“Nós não nos entregamos ao desespero por conta do fato de que a guerra rompera a Internacional. A época revolucionária criará novas formas de organização – surgidas dos recursos inesgotáveis do socialismo proletário –, novas formas à altura da grandeza dos novos desafios. Nós nos dedicaremos a este trabalho imediatamente, sob o rugido das metralhadoras, a derrubada das catedrais e o brado patriótico dos lacaios do capital.”

Assim escrevia Trotsky em 1915. Em não mais do que dois anos, a vida lhe deu a razão. Novas formas de organização, adequadas aos novos desafios colocados, surgiram da revolução. Como dizia Lenin, já não se tratava de fazer propaganda do socialismo, tratava-se agora de tomar o poder para começar a construí-lo de fato.

Para esse novo desafio era necessária uma nova ferramenta: um partido cujos militantes assumissem a revolução como profissão, que atuasse com estrita disciplina para poder enfrentar poderosos inimigos (o governo, o imperialismo, a burguesia, as burocracias) e que, ao mesmo tempo, desenvolvesse a mais ampla democracia interna para operar sua política.

Essa nova ferramenta se concretizou: o partido bolchevique impulsionado por Lênin, baseado no centralismo democrático, que garantiu que os operários tomassem o poder, com a revolução russa, em outubro de 1917.

No calor dessa grande revolução – e adotando a estrutura partidária bolchevique – nasceu a Terceira Internacional, ou Internacional Comunista (IC), que foi, com o partido bolchevique, a maior conquista organizativa do movimento operário em sua história.

A fundação da Terceira Internacional
Quando estourou a revolução de 1917, os elementos mais ativos da esquerda foram à Rússia. Assim, o centro da luta por uma nova Internacional se transferiu para esse país.

Em 24 de janeiro de 1919, o comitê central do Partido Comunista Russo (nome que assumiram os bolcheviques), as direções estrangeiras (que estavam na Rússia) dos partidos comunistas polonês, húngaro, alemão, austríaco e letão, e os comitês centrais dos partidos comunistas finlandês, da Federação Socialista Balcânica e do Partido Socialista Operário Norte-Americano, lançaram o seguinte chamado: “Os partidos e organizações abaixo-assinados consideramos como uma necessidade imperiosa a reunião do primeiro congresso da nova Internacional revolucionária. Durante a guerra e a revolução, não somente se manifesta a completa bancarrota dos velhos partidos socialistas e social-democratas e, com estes, de toda a Segunda Internacional, senão, também, a incapacidade dos elementos centristas da velha social-democracia de ação revolucionária. Ao mesmo tempo, distinguem-se os contornos de uma verdadeira Internacional Revolucionária”.

O desafio proposto nesse primeiro congresso é a “criação de um organismo de combate, encarregado de coordenar e de dirigir o movimento da Internacional Comunista e de realizar a subordinação dos interesses dos movimentos de diferentes países aos interesses gerais da revolução internacional”.

O primeiro congresso, realizado em plena guerra civil entre 2 e 6 de março de 1919, é aberto com um discurso de Lênin que se inicia assim: “Por mandato do comitê central do Partido Comunista Russo, declaro aberto o primeiro congresso da Internacional. Antes de mais nada, peço-lhes que nos levantemos para honrar a memória dos melhores representantes da Terceira Internacional: Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo”. Esses dois grandes revolucionários acabavam de ser assassinados por ordens do governo alemão, em mãos do social-democrata Ebert.

No ano seguinte, aderiram à Internacional Comunista o Partido Socialista Italiano, o Partido Operário Norueguês e o Partido Socialista de Esquerda Húngaro.

A luta contra o oportunismo
O segundo congresso reuniu-se em Petrogrado em 17 de junho de 1920. A discussão principal centrou-se no caráter dos partidos.

Com o avanço da Internacional, apareceram novos problemas. Os partidos que vinham aderindo não estavam completamente formados. Não existia ainda clareza sobre o que era um partido, o papel dos comunistas nos sindicatos, a atitude frente ao parlamentarismo e outras questões. Ao mesmo tempo, uma série de dirigentes oportunistas, que não tinham nada a ver com a revolução, introduziam-se nesses partidos para aproveitar os efeitos do triunfo de outubro.

Diante de tal realidade, a direção da Internacional vê a necessidade de “separar o joio do trigo”, para avançar na construção de um verdadeiro partido revolucionário mundial. Com esse objetivo votam-se as ditas “21 condições”.

