Redação

Diante da rápida escalada no preço do arroz nas prateleiras dos supermercados, o presidente da organização que reúne os grandes varejistas, a Associação Brasileira dos Supermercados (Abras), João Sanzovo Neto, deu sua sugestão para o povo: que comam macarrão. A associação prometeu “fazer uma ação para promover o consumo de massa, de macarrão, que é o substituto para o arroz”.

Sabendo ou não, o varejista repete o discurso atribuído à princesa da França, Maria Antonieta, diante da fome que assolava o povo momentos antes da Revolução Francesa: “Se não tem pão, que comam brioches!” Os dias são outros, mas o descaso com as necessidades mais básicas dos trabalhadores e da população pobre é o mesmo. Bolsonaro e seu vice, general Mourão, culparam o próprio povo pelo aumento dos preços, pois teriam passado a comprar mais alimentos com o auxílio emergencial de R$ 600.

A realidade, porém, não resiste a esse discurso cínico do governo. Embora o preço do arroz tenha tido um aumento vertiginoso nos últimos meses, ele já sobe há pelo menos um ano, bem antes da pandemia e do insuficiente auxílio emergencial. A alta no preço do produto quase dobrou desde o ano passado, indo de R$ 15 em média o pacote de cinco quilos para até R$ 40 em alguns supermercados. Mais que isso, segue uma tendência generalizada dos produtos da cesta básica. Outros alimentos, como o feijão preto e a carne, subiram 30% e 40% no último ano respectivamente.

Segundo o Dieese, o preço da cesta básica subiu em 13 das 17 capitais pesquisadas em agosto. Em São Paulo, a cesta básica bate os R$ 540, quase todo o auxílio de R$ 600 e praticamente a metade do salário mínimo.

Por que o Brasil, maior produtor de arroz fora da Ásia, um dos maiores produtores de carne do mundo e o maior exportador de proteína, vê os preços subirem tanto? Segundo relatório da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), houve aumento da área cultivada do setor agropecuário com aumento da safra em 4,5%.

A realidade é que pagamos cada vez mais pelos alimentos porque toda a produção não está voltada às necessidades da população, mas para a exportação e para o lucro de multinacionais. A inflação é a maneira como imperialismo joga o custo da crise nas costas dos países semicoloniais e dos povos pobres, ao lado do aumento dos combustíveis, da energia e dos produtos industrializados.

E aproveitam a pandemia para lucrar mais. A organização capitalista da produção agropecuária e o papel subordinado do Brasil no mercado internacional colocam a absurda contradição de que, quanto mais produzimos comida, mais pagamos por ela e menos comemos.

Fonte: Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV)

Fonte: Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da USP

 

DE VOLTA À COLÔNIA

Inflação é produto da recolonização do Brasil

O país produziu 11,17 milhões de toneladas de arroz na safra 2019/2020. Já o consumo para este ano estava previsto em 10,8 milhões de toneladas. Daria para suprir toda a demanda interna e ainda sobraria. Não fosse, porém, o aumento recorde na exportação, de quase 1 milhão de tonelada só até agosto. Com o real desvalorizado, fica mais lucrativo aos produtores venderem lá fora. É o mesmo que ocorre com a carne. Com o preço no mercado internacional lá em cima, os produtores priorizam a exportação e vendem mais caro aqui.

Isso ocorre porque o grande latifúndio brasileiro dominado pelas multinacionais não produz comida, mas commodities, ou seja, matéria-prima cotada no mercado internacional. Em vez de servirem para alimentar a população, produtos como o arroz, a soja, o café ou a carne são utilizados para negociação e especulação nas bolsas mundo afora e aqui dentro. Mesmo o arroz, que tem a menor parte exportada, é estocado pelos grandes produtores para forçar a alta nos preços.

A exportação de grãos, por sua vez, tem como destino a estatal chinesa Cofco (45%) e quatro multinacionais de commodities (Archer Daniels Midland, Bunge, Cargil e Louis Dreyfus Company, que juntas são conhecidas como ABCD), representando outros 37%. Essas multinacionais são responsáveis por 70% das importações e exportações de commodities agrícolas no mundo.

