A primeira turma do seminário “Gênero e Classe”, promovido pela Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT-QI), reuniu cerca de 50 militantes entre os dias 12 e 15 de julho, no interior de São Paulo. Os objetivos foram debater a opressão machista e, particularmente, avançar na elaboração teórica necessária para este combate.

Devido ao enorme interesse que a atividade despertou, outras duas novas turmas serão realizadas. A próxima contará com a participação de representantes de partidos filiados à LIT nos principais países da América Latina e da Europa e a seguinte será destinada aos militantes do PSTU nas regiões Norte e Nordeste. Também foram feitos convites para representantes de organizações nacionais e internacionais com as quais a LIT mantém relações políticas.

Como lembra Cecília Toledo, autora de “O gênero nos une, a classe nos divide”, da Comissão de Mulheres da LIT e uma das coordenadoras da atividade,“este seminário tem importância não só pelo seu tema, mas também por fazer parte do processo de reconstrução da LIT e suas seções; parte importante disso tem a ver com a elaboração teórica sobre os grandes temas da atualidade, pois, como já dizia Lênin, não há política revolucionária sem teoria revolucionária”.

Ainda segundo Cecília, se debruçar sobre o tema das mulheres neste momento também é de suma importância: “Hoje a maioria do movimento feminista prega que é possível lutar contra o machismo sem uma política classista, que é possível emancipar as mulheres sob o capitalismo. Ter bases teóricas para contrapor tal postura é fundamental para que possamos elaborar políticas que possam mobilizar as mulheres trabalhadoras”.

Estudo a serviço da luta
Já Ana Rosa Minutti, da Secretaria de Mulheres do PSTU, destaca que atividades como estas devem ser uma constante na vida dos revolucionários: “Nossa idéia é estudar e debater não só as bases teóricas da opressão, como também tentar dar continuidade às elaborações de revolucionárias, como Alexandra Kollontai e Clara Zetkin, com o objetivo de construir um programa que responda às necessidades das mulheres trabalhadoras e que apresente uma perspectiva socialista na luta contra o machismo”.

Com isso em mente, o seminário foi dividido em quatro temas – “A origem da opressão da mulher”, “A situação da mulher no capitalismo”, “Opressão da mulher: um problema de gênero ou de classe?” e “A mulher e o socialismo”. Todos foram estruturados a partir de textos que permitiram aos participantes discutir as bases estruturais (econômicas e históricas) do machismo, as distintas formulações ideológicas que lhe deram sustentação no decorrer dos séculos e também as bases teóricas das políticas reformistas defendidas pela maioria do movimento feminista contemporâneo.

Para discutir as origens da opressão foram tomados, por exemplo, textos como “Formações econômicas pré-capitalistas” (Karl Marx), “A origem da família, da propriedade privada e do Estado” (Engels) e textos de militantes e teóricas feministas que se encontram nos marcos do marxismo revolucionário, como “¿Qué es la opresión?”, das argentinas Mercedes Petit e Carmen Carrasco.

O debate sobre o tema seguinte tomou como base capítulos de “O Capital”, nos quais Marx discutiu a divisão do trabalho na sociedade capitalista. O mesmo tema foi abordado nos escritos do trotskista norte-americano Harry Braverman, autor de “Trabalho e capital monopolista”, defensor de que, desde seus primórdios, o capitalismo apoiou-se na constituição de um gigantesco “exército de reserva do trabalho”, formado por trabalhadores desempregados pertencentes a “raças e nacionalidades” discriminadas e, particularmente, por mulheres, relegadas à servidão do lar (do qual só foram “convidadas” a sair em momentos de crise, como as grandes guerras) ou destinadas às ocupações mal pagas e “suplementares”.

Ainda no segundo tema, como contraposição às posições marxistas, foram estudados textos de Helena Hirata, socióloga cujos trabalhos – como “Uma nova divisão sexual do trabalho” – são referências fundamentais para os setores majoritários do feminismo reformista. Ela localiza as raízes da opressão e seu desenvolvimento na sociedade capitalista numa “divisão sexual” do trabalho que se sobrepõe à divisão de classe.

A “tese” de Hirata serviu como “aquecimento” para o vigoroso debate que tomou os grupos durante no terceiro tema – gênero ou classe –, no qual foram discutidos, por um lado, textos de teóricas reformistas e “pós-modernas” (como Heleieth Saffiotti, Carmen Ramos Escandón e Maria Jesús Izquierdo), que, de distintas maneiras, defendem que as diferenças de “gênero” se sobrepõem a todas as demais existentes na sociedade. Por outro, as contribuições de Marx e Engels (retiradas de “A ideologia alemã”), José Weil (da LIT), da própria Cecília Toledo, além de Petit e Carrasco, dentre outros.

O último dia foi dedicado ao estudo de textos como “O Estado e a revolução” (Lênin), “Sobre a questão da mulher” (Leon Trotsky) e “A ditadura revolucionária do proletariado” (Nahuel Moreno), dentre vários outros, com o objetivo de discutir como a luta pela destruição das classes sociais pode e deve ser combinada com o combate pelo fim da opressão.

Uma experiência história
Composta por 80% de mulheres, militantes em diversos setores do partido (jovens estudantes, operárias, professoras, sindicalistas, etc), a primeira turma do seminário foi um sucesso. O grau de envolvimento dos participantes, a seriedade e paixão com que as polêmicas foram realizadas (dentro e fora dos grupos) e, acima de tudo, o fortalecimento das companheiras serão fundamentais para dar continuidade à luta contra o machismo, inclusive no interior do movimento.

Como lembra Ana Rosa, “este seminário tem um caráter histórico, não só por ser uma atividade da Internacional, mas também por ter envolvido o conjunto dos partidos, de sua base à direção. Por isso, inclusive, foi importante ter garantido a participação de 20% de homens, para que eles também em suas atividades militantes possam refletir este debate e cumprir o papel que lhes cabe na luta pela emancipação das mulheres: uma tarefa que, como Lênin disse e o seminário confirmou, está colocada acima de tudo em nossas próprias mãos”.

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