Nessas 21 condições exigia-se: a imprensa deveria estar submetida ao comitê central do partido. A propaganda e a agitação dos partidos deveriam ter um caráter comunista. Os reformistas deveriam ser descartados de todos os postos importantes. Realizar uma luta enérgica contra reformistas e centristas. Desenvolver trabalho no campo, com os proletários rurais e camponeses pobres. Denúncia do próprio imperialismo e apoio aos movimentos de libertação nacional. Trabalho nos sindicatos. O partido deveria funcionar em base ao centralismo democrático e tomar o nome de partido comunista (seção da Internacional Comunista).

Todos os partidos da Internacional ou que quisessem aderir deveriam realizar congressos extraordinários para discutir as 21 condições e se deveria excluir do partido todos que as recusassem, em até quatro meses após o congresso.

O congresso terminou em 7 de agosto. Nesse mês, o partido social-democrata tchecoslovaco dividia-se: uma maioria esmagadora adotou as 21 condições. Em outubro, a maioria do partido social-democrata independente da Alemanha aderiu à Internacional Comunista, fundindo-se à Liga Spartakus (o partido de Rosa Luxemburgo, que já pertencia à Terceira Internacional) e constituindo um grande partido comunista unificado. Em dezembro, a maioria do partido socialista francês adere à Terceira. Em janeiro de 1921, divide-se o partido socialista italiano e a maioria recusa as 21 condições.

A luta contra o sectarismo
O terceiro congresso, que se reuniu em junho de 1921, teve que resolver os novos problemas do crescimento. A Internacional já tinha mais de 50 seções e alguns partidos de massas nos principais países europeus. Isso provocava questões de tática e de organização. Mas os problemas tinham a ver com a mudança da relação de forças.

A partir do balanço crítico dos fatos de março de 1921 na Alemanha e da política ultra-esquerdista do partido alemão, abre-se uma discussão sobre a nova situação da luta de classes em nível mundial e sobre as novas táticas que os partidos deveriam implementar.

A burguesia tinha se mostrado mais capaz de resistir do que se poderia acreditar. Sua principal força repousava nos dirigentes da social-democracia, que durante a guerra traíram o proletariado e que após a guerra se mostraram como os melhores defensores do capital em crise.

Isso permitiu às burguesias recuperar-se e lançar uma nova ofensiva contra os trabalhadores. Em 1920, surgiu uma crise no Japão e na América que se estendeu a todas as nações industrializadas. Milhões de operários foram jogados no olho da rua. As lutas defensivas foram imensas, mas derrotadas.

Essa nova realidade exigia duas importantes alterações táticas, que tiveram que enfrentar posições sectárias e ultra-esquerdistas que vinham se desenvolvendo em vários partidos da Internacional.

A primeira tinha a ver com a necessidade de dar grande importância às reivindicações concretas das massas. “Toda objeção contra levantar reivindicações parciais desse gênero, toda acusação de reformismo sob pretexto das lutas parciais, partem desta mesma incapacidade em compreender as condições vivas da ação revolucionária, a qual se manifestou já na oposição de certos grupos comunistas à participação nos sindicatos e à utilização do parlamento. Não se trata de pregar sempre ao proletariado os objetivos finais, senão de fazê-lo avançar em uma luta concreta que só possa conduzi-lo à luta por tais objetivos finais.”

A segunda tinha a ver com a necessidade de unificar a classe operária para enfrentar o ataque da burguesia e daí então surgiria o primeiro esboço-proposta da Frente Única Operária, que consistia no chamado às direções traidoras dos sindicatos e partidos operários a formar uma frente unitária para enfrentar os ataques do capital. Esta tática tinha um duplo objetivo: conseguir a unidade para lutar e desmascarar as direções traidoras frente a sua base para disputar-lhes a direção.

No quatro congresso, reunido em novembro de 1922, continuou a batalha contra os setores ultra-esquerdistas que se negavam a apresentar uma política para as direções traidoras do movimento operário. Foi aprovada a tática da Frente Única Operária propondo-a como a tática central para enfrentar a nova ofensiva do capital expressada pelo desenvolvimento do fascismo.

O desafio que a Terceira não pôde enfrentar
Em quatro anos, a IC realizou quatro congressos. Suas resoluções apresentaram análises e ofereceram respostas principistas sobre a democracia burguesa, o parlamentarismo, o trabalho nos sindicatos, a frente única operária, a organização partidária, a questão negra, o trabalho em mulheres, o governo operário.

Assim, nesses difíceis quatro anos, foram-se forjando as bases essenciais de um programa revolucionário mundial. O que faltava era sistematizá-lo. O quarto congresso votou essa tarefa, mas não pôde enfrentar tal desafio. Pouco tempo depois começaria o processo de burocratização que terminou com a degeneração do Estado soviético, do partido bolchevique e de toda a Terceira Internacional.

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