Uma comitiva formada por sindicalistas que representam os trabalhadores da mineração do Brasil e do Canadá visitou a África do Sul e Moçambique entre os dias 29 de outubro a 13 de novembro. O objetivo da comitiva foi o de ajudar a construir e colaborar com a resistência e a luta dos trabalhadores africanos contra as agressões da mineradora Vale, alvo de inúmeras denúncias de desrespeito aos direitos dos trabalhadores e suas organizações. Confira a entrevista realizada com Valério Viera, que integrou a comitiva representando a CSP – Conlutas e o sindicato Metabase – Inconfidentes (MG).

Opinião – Com qual situação que você de deparou em Moçambique?

Valério Viera – Vimos uma miséria muitas vezes maior que na África do Sul, país que visitamos antes. O índice de desemprego é em torno dos 56%, o salário mínimo varia entre 60 dólares, no setor agrícola. Já no setor da mineração é de 85 dólares e 110 dólares no setor financeiro.

Visitamos o país novembro, mas logo fomos informados que em setembro ocorreu uma semana de protestos contra a fome e o aumento do preço do pão e dos transportes.
Naquele momento Maputo, capital de Moçambique, foi rapidamente fechada por bloqueios de ruas e avenidas, que ficaram paralisadas. Houve saques de armazéns. A rebelião deixou pelo menos 155 feridos e dez mortos.

O governo do país culpou a elevação dos preços mundiais do trigo e do petróleo pela elevação dos preços dos alimentos. As mobilizações conseguiram obrigar o governo a , recuar no aumento das tarifas de transporte e do pão, entrando com subsídios para segurar os preços.

Que negócios a Vale prepara no país?

Valério – É nessa situação de pobreza que estão se instalando no país grandes corporações. A Vale já está lá com seu projeto Moatize com a certeza de continuar seu projeto em ganhar enormes lucros com a construção da maior mina de carvão a céu aberto da África.

Pelas informações que temos, pesquisadores em Tetê, uma província onde esta localizada Moatize, afirmam que lá está a terceira maior reserva de carvão mineral do mundo. Também existe uma reserva de gás enorme ainda não explorada e outros bens naturais que atraem os olhares de grandes investidores do mundo.
Mas a Vale também sofreu com manifestações ocorridas em setembro. No início de outubro as obras de construção da Mina de Moatize da Vale, encaminhadas por empreiteiras brasileiras em consórcio com construtoras internacionais, sofreram um duro golpe. De forma espontânea, os trabalhadores organizaram uma paralisação da obra. Nessa mobilização também houve forte manifestação com danos aos bens das empresas e uma forte repressão por parte do governo, com 42 duas prisões. O protesto foi considerado ilegal.

Essa manifestação foi para denunciar atraso de pagamento por mais de doze meses, falta de condições de trabalho, tratamento desumano por parte das empreiteiras e outros graves problemas que o próprio Ministério do trabalho moçambicano reconheceu.

Nós confirmamos toda essa situação, que detonaram essa greve, numa conversa que tivemos com a própria ministra do Trabalho de Moçambique. Na ocasião falamos sobre a Vale e sua prática no Brasil e no Canadá. A Ministra falou que o reassentamento de comunidades retiradas de seus locais por causa da exploração mineral da Vale, está gerando graves problemas.


Como foram as reuniões com os sindicatos?

Valério – Sim. Em Maputo tivemos uma reunião que contou com a presença de sindicatos nacionais SINTICIM, SIPOCAF, mineiros e ferroviários, CONAC (cooperativa nacional dos trabalhadores em agricultura) MST/Brasil, pesquisadores na área de economia de Universidades de Moçambique, outros movimentos sociais.

Propomos a necessidade de se criar uma unidade entre os movimentos sociais e sindicatos, para iniciar um grande debate sobre as mudanças econômicas no país em relação aos grandes investimentos e como os trabalhadores e as comunidades serão afetados. O objetivo central é de resistir ao ataque do grande capital aos nossos direitos.

Em Tete tivemos um seminário voltado para questões de organização, prática sindical e saúde e segurança. Falei da experiência da CSP-Conlutas e do Sindicato Metabase de Inconfidentes.

O impressionante na organização deles é que têm garantido por lei os comitês de base que dirigem e negociam por empresa, mas com uma limitação de seus secretariados gerais que vivem em Maputo e totalmente burocratizados, distantes dos problemas reais da base. Um companheiro de base me confidenciou que muitas vezes para chegar ao secretariado geral do sindicato é mais complicado do que chegar ao próprio governo.

A Vale está se preparando para entrar na África do Sul?
Valério – Fizemos várias reuniões com sindicatos. Em Johanesburgo os contatos foram mais na área sindical, visitamos o Sindicato Nacional dos Metalúrgicos da África do Sul (NUMSA), que demonstrou também grande interesse em manter um intercambio com o sindicato, a CSP – Conlutas e a USW [United Steelworkers, sindicato dos mineiros que esteve à frente da greve dos mineiros canadenses]. Eles nos informaram que a Vale está entrando no país através de uma empresa, África Rainbow. Pelo que sabemos eles montaram uma terceira empresa de nome ARMS. Para eles o nome Vale está bastante associado a uma empresa que não respeita as leis e os trabalhadores, por isso acham que a Vale vai entrar em seu país com outro nome.
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