Aumento nos salários dos parlamentares, ministros e presidente daria para aumentar R$ 6 no salário mínimoÉ de dar náuseas assistir aos malabarismos mentais dos defensores do reajuste salarial de mais de 60% para os senadores e deputados federais e mais de 130% para os ministros e presidente da república, aprovados em regime de urgência pelas duas casas do Congresso Nacional no dia 15 de dezembro. O projeto de decreto legislativo eleva em R$ 1,8 bilhão as despesas com salários só na esfera federal ao igualar os salários do presidente, vice-presidente, ministros de Estado, deputados e senadores aos dos ministros do Supremo. Foi aprovado com parecer favorável de todos os partidos, com exceção do PSOL, que defendia a reposição da inflação dos últimos três anos aos salários em questão, um aumento ainda absurdo de 20%, muito longe das melhores perspectivas de aumento do salário mínimo para 2011, muito distante dos principais acordos coletivos de 2010.

Na Câmara, com um quórum relativamente baixo, os deputados tiveram de aprovar o regime de urgência para votação. O placar registrou 279 votos favoráveis, 35 contrários e três abstenções. Depois de obtido o regime de urgência, o projeto foi votado simbolicamente, sem o registro dos votos no painel eletrônico, numa clara intenção de blindar os deputados dos olhos de quem os sustenta. No Senado, o vexame foi ainda pior, até o regime de urgência foi aprovado simbolicamente e, em menos de 4 minutos, houve parecer favorável da comissão de assuntos econômicos através do Senador Romero Jucá (PMDB – RR) e, na sequência, o presidente da casa, o senador Jose Sarney (PMDB – AP), declarou o projeto aprovado sem sequer abrir espaço para os oradores contrários ao projeto se pronunciarem.

O projeto por si só é infame visto que só com o impacto nas contas federais já seria possível aumentar o salário mínimo em R$ 6,00. É um ultraje à inteligência do povo brasileiro defender tal projeto alegando defasagem dos salários dos parlamentares no mesmo momento em que foi anunciado um corte de R$ 8 bilhões no Orçamento e um aumento miserável de R$ 30,00 ou R$ 35,00 ao salário mínimo, algo em torno de 6% que mal compensam a inflação em 2010.

Mais infames que o projeto são as tentativas desonestas e falaciosas de muitos governistas e petistas de defender o indefensável. Além da reposição inflacionária e equiparação dos salários entre os três poderes, os poucos petistas e lulistas que tiveram coragem de se pronunciar sobre os aumentos arquitetaram justificativas rasas tais como: ninguém critica os salários dos executivos das grandes empresas, o salário dos famosos da televisão, são os dirigentes do país merecem ser bem remunerados.

Ora, as várias carreiras do serviço público de extrema importância para o funcionamento do Estado e do país convivem com defasagens salariais que, em muitos casos, superam os 100%, fruto dos últimos 20 anos de política neoliberal de sucateamento e privatização do Estado iniciada por Collor e continuada por FHC e Lula. Tratam-se de carreiras técnicas da mais valiosa importância nos três poderes em todos os órgãos da Administração Pública, sem contar os professores que tiveram que engolir um piso nacional de menos de R$ 1000,00 como uma conquista histórica durante o governo Lula.

Os nobres deputados que trabalharam quatro meses no ano de 2010 devido às campanhas e que possuem auxílio moradia, auxílio vestuário, auxílio deslocamento, verba pra contratar mais de 20 apadrinhados políticos e lotar seus gabinetes se acham merecedores de um aumento de mais de 60%, mas se recusam a votar a PEC que cria o piso salarial dos policiais que ganham em média menos dois mil reais por mês numa profissão de altíssimo risco, numa sórdida manobra política montada por Lula, pelo PT, apoiada pela base aliada e pelos partidos de oposição burguesa: DEM e PSDB. Os nobres deputados que, não raras vezes são flagrados em negociatas sujas nos esgotos de Brasília, alegam que um aumento real ao salário mínimo pode quebrar estados e municípios, mas aumentam seus salários em 61% sabendo do efeito cascata que tal medida acarreta para os mesmos Estados e Municípios, uma vez que várias assembléias legislativas e câmaras municipais de todo o país têm seus salários atrelados aos da câmara federal. O fato é: a dificuldade financeira só existe como ladainha para legislar em benefício próprio e parasitar os trabalhadores.

