Soraya Misleh, de São Paulo

Um ano de lutas e heroica resistência, coroado com uma excelente notícia do Brasil aos palestinos: vitória importante, ao apagar das luzes de 2019, sobre a família Bolsonaro e seu parceiro de sangue, Israel. Eduardo Bolsonaro, à presidência da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, tentava desde 10 de dezembro aprovar dois acordos com Israel, para cooperação nas áreas de defesa e ciência e tecnologia. Após enfrentar obstruções da oposição e o justo rechaço expresso em um manifesto assinado por mais de 50 movimentos e forças políticas – entre elas o PSTU –, o filho de Jair Bolsonaro foi derrotado em sessão na manhã desta quarta-feira (18). Deixará a presidência sem conseguir cumprir com esse compromisso junto ao aliado sionista da família.

Os acordos integram um rol de cinco deles assinados por Bolsonaro pai em sua viagem iniciada no dia 31 de março último para se encontrar, nas suas palavras, com o “irmão” Benjamin Netanyahu – então primeiro-ministro israelense. A comitiva formada por “missão empresarial brasileira” daria, assim, mais um passo na consolidação da cumplicidade histórica do Brasil com a colonização da Palestina.

A informação consta de “declaração conjunta” assinalada como Nota 81 do Itamaraty: “Os dois líderes [Bolsonaro e Netanyahu] decidiram alçar as relações bilaterais a um novo nível de prioridade, construindo sobre os sólidos vínculos históricos entre os dois países desde a criação de Israel, como demonstra a conclusão de vários instrumentos bilaterais de cooperação, nos campos da ciência e tecnologia; defesa; segurança pública; aviação civil; segurança cibernética; e saúde. Ambos os Governos tomarão as medidas necessárias para cumprir e implementar os acordos recém-assinados nos campos acima mencionados. ”

Fortalecer a luta

A significativa derrota a Bolsonaro-Israel deve ser mais do que comemorada. Alma lavada e ânimos renovados, deve servir para fortalecer a árdua luta que continua. No último domingo, dia 15, como parte fundamental do esforço por estreitar esse pacto de sangue, foi aberto em Jerusalém, Palestina ocupada, escritório brasileiro de negócios. Conforme a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), responsável pela sua instalação, o objetivo é “fortalecer a parceria com o país [Israel] nos temas de inovação, tecnologia e investimentos”. Entre os focos, “soluções voltadas ao agronegócio e ao uso de água e, ainda, avanços em cibersegurança para defesa de clientes, proteção de dados e aplicação militar”.

Segundo notícia publicada pelo Monitor do Oriente, o mesmo Eduardo derrotado na Comissão deu uma entrevista também nesta quarta-feira ao Times of Israel, sugerindo que o próximo passo será a transferência da Embaixada do Brasil para Jerusalém – à la Trump. As lideranças sionistas têm cobrado dos Bolsonaro esse compromisso “de campanha” – que tem se mostrado um desafio para o capitão da reserva alçado à Presidência, por contrariar interesses econômicos dos países árabes, grandes exportadores de carne e frango. Portanto, é necessário não baixar a guarda, na certeza de que novas vitórias são bastante possíveis, além de parte fundamental da solidariedade internacional efetiva com os palestinos. É mister denunciar e rechaçar a cumplicidade com o apartheid e a colonização sionistas. Notabilizada pelo Brasil infelizmente ainda durante os governos Lula e Dilma, em que o país se tornou um dos cinco maiores importadores de tecnologia militar israelense, essa foi inaugurada durante a recomendação de partilha da Palestina em um estado judeu e um árabe, sem consulta aos habitantes nativos, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 29 de novembro de 1947, presidida pelo diplomata brasileiro Osvaldo Aranha. A ONU, assim, dava sinal verde à limpeza étnica que se seguiu e culminou na Nakba (catástrofe com a criação do Estado racista de Israel em 15 de maio de 1948). A Nota 81 saúda este momento, utilizando para tanto representações sionistas já superadas e que não sobrevivem a uma mínima análise séria da história. Não se pode negar que é coerente, em se tratando de Israel e Bolsonaro, já que ambos são mestres em fake news.

Outra delas consta da Nota 81: afirma que essa parceria “está alicerçada sobre valores comuns da liberdade, da democracia, da economia de mercado, da justiça e da paz, e sua determinação comum de buscar a prosperidade para seus povos”. Uma afronta às vítimas das tecnologias militares como resultado desse pacto de sangue – sejam palestinos, que se transformaram em “cobaias” para testes de armas que seguem depois para exportação, sejam negros e pobres nas periferias brasileiras, em que são utilizadas depois ao genocídio. As supostas “democracia” e “liberdade” apregoadas encontram eco no falacioso discurso do projeto colonial sionista para manter suas políticas discriminatórias e ocupação ilegal – ao que a exportação é basilar, já que sustenta essa economia do apartheid.

No rechaço a essa parceria e denúncia do seu significado, é tempo de renovar a solidariedade efetiva internacional na luta por justiça, rumo à Palestina livre, do rio ao mar, com o retorno dos milhões de refugiados às suas terras.

É tempo de fortalecer o chamado por BDS (boicote, desinvestimento e sanções) a Israel e contra o genocídio negro e pobre no Brasil, com as armas resultantes dessa vergonhosa cumplicidade que os Bolsonaro saúdam, mas também governadores como Witzel e Dória. É tempo de preparar a luta para um 2020 com novas vitórias. Inspirar-se nas revoluções e lutas que pipocaram no mundo em 2019 e na resistência heroica palestina, para que todos e todas sejam livres da opressão e exploração.