Foto: Beto Barata/PR | Fotos Públicas
Vitor Figueiredo

Este artigo se pretende enquanto parte de uma série que buscará refletir a produção de conhecimento nas universidades e para quem esta produção vem sendo feita. Introduziremos novamente como essa questão implica diretamente na entrada dos filhos dos trabalhadores nas universidades, mais especificamente nas universidades públicas.

Há pouco mais de um ano, publicamos um artigo, intitulado “Tirem as mãos das nossas bolsas de pesquisa”[1], que tratava do projeto de lei que pretendia mascarar o fim dos investimentos em pesquisa, através da desvinculação das fontes de recurso do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) de recursos obrigatórios.

A proposta do governo era de tratar a ciência produzida no Brasil como tratamos uma barra de chocolate durante as compras: quando sobra dinheiro nós compramos, quando não sobra, passamos vontade. Acontece que as implicações do não-investimento em ciência e tecnologia tem impactos diretos na vida dos trabalhadores, ainda que nem sempre percebamos.

Um exemplo disso, é um pó que impede a reprodução do Aedes aegypti, transmissor do zika e da dengue, criado pelo Instituto de Física de São Carlos[2], da USP de São Carlos. A pesquisa começou por conta do surto do zika vírus que assolou as mulheres grávidas em todo o país e deixou sua marca nos filhos da classe trabalhadora. A ciência respondeu com a produção de novas tecnologias para a prevenção de novas epidemias.

Através da mobilização de cientistas e alunos de todo o país, o projeto de Temer não entrou em vigor, garantindo a manutenção do CNPq em 2017, ainda que de forma precária. Porém, com os cortes que ocorreram ao longo do ano em diversas áreas do conhecimento, vários pesquisadores e pesquisadoras deixaram o país, buscando outras fontes de pesquisa no exterior[3].

Agora, governo Temer tenta novamente mascarar o desmonte da ciência brasileira com um projeto de lei orçamentário que reduz em quase 50% os recursos em investimento em pesquisas.

Em 2017, foram previstos R$15,6 bilhões para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação (MCTIC). Já para o ano de 2018, a previsão é de uma queda para R$12,59 bilhões, uma queda de R$ 3 bi (quase 20% do orçamento do ministério).

Acontece que desse total, grande parte já está reservada para o pagamento de salários e reservas de contingência, e outra para a área de comunicações, restando à Ciência e Tecnologia apenas R$2,59 bilhões, ou seja, cerca de 20% do orçamento do ministério[4]. Na prática, os investimentos em pesquisas cairão por mais da metade.

Embora o valor bruto pareça alto, especialmente aos olhos da maioria da população, que passa o mês com pouco mais de um salário mínimo, quando botamos na ponta do lápis os custos do investimento em pesquisa, o cenário é catastrófico.

O projeto de orçamento não prevê recursos para o prosseguimento de diversas obras, como o projeto Sirius, o segundo acelerador de partículas do Brasil, interferindo diretamente em pesquisas de base, que dão suporte a diversos projetos avançados. E o resultado disso será sentido por toda a população numa próxima epidemia como foi a do Zika, citada acima.

Por todo o ano de 2017, a produção de tecnologia já saiu prejudicada com o contingenciamento dos gastos. Em setembro quase 100 mil estudantes correram o risco de terem suas bolsas cortadas, dinheiro do qual muitos dependem para se manter durante a faculdade. Caso voltem a se repetir na mesma proporção, o CNPq não poderia nem se manter, pois o dinheiro da pesquisa cairia para um quarto do orçamento no começo de 2017.[5]

Embora o Brasil passe por uma crise, produzida pelos próprios capitalistas, é preciso dizer que há dinheiro para garantir o investimento por todo o país. Temer cortou da ciência para garantir o pagamento da dívida pública aos banqueiros, negociar sua não investigação na Câmara dos Deputados e bancar as propagandas a favor das reformas maléficas que vem aplicando.

Temer não só está prejudicando toda a população, desde jovens pobres que dependem de suas bolsas para garantir seus estudos, até pesquisadores e professores que dependem de seus salários e de materiais de pesquisa. Também está minando qualquer perspectiva de uma produção acadêmica brasileira nas futuras gerações, perpetuando nossa dependência dos países imperialistas, assim como na era colonial.

Dando sequência a um projeto de recolonização do país, assim como Lula e Dilma fizeram, o processo pelo qual passa a ciência é o mesmo pelo qual passou a indústria nacional. Sofremos com uma redução significativa do setor industrial, o que significa exportar matéria-prima a um baixo custo, para importar matéria faturada e exportar bens de valor agregado, e depender cada vez mais de tecnologias e dos meios de produção externos[6].

Por fim, é preciso denunciar a participação do Banco Mundial e do FMI nos dois processos de desmonte, da ciência e da indústria nacional[7]. Com suas condições de empréstimos, ambas as organizações atuam incentivando, e até obrigando, que sejam feitos cortes e privatizações na educação e em empresas estatais, se colocando ao lado de países imperialistas, e incentivando a dependência de capitais privados e externos na educação, pondo em risco pesquisas de base, como trataremos no segundo artigo.

É preciso lutar pela universidade pública, gratuita e de qualidade, e que esta se encha cada vez mais de negros e negras, de LGBTs, que precisam das cotas para entrar e das bolsas para permanecer.

É preciso tomar as universidades, sair às ruas e exigir de Temer e todo seu bando de corruptos que tirem as mãos do nosso dinheiro que deveria estar na educação, nas bolsas, nas pesquisas e na produção de tecnologia para o Brasil.

É preciso que trabalhadores e estudantes botem para Fora Temer e esse Congresso corrupto que aprovam uma lei orçamentária que extingue a ciência no Brasil para pagar a dívida e salvar sua própria cabeça, mas mantém os jantares que o governo bancou para angariar votos a favor de suas reformas.[8]

 

[1] https://www.pstu.org.br/tirem-as-maos-das-nossas-bolsas-de-pesquisa/

[2] https://www2.ifsc.usp.br/portal-ifsc/as-redes-do-ifsc-contra-o-zika-virus/

[3] http://www.bbc.com/portuguese/brasil-40504128

[4] http://www.planejamento.gov.br/assuntos/orcamento-1/orcamentos-anuais/2018/ploa-2018/orcamento-cidadao.pdf/view

[5] http://ciencia.estadao.com.br/blogs/herton-escobar/proposta-inicial-do-governo-cortaria-orcamento-de-ciencia-e-tecnologia-pela-metade/

[6] http://www.bbc.com/portuguese/brasil-37432485

[7] http://www.bbc.com/portuguese/brasil-37432485

[8] https://www.pstu.org.br/por-que-imprensa-nao-diz-que-temer-compra-votos-para-aprovar-reforma-da-previdencia/