Em janeiro, milhares de manifestantes saíram às ruas em Cochabamba na Bolívia, pedindo a renúncia do governador Manfred Reyes Villa, ex-militar, oligarca e defensor radical da “autonomia” da região. A resposta foi brutal. Milícias armadas, com o apoio da polícia e do governo, desataram uma ampla repressão, assassinaram pelo menos três manifestantes e deixaram centenas de feridos.

Em resposta, milhares de pessoas marcharam num ato convocado pela Central Operária Departamental (COD), exigindo “fora Reyes Villa”. Os protestos deixaram o governo local acuado e paralisado. Imediatamente os manifestantes organizaram um “governo paralelo revolucionário” e tentaram criar um organismo de duplo poder. Mas o novo organismo não pôde exercer nenhum tipo de poder em função do boicote dos sindicatos controlados pelo governo Evo Morales.

Em meio às manifestações, Morales reuniu-se com dirigentes camponeses e membros da COD, pedindo para deixarem a luta contra Reyes Villa e buscarem uma saída legal, por meio de um incerto referendo revogatório de mandato. “Peço para que os movimentos sociais atuem no marco da democracia e não sejam vingativos”, declarou. Ao invés de chamar o fortalecimento do organismo de poder construído na luta do contra o governo de direita, o presidente fez o oposto.

Esse episódio mostra a natureza do governo Morales: recebe a pressão do movimento de massas para que cumpra as expectativas que o levaram ao poder, mas cumpre as exigências da burguesia e do imperialismo para que defenda seus interesses e avance na contra-revolução. Por isso, faz de tudo para impor limites às mobilizações populares. O decreto da nacionalização dos hidrocarbonetos ilustra bem essa situação. A enorme pressão revolucionária do povo obrigou Morales a editar a medida em maio de 2006. Menos de um ano depois, houve um verdadeiro retrocesso. Nenhuma expropriação das multinacionais foi realizada, nem foi instituído o monopólio de exploração dos hidrocarbonetos, algo necessário para a industrialização do país. O que ocorreu foram negociações de novos contratos de exploração do gás com as multinacionais (incluindo a Petrobras).

Constituinte
Em agosto, começou a funcionar a Assembléia Constituinte. Sua convocação foi uma das principais reivindicações da revolução de 2003. A população indígena e camponesa vê a Constituinte como um instrumento para resolver seus problemas. O povo exige que seja originária e de “refundação” da Bolívia, mas a burguesia e o imperialismo querem que ela se limite a uma reforma constitucional.
Os trabalhos da Constituinte estão paralisados, porque a oposição burguesa (minoritária na Assembléia) exige que as novas leis sejam aprovadas por dois terços. O governo defendia a maioria simples, pois o MAS sozinho constitui 55% dos deputados.

Setores da burguesia nacional, representados por prefeitos e governadores das províncias mais ricas realizaram manifestações para pressionar por algum acordo. Morales recuou e aceitou a realização de consultas populares sobre polêmicas que não fossem aprovados por dois terços. Tal acordo é, na prática, mais uma manobra da direita para manter a Constituinte paralisada.

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