Estudantes ocupam Reitoria contra a presença da PM no campus

No ano em que relembramos 50 anos do golpe que instaurou a ditadura militar no país, vimos essa semana, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), uma cena digna desse período nefasto da história brasileira. Na tarde da terça-feira (25/03), policiais federais à paisana entraram na universidade para revistar e deter estudantes que estavam no bosque e dentro da cantina do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH).
 
Surpreendidos, professores, estudantes e técnicos presentes no centro de ensino se reuniram ao grupo detido, exigindo dos policiais que se identificassem e explicassem o ocorrido. A polícia teve uma atitude altamente agressiva, desrespeitosa e irredutível: ao invés de se propor a dialogar, chamou reforços da PM e da tropa de choque, cujo papel único, já sabemos, é reprimir.
 
O que se seguiu foi uma cena de campo de guerra: de um lado policiais federais e a PM atirando bombas, balas de borrachas, gritando, ofendendo. De outro, a comunidade universitária tentando se defender e exigindo a retirada das tropas do campus. O uso de gás foi tão forte que as crianças das duas creches do campus tiveram que ficar presas dentro de salas reduzidas para que não se intoxicassem já que o ataque aconteceu no horário da saída das aulas. Vários estudantes foram feridos por balas e destroços de bombas. Dezenas apanharam de cassetetes. Cinco foram presos.
 
Reitoria ocupada
Exigindo da reitora Roselane Neckel uma solução imediata para o problema da polícia no campus, cerca de 300 estudantes ocuparam a reitoria por tempo indeterminado. Além do fim da PM no campus, os estudantes pedem mais iluminação, criação de um sistema de segurança universitário, fim da proibição de festas e outras pautas de permanência estudantil. Também começou na internet e nas assembleias uma campanha de Fora Cassiano, delegado responsável pela ação. Nessas primeiras 24 horas de ocupação, já foram realizadas quatro assembleias, com um grande número de estudantes, mostrando a legitimidade do movimento e a sua organização.
 
Apesar de Roselane dizer que não sabia, foi amplamente divulgado um documento onde a reitora autoriza previamente a entrada da polícia quando solicitada pela instituição ou mesmo quando chamada pelo número 190. Ou seja, apesar das declarações, Roselane já havia se manifestado em favor da presença da PM e, inclusive, autorizado sua entrada na universidade. Em outro episódio, durante a abertura do segundo semestre de 2013, em aula magna, a reitora se propôs a discutir segurança no campus e chamou a compor à mesa, além do departamento de segurança da UFSC, um representante da PM, comprometendo-se, durante o debate, a estreitar laços entre as duas instituições.
 
Apesar de todo o discurso de democratização da universidade na campanha da reitora, Roselane prefere fazer a discussão com a polícia e a imprensa, ao invés de fazê-la com o movimento. Foi assim também com a colocação de portões para fechar o campus em plenas férias acadêmicas e sem discussão nenhuma com a comunidade universitária. Apesar do pronunciamento público de Roselane, a ocupação se mantém pela falta de comprometimento da reitoria com a pauta dos estudantes. 
 
Fora polícia do campus
A luta contra a presença da PM no campus é histórica no movimento estudantil e de trabalhadores da universidade. Criada pela ditadura militar, a PM tem uma história de autoritarismo e de repressão aos movimentos populares. A polícia militar paulista, por exemplo, carrega um brasão com 18 estrelas representativas de momentos “memoráveis”, como o golpe militar de 1964 (chamado “Revolução de Março”) e a repressão à revoltas populares como a greve de 1917 e o massacre de Canudos. No Rio de Janeiro, o caso de Cláudia, trabalhadora arrastada pelas ruas por um carro da PM e de Amarildo, pedreiro morto na rocinha, são emblemáticos.
 
Não é possível que em um ambiente acadêmico, de estudo e extensão universitária, de livre difusão de ideias críticas, seja permitida a entrada da polícia para abordar e reprimir trabalhadores e estudantes. Longe de significar mais segurança, a polícia no campus significa violência e privação da liberdade. A reitoria Roselane deve se comprometer não só com a proibição da PM, mas também de qualquer instituição policial. Só pode haver comprometimento sério com a autonomia universitária se essa reivindicação for atendida.
 
Queremos uma universidade segura, mas para isso defendemos outras alternativas: mais iluminação no campus, ocupação de seus espaços pela população e abertura de no mínimo 12 horas contínuas dos setores, contratação e treinamento de uma guarda universitária concursada, que seja composta por funcionários treinados para a identificação e prevenção dos problemas de segurança de pessoas e não de patrimônio, em especial com um corpo feminino que responda aos casos de violência contra as mulheres. Também é necessário realizar um amplo debate em favor da legalização das drogas dentro e fora da universidade.