada ou subempregada. Oslo representou menos trabalho, menos liberdade e menos terra.

Os palestinos vivem hoje uma situação semelhante a que os judeus sofriam no gueto de Varsóvia sufocados pelos nazistas. Trata-se de um crime contra os palestinos e um crime contra a humanidade.

A gestação de uma nova intifada
Para enfrentar o governo Netanyahu – que desmascara o apartheid e estimula os ataques de colonos a palestinos – e o fracasso dos acordos de Oslo, a heroica juventude palestina vem protagonizando um processo de resistência rumo a uma nova Intifada.

Os sintomas dessa terceira Intifada vêm sendo sentidos desde 2011, como um dos sinais de ascenso do processo revolucionário no mundo árabe. Naquele ano, em 15 de maio (aniversário da nakba), milhares de refugiados – sobretudo jovens – marcharam dos campos na Jordânia, Síria, Líbano e Egito rumo às fronteiras da Palestina ocupada, expondo ao mundo que, desde a criação do Estado de Israel, seu legítimo direito de retorno às terras de onde sua família foi expulsa tem sido negado. O movimento foi reprimido violentamente pelos governantes árabes. Depois, a luta palestina acompanhou os ascensos e descensos do processo revolucionário no mundo árabe, ficando por vezes em compasso de espera.

Em 2014, a nova ofensiva israelense em Gaza foi respondida por uma resistência heroica vinda não só dessa estreita faixa. Grandes mobilizações na Cisjordânia, Jerusalém Oriental e nos territórios ocupados pelo estado de Israel desde 1948 sinalizaram que o processo rumo a uma nova Intifada não havia arrefecido.

Na noite de 24 de julho de 2014 e durante o dia seguinte, 25 mil palestinos foram às ruas na Cisjordânia. O canto mais popular entre a juventude era “Oh Qassam, Oh habib, Bombardeie Tel-Aviv”, o que mostrava uma moral alta e combativa (Ezzedine al-Qassam é o nome das brigadas militares do Hamas, responsável pela maioria dos foguetes lançados contra áreas ocupadas por Israel desde 1948).

A principal manifestação reuniu 10 mil pessoas em Qalandia (vila entre Ramallah e Jerusalém que abarca um campo de refugiados palestinos e também o mais importante checkpoint do exército israelense). O exército israelense abriu fogo contra os manifestantes, assassinando cinco palestinos. Em outras cidades também houve mortes. Dois manifestantes foram assassinados em Hawara, perto de Nablus, e outros três em Beit Omar, próximo a Hebron. Mustapha Barghouti, deputado palestino e secretário-geral da Iniciativa Nacional Palestina, afirmou que foi a maior manifestação palestina em toda a história da Cisjordânia.

Essa mobilização foi precedida por outras quase diárias desde o assassinato do jovem palestino Mohammad Abu Khdeir, queimado vivo em Jerusalém por três jovens sionistas, e dos bombardeios contra Gaza, que foram seguidos por invasão terrestre.

Em 2015, o impulso para uma nova intifada tomou um novo fôlego. O jornalista palestino Ahmad Melhem, em reportagem para o site Al-Monitor, descreve que nos dias 11 e 12 de julho houve manifestações que foram reprimidas pelas forças israelenses em 30 cidades e vilas palestinas, tanto na Cisjordânia como em Jerusalém e nos territórios ocupados em 1948. Os confrontos foram particularmente violentos em Belém, Hebron, Jerusalém e Ramallah. O famigerado checkpoint em Qalandia foi atacado com pedras e coquetéis molotov, levando à sua tomada pelos manifestantes por um curto período.

Nos territórios ocupados em 1948, as primeiras manifestações foram na Galileia, com confrontos com a polícia israelense em Nazareth, Arara, Umm al-Fahem, Taybeh e Qalanswa. A polícia usou gás lacrimogêneo e balas de borracha enquanto manifestantes queimavam pneus e cantavam em árabe “o povo quer o fim de Israel”. Na sequência, as manifestações se alastraram para outras cidades e vilas palestinas, como Haifa e Jaffa, e no Naqab (Negev).

Em 30 de julho, em Duma, Nablus, um colono israelense botou fogo na casa de uma família palestina, queimando-os vivos. Um bebê de 18 meses, seu irmãozinho de quatro anos e a mãe morreram. A intensificação de ataques de colonos israelenses a palestinos nos últimos meses e a violação de um dos principais locais sagrados para muçulmanos, a Mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, acelerou esse processo rumo à terceira Intifada.

Existe a possibilidade de que essa intifada, caso se concretize, atinja uma dimensão maior, por vários motivos.

Em primeiro lugar, porque desde seu início está atingindo os territórios palestinos tomados em 1948, e não só Gaza e Cisjordânia (anexados em 1967) como nas duas anteriores. Em segundo lugar, porque pode incorporar – além das heroicas ações da juventude palestina – também a mobilização direta dos trabalhadores palestinos. A greve geral de um dia dos trabalhadores de Hebron em outubro passado foi uma expressão dessa possível dinâmica.

Em terceiro lugar, porque o isolamento político de Israel em nível mundial é crescente, apesar de todo o apoio dado pelo imperialismo e a grande imprensa burguesa. Durante a última invasão de Gaza, por exemplo, Israel perdeu a batalha pela consciência das massas no mundo. As declarações de Netanyahu responsabilizando os palestinos pela solução final de Hitler e repudiadas até por aliados demonstraram não somente as mentiras desse dirigente assassino, mas também que não se pode esperar nada desse Estado. Ao lado de Netanyahu, disputam a popularidade lideranças como Lieberman, que propõe abertamente a expulsão sumária de todos os palestinos de todo o território que lhes pertence. O caráter nazi-fascista desse Estado está se revelando com mais força.

