No dia 15 de julho o governo do Coronel Lúcio Gutierrez completou seis meses. Nesta data, nada fazia lembrar a posse em 15 de janeiro quando o Estádio Atahualpa, o mais importante do país, estava repleto de equatorianos que, cheios de esperança num processo de mudancas, foram dar seu apoio ao novo presidente.

Seis meses depois, o governo realizou três “comemorações” da data, em Quito, Guayaquil e Cuenca. Todas fechadas e com forte aparato policial.
Nestes seis meses, Lúcio enfrentou-se com greves de professores, petroleiros, saúde, empregados públicos e trabalhadores do Judiciário.

O ex-presidente Gustavo Noboa (o FHC deles), passou vários meses negociando uma Carta de Intenções com o FMI e não conseguiu chegar a um acordo. Três dias após assumir, o governo Lúcio assinou a Carta, cujos compromissos são considerados a política mais neoliberal em 10 anos. Ele se compromete a não criar barreiras para a implantação da Alca; a entregar a administração das empresas elétricas estatais para empresas estrangeiras; a abrir espaço para a exploração petroleira às empresas privadas; a gerar um superávit primário de 4%, a reduzir gastos públicos em Educação e Saúde e, muito importante, a pagar a dívida externa.
Em relação à famigerada dolarização, além de se comprometer a mantê-la, faz campanha para estendê-la a toda América Latina.

Crise e mudanças no governo

Lúcio Gutierrez começou governando com o apoio dos indígenas da Conaie e do Pachakutik (partido político ligado às organizações indígenas), além de contar com o apoio do MPD-PCMLE, um partido estalinista, que se reivindicava maoísta, albanês, castrista e hoje reivindica centralmente a figura de Stalin. Também incorporou o Partido Comunista – que um dia foi moscovita. E, por fim, incorporou a CMS (Coordenadora dos Movimentos Sociais) – através de seus dirigentes petroleiros.
Seis meses depois, a popularidade do governo despencou. O compromisso com o FMI e os cortes de verbas e de salários dos empregados públicos, a falta de uma política agrícola e a crise que a dolarização está gerando – mais de 200 empresas estão fechando as portas – são as razões da insatisfação, da bronca e das mobilizações.
O resultado destas contradições e crise levou a mudanças na composição do governo. Os petroleiros vinculados à CMS foram destituídos dos seus cargos na Petroecuador, como subproduto da greve contra a privatização. O principal quadro do Pachakutik renunciou ao cargo de vice-ministro de Administração e saiu atirando. O MPD-PCMLE, pressionado por suas bases, acabou rompendo com o governo. Quanto ao Pachakutik, na última reunião de gabinete, Lúcio foi enfático: “se querem permanecer na aliança e no governo, como é meu desejo, se submetam às minhas regras. O primeiro que fale algo contrário vai para fora.” (Jornal Hoy – 19.07.03)

Porém, não só de “saídas” viveu o governo. Também existiram incorporações. A mais importante foi a de Leon Febres Cordero, um ACM andino. Febres Cordero entrou para a base parlamentar do governo e começaram a ocorrer diversas mudanças nas instituições. Primeiro, uma dura denúncia de corrupção ao presidente da Suprema Corte de Justica, abalou o Poder Judiciário e Febres Cordero indicou o novo presidente da Suprema Corte. O juiz Bermeo, pivô do escândalo e com ordem de prisão decretada, desapareceu. O juiz Lalau, frente a Bermeo, seria um batedor de carteiras. Porém, o mais importante é que o novo juiz corresponderá à nova composição do governo e diretamente ao ACM equatoriano.

O presidente do Congresso, Landazurri, escapou por pouco de um linchamento moral, à la Bermeo. Ele se submeteu às novas orientações para poder seguir exercendo seu mandato.

Uma nova correlação de forças

A aplicação das imposições da Carta de Intenções com o FMI, a manutenção da dolarização e o apoio e maior comprometimento com o projeto de militarização de Bush e Uribe, através do Plano Colômbia, estão dia a dia desgastando o governo, derrubando sua popularidade e criando uma nova correlação de forças no país.
Desde que assumiu, Lúcio Gutierrez enfrentou 32 greves. É verdade que foram lutas sem coordenação e unificação, produto do papel traidor da maioria das direções que estavam ou ainda estão no governo. Mas pela base é crescente a disposição de luta e a oposição ao governo.

O Congresso dos Povos

No último dia 11 de julho, se realizou na Universidade Salesiana o primeiro Congresso dos Povos sob este governo. Havia nele 2.500 pessoas. Muitos eram indígenas, que vieram à revelia da Conaie. Por iniciativa dos petroleiros vinculados ao MAS – Movimiento ao Socialismo – este sindicato alugou vários ônibus para que os indígenas participassem.

Por ser a primeira reunião de vanguarda, com importantes setores do movimento presentes, exceto a Conaie e Pachakutik, foi um importante evento. O tom era de bronca, oposição e disposição de luta. Marcou-se uma mobilização para o dia 21 de agosto, que obviamente exige ser construída e organizada. Setores, como os do MPD que estiveram no Congresso dos Povos, discursaram bravamente, mas não levaram suas bases. Romperam com o governo, mas dizem que aplaudirão as medidas progressivas e criticarão as medidas que considerarem erradas.

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