Presidente da Câmara propõe `censura pública` a deputadosO pesado manto do acordão paira sobre Brasília. Todos os partidos – sejam governistas ou da oposição de direita – seguem em marcha batida para tentar livrar a cara de suas legendas e deputados corruptos.

Em entrevista à Folha de S. Paulo, Severino Cavalcanti, maior símbolo da corrupção que corre solta no Congresso de picaretas, defendeu a adoção de uma pena mais branda do que a cassação de mandato dos deputados que estão envolvidos no escândalo do caixa dois de campanhas eleitorais, vinculado ao esquema de Marcos Valério. Para ele a tal da punição deveria se limitar a um “censura” pública, nada mais. Quanto aos deputados acusados de receber o mensalão, Severino, que nem sequer reconhece a existência do próprio mensalão, acha que os deputados não devem ser punidos por (pasmem!) falta de provas.

As declarações de Severino Cavalcanti tiveram um efeito bombástico. Vários parlamentares da oposição de direita proferiram veementes protestos contra o picareta. Alguns deputados, como Fernando Gabeira (PV), ameaçaram criar um movimento para derrubar Severino caso ele “não feche a boca”. E esse é justamente o maior problema enfrentando pelos parlamentares hoje.

Ao abrir a boca, Severino tão somente revelou o que está sendo tramado nos podres bastidores da democracia dos ricos e corruptos, mas que ninguém tem coragem de falar, exceto ele, o “rei do baixo clero”.

Todos sabem que Severino, com sua ignorância, cambalachos, clientelismo e corporativismo, é a alma e a cara do Congresso Nacional e está longe da habitual sutileza política florentina de outros parlamentares corruptos. Diz coisas que revelam a sua total despreocupação com a reação da opinião pública. Como por instinto, age em função da pressão da sua base política no Congresso, tão corrupta quanto ele, que deseja apenas se safar. Recentemente, o deputado José Janene (PP-PR), um dos operadores do mensalão, disse a Severino que se ele fosse cassado revelaria todas os trambiques do presidente da Câmara.

Mas não é só isso. Ao falar demais, Severino acabou atrapalhando os esforços para se fechar uma acordão entre PT, PSDB e PFL, pois aprofunda a crise e afunda ainda mais o Congresso no mar de lama. Por isso a reações de indignação contra o picareta partem também da oposição de direita. Pura hipocrisia. Nunca é tarde para lembrar que Severino foi eleito presidente da Câmara por esses deputados, 300 picaretas para ser mais exato. Ao PT coube o repugnante papel de defender Severino no plenário da Câmara.

O acordão caminha a passos largos
Apesar das lambanças de Severino, governo e oposição de direita seguem, ao seu modo, tentando emplacar o acordão. PSDB e PFL dão mostras de que estão satisfeitas com o desgaste de Lula e que não querem derrubá-lo, mas sim empurrar tudo para as eleições de 2006. “Espero que Lula não renuncie (…) A oposição está preocupada com a possibilidade de que se chegue a uma situação sem volta. Meu partido, o PSDB, nunca falou em impeachment, pois sabemos o custo que pode ter uma ação dessa natureza”, disse FHC ao jornal argentino Clarín, no domingo, 28 de agosto.

A avalanche de corrupção atingiu o ministro Palocci e a crise ameaça contaminar o plano econômico. Preocupados, políticos (do PT ao PSDB/PFL), banqueiros e empresários – os mais interessados na manutenção deste plano – se apressam em finalizar as investigações das CPIs, blindar a economia, proteger Lula e cassar um número restrito de deputados. A oposição burguesa, por sua vez, sabe que a continuidade das investigações pode atingi-la perigosamente. São vários os caminhos para isso. O aprofundamento das investigações nos fundos de pensão das estatais e das contas existentes em paraísos fiscais, por exemplo, revelariam não apenas uma maior podridão do PT, como exporia a luz aos esquemas de corrupção dos tucanos e do PFL, dos tempos de FHC. Por isso a pressa.

Percorrendo esse caminho, o relator da CPI dos Correios, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), decidiu nesta quarta-feira, 31, indiciar em seu relatório 18 parlamentares que constam da lista dos que sacaram recursos das contas do empresário Marcos Valério. Serraglio sabe que há muito mais parlamentares envolvidos nos esquemas de corrupção. Ele mesmo disse, quando viu a lista com mais de 100 deputados que teriam usado as contas de Valério, que o material era “pólvora pura”. A lista, no entanto, nunca foi revelada.

Este em curso, portanto, um tremendo acordão para assar uma mal cheirosa pizza. O movimento de massas deve entrar em cena para explodir o acordo entre governo e oposição. Dando seqüência à marcha da Conlutas em Brasilia, passeatas chamando o “Fora todos!” serão realizadas, por iniciativa da Coordenação, nas capitais dos país. A primeira delas será em Belo Horizonte, nesta quinta, 1° de setembro.