Crise e recolonização

O plano do imperialismo para o Brasil é fazer o país retroceder à condição de colônia exportadora de produtos primários. Foi a favor desse projeto que governaram FHC, Lula, Dilma e agora Bolsonaro, que tenta avançar de forma qualitativa. Faz parte desse plano o processo de desindustrialização do país, a entrega das estatais e das empresas de alta tecnologia como a Embraer às multinacionais, a desnacionalização do campo brasileiro e, por fim, o papel de fornecedor de matérias-primas de baixo valor agregado ao mercado internacional.

À medida em que se desenvolvem e incorporam a mais moderna tecnologia no campo, mais desempregam e precarizam a mão de obra. Ao mesmo tempo, florestas são derrubadas e queimadas e povos indígenas e ribeirinhos chacinados para a expansão da fronteira agrícola.

Com a crise, os grandes conglomerados internacionais atuam para quebrar milhões de pequenos negócios a fim de saírem dessa situação mais fortes, recuperando seus lucros em base a um saque geral da população mundial, impondo sacrifícios à classe trabalhadora como em tempos de guerra, com desemprego em massa e fome generalizada.

 

PROGRAMA EMERGENCIAL PARA A CRISE

Romper com o imperialismo e estatizar o latifúndio

O governo apresenta como saída para a crise dos alimentos o fim dos impostos sobre importação a fim de abastecer mais o mercado interno. Isso, porém, não vai resolver o problema. O preço internacional também será em dólar, e mesmo que a chegada dos produtos importados pressione um certo alívio no preço do arroz por aqui, vai demorar para ter efeito. Não reverte o processo de colonização do país, verdadeiro responsável pela alta dos alimentos.

É uma situação que, com o fim do auxílio emergencial anunciado pelo governo e a explosão do desemprego e da pobreza, vai se tornar cada vez mais dramática. Mesmo o trigo, que é uma commoditie, está sujeito à flutuação de preço no mercado internacional, afetando daqui a pouco o próprio macarrão que os varejistas sugerem que você coma no lugar do arroz. Só rompendo com essa lógica colonialista será possível garantir a alimentação do povo brasileiro.

– Estatização do latifúndio e das multinacionais do agronegócio

É preciso colocar a produção de alimentos, que hoje está nas mãos de poucos produtores a serviço de grandes multinacionais, nas mãos dos trabalhadores, estatizando o latifúndio e as multinacionais do setor sem indenização e com controle operário. Com isso será possível reduzir os preços.

– Reforma agrária sem indenização e apoio à agricultura familiar e ao pequeno produtor

Confisco do latifúndio improdutivo e reforma agrária radical sem indenização. Crédito subsidiado e apoio técnico ao pequeno produtor, responsável por grande parte dos alimentos, como os hortifrutigranjeiros.

– Estatização das grandes redes varejistas

A fim de garantir a distribuição dos produtos da cesta básica a todo o país sem a margem de lucro que hoje vai para as multinacionais.

– Estatização do sistema financeiro, por um banco estatal único

Seria possível direcionar os recursos para o financiamento da agricultura familiar, responsável por parcela significativa da alimentação do povo, principalmente hortifrutigranjeiros.

 

Um programa em defesa da vida, do emprego, do salário, da renda e dos direitos

– Quarentena para valer, com emprego e renda

É preciso exigir quarentena geral já, com emprego e renda para todos, a fim de evitar mais mortes até que haja uma vacina.

– Manutenção do auxílio emergencial de R$ 600

É preciso manter o auxílio de R$ 600, que já é insuficiente, para garantir a sobrevivência dos desempregados e informais até que a pandemia passe. É preciso também incluir os trabalhadores rurais, medida aprovada pelo Congresso e vetada por Bolsonaro de forma covarde.

– Redução da jornada de trabalho sem redução dos salários

Ao invés de liberar as demissões ou reduzir jornada e salário, o governo deveria decretar estabilidade no emprego e reduzir a jornada de trabalho para 30 horas semanais, sem redução dos salários, e revogar a reforma trabalhista e a lei das terceirizações.

– Não à privatização! Reestatização das empresas privatizadas

É preciso tomar de volta empresas como a Vale e a Embraer e colocá-las sob controle dos trabalhadores, assim como a Petrobras, para que produzam de acordo com as necessidades do povo e não para acionistas estrangeiros.

– Acesso à energia elétrica, água, Internet e demais serviços básicos a custo subsidiado para a população