As armas são escassas. A comida também. Para se proteger dos ataques químicos do regime, há poucas mascaras de gás. Mesmo assim, os revolucionários sírios que batalham o regime tirânico de Bashar Al Assad seguem firmes em sua luta.
 
A recente onda de vitórias militares do regime sírio, boa parte da qual ocorreu com ajuda direta de grupos armados estrangeiros, como a milícia libanesa Hezbollah, tem elevado a moral dos apoiadores da ditadura. Tais ganhos, somados ao discurso triunfalista de Assad, têm imposto a impressão de que o regime caminha a uma vitória militar sobre a revolução.
 
Esta linha, por exemplo, foi expressa pelo mais importante dos generais norte-americanos, o chefe do Estado-Maior, Martin Dempsey. Segundo Dempsey, há uma a favor de Assad, que dificilmente será derrotado pela oposição. Segundo tal raciocínio, qualquer medida militar que não seja uma invasão total dos Estados Unidos à Síria não teria sentido. Afinal, para que armar uma guerrilha que irá perder?
A realidade no campo de batalha, porém, é outra. Apesar de o regime ter reconquistado territórios na região central do país, avanços importantes dos rebeldes no norte e, principalmente, na capital Damasco, revelam o outro lado da guerra: como pequenas melhoras nos armamentos dos revolucionários acabam produzindo enormes avanços na luta pela libertação da Síria.
 
Foi isto o que ocorreu quando o Exército Livre da Síria (ELS) e seus aliados conquistaram armazéns militares do regime próximos à capital. A partir destes saques, as brigadas da região de Damasco passaram a contar com modernas armas anti-aéreas que as potências ocidentais negam fornecer ao rebeldes.
 
Contra todas as expectativas de que os mesmos seriam incapazes de manusear o equipamento, em poucos meses os revolucionários já estavam derrubando os aviões e helicópteros da ditadura, revertendo, assim, a conjuntura militar na capital. Bairros próximos ao centro da cidade, como Jobar, Salhiye e Bab Touma, tidos como preciosos para o regime, hoje estão sendo disputados pelos rebeldes. Esta nova realidade é produto direto das novas armas.
 
O desequilibro tecnológico brutal que separa Assad de seus inimigos é hoje o único elemento que tem garantido a sobrevivência do regime. O tirano conta, em seu arsenal, com caças MiG e helicópteros de ataque, armamentos que lhe garantem supremacia no ar. O ditador tem em suas mãos tanques de baixo, médio e alto poder de fogo, além de peças de artilharia moderna e munição ilimitada.
Os revolucionários, que carecem dos armamentos mencionados, sequer possuem meios adequados para combatê-los, como as armas antiaéreas recém capturadas em Damasco. Para piorar a situação, sofrem com crises crônicas de abastecimento. Durante a principal ofensiva da oposição em Aleppo, no norte da Síria, os rebeldes abortaram seus avanços porque literalmente não tinham mais balas.
Segundo A., um ex-operário, hoje dirigente de um dos batalhões de Damasco, a inflação no mercado ilegal, sua principal fonte de armas, impede um armamento adequado de seu batalhão. “Um lote de 30 magazines para um fuzil AK-47 [mil balas] custa hoje, em média, US$ 1.400”, afirma o guerrilheiro. “Durante o início da revolução, custava mais o menos US$ 200”, diz.
 
“Para enfrentar a principal arma do arsenal de Assad, o tanque T-72, de fabricação russa”, explica o dirigente, “precisamos de bazucas de tipo LPG-N29”. O preço deste equipamento é de US$ 70 mil.
Em meio ao isolamento, a capacidade de revolucionários como A. de arrecadar fundos para comprar armamentos é pequena. Afinal, além das demandas militares, cabe aos lutadores sírios alimentar sua própria base social, que sofre as dores da fome e da falta de abrigo causadas pela guerra.
 
Soma-se a isso o fato de terem de equilibrar uma precária unidade de ação com grupos islamitas ultrarradicais, normalmente melhor armados. Organizações como a filial da Al Qaeda na região, o Estado Islâmico do Iraque e Grande Síria, têm fontes de financiamento muito mais sólidas, vindas dos países do golfo, do que grupos como o Batalhão da Unidade, dirigido pro A.
Ao Estado Islâmico, mais interessa matar muçulmanos integrantes de seitas minoritárias, como os alauítas, grupo ao qual se integra a família do ditador Bashar Al Assad, do que avançar a luta por uma Síria democrática e livre. Sua luta apenas se confunde com a revolução síria, sendo ela, na essência, distinta.
 
Em algumas zonas revolucionárias libertas do julgo da ditadura de Assad, os islamitas radicais têm tentado impor suas próprias leis e concepções de mundo. Porém têm enfrentado dura resistência, não só de grupos armados como o Batalhão da Unidade, mas também de organizações da juventude, como a União dos Estudantes Livres da Síria, que participou do segundo congresso da Assembleia Nacional de Estudantes – Livre (ANEL), no Brasil, ou dos ativistas palestinos do Comitê de Coordenação Local do campo de refugiados de Yarmouk, convidados especiais da CSP-Conlutas no Fórum Social Mundial da Tunísia, ocorrido em março deste ano.
 
Yarmouk é um espaço de importância simbólica na resistência à ditadura Assad. Principal campo de refugiados palestinos da Síria, o espaço era usado como carta política pela ditadura para dar-lhe o verniz de regime anti-imperialista. Desde o início da revolução, o campo de refugiados se levantou contra Assad, sendo violentamente bombardeado desde então.
Em meio à destruição e morte causadas pela guerra, a força política e moral da solidariedade operária é muitas vezes decisiva. Apoiar setores com o Batalhão da Unidade, a União dos Estudantes Livres da Síria ou o Comitê de Coordenação Local de Yarmouk é certamente a tarefa central de qualquer revolucionário internacionalista. Mãos a obra!

Post author Aldo Sauda, correspondente no Oriente Médio
Publication Date