Por esses motivos, é possível que uma terceira Intifada tenha mais peso na região e em todo o mundo.

Revoluções árabes e resistência palestina: uma só luta
Não é possível dissociar este movimento do processo revolucionário no mundo árabe. Os poderosos inimigos da causa palestina, denunciados pelo revolucionário palestino Ghasan Kanafani ao analisar a revolução de 1936-1939, continuam atuais: a burguesia palestina, os regimes árabes e o imperialismo/sionismo.

 

A maior parte da esquerda em todo o mundo declarou o fim da revolução árabe, pelos impasses e refluxos conjunturais que existem em todos os processos revolucionários. Essa nova intifada é mais uma demonstração de que estão completamente errados.

Na busca por estabilidade na região, o que garante a segurança de Israel, tenta-se sufocar a revolução na Síria a todo custo. Após a rápida queda de quatro ditadores – na Tunísia, no Egito, no Iêmen e na Líbia – com a Primavera Árabe inaugurada no final de 2010, o imperialismo intervém direta e indiretamente para conter o efeito dominó. O Estado Islâmico é um elemento contrarrevolucionário, que termina por fazer o jogo do imperialismo e facilitar sua intervenção militar. Na Síria, a revolução que busca derrubar o ditador sanguinário Bashar Al Assad se transformou em guerra civil em 2011. O pretexto construído pelo imperialismo, de que se combate o Estado Islâmico, agora tem servido para a Rússia e aliados do regime sírio bombardearem as áreas livres do jugo de Bashar Al Assad que restam.

A Rússia e os  EUA concretizaram um acordo militar entre ambos os países para “coordenar ” o uso do espaço aéreo na Síria, uma divisão de tarefas em que “você bombardeia aqui e não ali”.1 Rússia, EUA e Israel estão em coordenação militar na Síria para sufocar a luta contra o ditador Assad.

Aqui se revela a farsa da esquerda castro-chavista que defende o ditador sírio Assad como “anti-imperialista”. O genocida Assad, que está destruindo o país, matando e expulsando milhões de pessoas para se manter no poder, está sendo sustentado pela aliança militar dos EUA e da Rússia, com apoio também de Israel. O mesmo Assad que cercou e quer destruir o campo de refugiados de Yarmuk (bastião histórico da resistência palestina na Síria). O mesmo Estado de Israel que massacra os palestinos ajuda a manter Assad.

Agora, uma nova Intifada deve representar um novo ascenso no mundo árabe, podendo ajudar a reativar a resistência em toda a região. Isso teria uma enorme importância devido à autoridade política dos palestinos em todo o mundo árabe. Os sinais estão crescendo, como em 16 de outubro na Jordânia: em diversas cidades, houve grandes manifestações exigindo o fim dos acordos com Israel.

Por um único Estado palestino, laico e democrático
À diferença das duas Intifadas palestinas anteriores, o movimento rumo a um novo levante popular agora se dá sem qualquer liderança e, indiretamente, questiona sobretudo a colaboração da Autoridade Nacional Palestina (ANP) com Israel. A juventude não se vê representada por nenhum partido tradicional. A juventude, aliada à classe trabalhadora, precisa construir, em meio a esse processo, uma direção revolucionária para levar adiante a luta pela libertação da Palestina.

É no calor da luta contra a ocupação que há condições de se forjar uma nova liderança para o movimento palestino, uma liderança que rejeite a conciliação com o inimigo e unifique o povo palestino na perspectiva de libertação de todas as terras palestinas, do rio ao mar.

A solução para contemplar a totalidade dos palestinos, cuja maioria vive fora de suas terras, é um Estado único palestino, laico, democrático, com direitos iguais para todos e todas que queiram viver em paz com os palestinos. Isso implica a destruição do Estado nazi-fascista de Israel. A convivência de um Estado palestino com o Estado de Israel – como foi definido nos acordos de Oslo – se mostrou impossível, como sempre afirmamos.

Não se pode conviver com o fascismo, é preciso destruí-lo. Não se conseguiu conviver com o nazismo, foi necessário derrotá-lo. Não se trata de um conflito religioso, mas da necessária destruição do Estado de Israel, bastião militar do imperialismo no mundo árabe. É possível que os judeus e muçulmanos convivam pacificamente em um Estado palestino laico e democrático, como já viveram no passado.

Solidariedade
A solidariedade internacional é um elemento fundamental. É necessário que todos os sindicatos e partidos de esquerda denunciem as atrocidades do Estado israelense. É preciso construir dias internacionais de luta articulados com as mobilizações palestinas. É fundamental a mais ampla unidade de ação em solidariedade à luta palestina.

É possível e necessário debater as diferenças programáticas entre todos os setores democraticamente, sem que isso impeça a mais ampla unidade de ação contra o Estado israelense.

Junto com isso, pode-se fortalecer campanhas como a do BDS (boicote, desinvestimento e sanções) a Israel. É crucial somar-se à campanha global para impedir sua presença nas Olimpíadas de 2016 no Brasil. Com apoio do governo brasileiro, uma empresa de segurança israelense está prevista para atuar no megaevento.

A LIT coloca-se ao lado da resistência palestina incondicionalmente e se soma às ações em todo o mundo em apoio a sua luta.

Nota:

1- http://www.elmundo.es/internacional/2015/10/17/5621d2e946163fd80a8b45e6.html