Enquanto os prefeitos da região serrana do Rio, profundamente afetada pela maior tragédia climática da história do país, tentam enganar a população culpando os pobres e as chuvas em grande volume pelos estragos na região e alegando falta de recursos para amparar as vítimas, com os R$ 1,8 bilhões do impacto do aumento aos cofres da União, seria possível financiar reconstrução das áreas afetadas pelas enchentes em Teresópolis, estimada pela Prefeitura do município em cerca de R$ 545 milhões, mais de três vezes. Esse é o país de todos de Lula, de Dilma e dos partidos burgueses: as vítimas das enchentes abandonadas esperando durante meses por um aluguel social miserável de R$ 400 enquanto os que ganham auxílio moradia, alimentação, verba para comprar roupas, carro oficial e não precisa gastar quase nada de seus salários para sobreviverem aumentam seus próprios salários em 61% em menos de quatro minutos.

Tais orgias com dinheiro público há tempos vêm sendo patrocinadas com o apoio dos deputados de vários partidos e com leniência do Poder Executivo que se utiliza de tais expedientes para comprar sua base de bajulação no Congresso. No entanto, cabe uma observação especial à atuação do PT no último dia 15 de dezembro. Cumprindo fielmente mais um capítulo da traição histórica que promove contra a classe que dá nome ao partido: OS TRABALHADORES os parlamentares do PT, em sua grande maioria, votaram a favor do aumento, com destaque ao deputado Jose Genoino (PT – SP) que rendeu elogios empolgados ao então presidente da sessão o Deputado Inocêncio Oliveira (PR – PE) que conduziu a lambança com maestria.

O PT nasceu das lutas dos trabalhadores por salários, condições de trabalho, se construiu dentro dos movimentos sindicais e populares de todo o país e, neles, ainda encontra grande apoio, inclusive das principais categorias do país. Bancários, metalúrgicos, químicos têm a maior parte de seus sindicatos filiados à CUT (que apóia entusiasticamente o atual governo) e são dirigidos pela Articulação, ala do PT. Durante todo o ano, a CUT e estes sindicatos rifaram greves e mobilizações em prol de interesses governistas, e defenderam que durante o governo Lula a política de valorização do salário mínimo foi extraordinária e que os acordos coletivos foram históricos, com aumentos que variam entre 8% e 11 %. Agora se calam diante da nojenta artimanha que o PT e Dilma lideram para dar um aumento achatado ao salário mínimo em 2011 e, pior, em suas páginas na internet não pronunciam uma só palavra em oposição ao aumento imoral de salários patrocinada pelas lideranças do PT no Congresso.

Mais um triste episódio que desqualifica o PT e a CUT como representantes das massas e dos trabalhadores. Como parlamentares, muitos deles ex-sindicalistas eleitos com apoio da CUT, que aumentam seu próprio salário em 61% em menos de quatro minutos podem ser considerados representantes das massas que têm que lutar em longas greves para garantir aumentos de cerca de 10%? O “T” das siglas PT e CUT ainda fazem referência a trabalhadores? Quem realmente eles representam? São os verdadeiros papéis do PT e da CUT sendo desnudados em menos de quatro minutos.

O aumento salarial foi aprovado na forma de decreto legislativo e, portanto, não é objeto de sansão ou veto presidencial, o que blindou o ex-presidente Lula e o permitiu até fazer piadinhas de mau gosto durante o evento de balanço de seu governo, no entanto, ainda existe uma pequena chance de revogação do decreto caso haja uma articulação em tal direção por parte do Congresso. Como o aumento vale a partir da próxima legislatura e o Legislativo brasileiro se comporta como extensão do Palácio do Planalto, caberá a presidente Dilma Roussef coordenar tal manobra, afinal R$ 6,00 compram mais de duas horas de trabalho de quem ganha um salário mínimo, muita coisa para ser roubada covardemente em quatro minutos. É a atitude minimamente digna que se espera da presidente que se elegeu sob a bandeira da erradicação da miséria.