Américo Gomes, do Instituto José Luís e Rosa Sundermann

Em 2 de setembro, o presidente Michel Temer (PMDB), de forma unilateral, substituiu 19 dos 25 membros da Comissão de Anistia e exonerou 6 dos membros atuais, que não haviam solicitado desligamento do órgão. Chegou-se ate a cogitar a nomeação de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, acusado de ser um colaborador da ditadura.

Várias entidades ligadas ao anistiandos e anistiados políticos (trabalhadores que lutaram contra a ditadura militar e, por isso, foram perseguidos, presos, demitidos e alguns torturados e mortos), protestaram contra estas substituições e exonerações. Denunciam que um governo nunca tinha se metido na composição dos conselheiros da Comissão. E que há “uma descontinuidade de sua composição histórica”, inicialmente feita pelo governo FHC.

Sem dúvida nenhuma, é preocupante como o governo Temer vai se relacionar com os anistiados e anistiandos políticos. Um governo que tem como Ministro da Justiça Alexandre Moraes, conhecido como responsável pela enorme repressão que o governo Alckmin trata os movimentos sociais e os trabalhadores no estado de São Paulo, e particularmente, pela brutalidade com que a Polícia Militar trata as manifestações e os protestos sociais. O exemplo mais recente é o absurdo da prisão do advogado dos membros da ocupação Esperança em Osasco, Avanilson Araujo, durante o incêndio que ocorreu no local. Uma prisão com muita violência e sem nenhuma justificativa, a não ser o despreparo de uma polícia que existe para defender a propriedade privada e reprimir os explorados e oprimidos.

No entanto, vale lembrar que o governo Dilma, igual ao governo Lula e FHC, nunca colocou um torturador na cadeia e nunca reprimiu nenhuma empresa que patrocinou ou financiou a ditadura.

A Comissão Nacional de Anistia, nomeada por estes governos, nunca tratou os que lutaram contra a ditadura com o devido respeito. Suas ações eram unilaterais. As decisões sempre abaixo das reivindicações mínimas. E as entidades do movimento e dos anistiados tinham que se dirigir a seus dirigentes de maneira humilhante reivindicando seus direitos. Suas opiniões, via de regra, não eram levadas efetivamente em conta.

Orientada pelos governos Lula e Dilma para esse fim, de reduzir ao máximo a reparação, as decisões dos julgamentos eram muitas vezes arbitrárias, em alguns casos não levando em conta provas concretas; as reparações financeiras eram mínimas, muito abaixo dos salários de mercado, levando os anistiados a constantemente entrarem com recursos e pedidos de reparação.

Para se ter exemplos dos problemas desta Comissão, que seguia a orientação do Ministério da Justiça, a meta de julgamentos de processos do ano de 2016, feita pela própria Comissão, era de 2.500. E até agora foram realizados cerca de 400. As portarias de anistiados publicadas no Diário Oficial e de processos julgados em 2015 foi de cerca de 1.500, sendo que 18.000 aguardam julgamentos.

Criada em 2002, a Comissão tem como o objetivo reparar moral e economicamente as vítimas de atos de exceção, arbítrio e violações aos Direitos Humanos praticados pela ditadura militar. Sem dúvida nenhuma, alguns projetos da Comissão tem grande importância, como as Caravanas da Anistia, as Clínicas do Testemunho, o Projeto Marcas da Memória, e o Memorial da Anistia. Mas mesmo este não teve verba para sua finalização, sempre sob a desculpa de falta de verbas.

Um dos nomes mais questionados para a nova comissão foi o do professor de Direito Constitucional da USP Manoel Gonçalves Ferreira Filho, apoiador da ditadura civil-militar, com um largo currículo de serviços prestados aos administradores do regime de exceção.

 Manoel Gonçalves, apoiador da ditatadura e cogitado para a Comissão de Anistia por Temer

Qualquer suspeita deve ser investigada, e as entidades dos movimentos sociais e de anistiados e anistiandos devem exigir o imediato afastamento de qualquer nome que tiver algum tipo de vínculo com o regime militar. Além disso, exigimos que se realize uma grande plenária de todos os movimentos que lutaram contra a ditadura e que estão há anos na batalha por memória, reparação e Justiça para que eles indiquem os nomes dos conselheiros da Comissão Nacional de Anistia.

Não podemos ter nenhuma confiança de que esta nova Comissão, assim como a anterior, irá realizar as ações reivindicadas pelas entidades de anistiandos e anistiados políticos, se não houver mobilização dos trabalhadores e movimentos sociais.

Junto com isso, é fundamental que não se abandone a campanha por Memória, Justiça, Punição e Reparação, para colocar os agentes do Estado torturadores na cadeia e os patrões e burgueses que apoiaram a ditadura a, literalmente, pagarem por isso.

por Américo Gomes, da Coordenação da Comissão de Presos e Perseguidos Políticos da ex-Convergência Socialista