Marcelo Serafim, de Floripa

Marcelo Serafim, de Florianópolis (SC)

O mundo esta estarrecido com as enchentes em Santa Catarina, milhares de desabrigados, mais de uma centena de mortos, cidades destruídas, famílias esfaceladas. Um quarto da população catarinense foi atingida. As imagens dos noticiários chocam a todos e provocam uma comoção generalizada, estimulando o espírito de solidariedade com aqueles que, além de perderem tudo que conquistaram a duras penas, também viram ceifadas as vidas dos seus entes mais queridos.

Muitos corpos estão desaparecidos. Em entrevista, o deputado e sargento Amauri Soares chegou a afirmar que “a defesa civil teve de parar de contar os corpos para cuidar dos vivos”. Os roubos e saques se tornaram comuns nas regiões alagadas diante do desespero de não ter água potável, comida, remédios, materiais de higiene. Milhares de animais mortos, regiões ilhadas, como o Morro do Baú, que praticamente desapareceu soterrando tudo à sua frente.

As pessoas encontram-se em galpões ou em escolas amontoadas a espera de doações de alimentos e água. Situação semelhante a uma guerra devastadora. Está tudo realmente destruído. E, para piorar a situação, há, agora, o perigo de leptospirose, doença transmitida pela urina de ratos e outros animais domésticos, e a iminência de novas chuvas. Foram mais de 60 dias de chuvas praticamente ininterruptas.

Alguns preferem culpar a natureza, a destruição da camada de ozônio, a ocupação desordenada ou até atribuir a um castigo divino. Neste caso, precisamos ir à raiz da questão. Como bons marxistas, “a raiz para o homem é o próprio homem”.

É importante compreendermos que numa sociedade dividida em classes sociais, no caso a sociedade capitalista, está centralmente voltada para o lucro e não para as necessidades mais elementares dos seres humanos como alimentação, vestimentas, lazer e habitação. É por isso que o caos que se instalou no Vale do Itajaí vai atingir de cheio a classe trabalhadora. Não podemos colocar numa mesma balança a burguesia.

Os burgueses que perderam suas casas, a esta hora devem estar nas suas casas de praia, em Itapema, Florianópolis ou mesmo curtindo sua tristeza em alguma praia da Europa. Os trabalhadores estão nos galpões dividindo o pão e a água. É nestes momentos, também, que podemos perceber a solidariedade de classe, a ajuda mútua entre os trabalhadores que sentem a mesma dor. A dor de ser um despossuído.

Santa Catarina sempre foi um estado dominado por algumas oligarquias. Já é de longa data que há um revezamento de poder entre o PP e o PMDB. Clientelismo, nepotismo e fisiologismo são práticas recorrentes em todos os governos que se sucederam. As enchentes sempre foram devastadoras como em 1974, 1983 e 1984 e nada se fez. Porém não se compara ao que está acontecendo.

A burguesia catarinense é, na verdade, a principal responsável pela atual situação. Luiz Henrique da Silveira, o governador, é hoje o seu principal representante e o maior responsável pela situação ter chegado aonde chegou. Desde que assumiu o governo, em 2004, Silveira aplica o receituário neoliberal no Estado. Cortou direitos dos funcionários públicos, arrochou salários, privatizou a Previdência estadual criando o Iprev, aumentou a terceirização no serviço público, demitiu trabalhadores, aumentou o número de secretarias regionais e de cargos de confiança, aumentando, conseqüentemente, os gastos. O governador sofre um processo no TSE por abuso de poder econômico nas últimas eleições.

Em Santa Catarina, qualquer empresário pode comprar licenças ambientais para seus empreendimentos especulativos na região litorânea. Ocupamos um dos piores índices nacionais em termos de saneamento básico. O crescimento dos latifúndios frente à ausência de uma reforma agrária há décadas vem empurrando as famílias de camponeses para as maiores cidades.

Não há um planejamento urbano, e as indústrias hoteleira e imobiliária mandam e desmandam, empurrando os trabalhadores cada vez mais para a periferia e morros das cidades. Como acontece nos grandes centros, os imigrantes pobres, expulsos de sua cidade de origem e que estão a procura de uma vida melhor, se vêem obrigados a morar de qualquer jeito e em qualquer lugar.

O país, agora, pôde perceber também o caos em que se encontra a saúde pública catarinense. Nas cidades mais distantes, não existem hospitais públicos. Os médicos são mal pagos, e os hospitais que existem não possuem equipamentos adequados ou especialistas. Isso obriga quem precisa a se deslocar para Florianópolis a procura de um atendimento melhor.

Por que será que as enchentes tomaram conta e as avalanches aconteciam uma após a outra? Em quase 60 dias de chuva, o governo do Estado se omitiu. O Vale do Itajaí poderia ter desaparecido do mapa. Isso não é exagero diante do descaso governamental.

Para piorar a situação, existem aqueles que procuram lucrar com a desgraça alheia. Muitos empresários estão superfaturando os preços, vendendo galões de água a R$ 10, o litro de gasolina a R$ 4 e por aí vai.

Com a crise econômica que assola o planeta e está derrubando grandes corporações, a situação na região, se agravará. Fábricas estão fechando, o abastecimento de gás está suspenso e a tendência é o aumentar o desemprego.

O gasto do governo federal com as enchentes em Santa Catarina é irrisório se comparado aos R$ 176 bilhões doados aos banqueiros. Lula tem mais soldados e gasta mais no Haiti do que com a crise das enchentes, ou seja, os bancos não podem morrer, o imperialismo de Bush deve ser obedecido. Já os trabalhadores que se virem. Essa é a lógica do capitalismo, governar para os ricos.

Precisamos de um programa dos trabalhadores para a região do norte do estado e Vale do Itajaí que rompa com a lógica capitalista e supra as necessidades fundamentais da classe trabalhadora.

  • Plano de obras públicas (casas populares, saneamento, hospitais)
  • Contratação de todos os atingidos pelas enchentes para trabalhar nas obras públicas
  • Isenção de todas as taxas – água, energia elétrica, telefone, IPTU – e transporte gratuito
  • Distribuição gratuita de remédios
  • Nenhuma prisão ou punição aos trabalhadores que saquearam para se alimentar, se vestir etc.
  • Expropriação dos estabelecimentos que superfaturam nos preços
  • Não-pagamento das dívidas do Estado aos banqueiros e aos empresários: utilização destes recursos nas obras públicas
  • Nenhum recurso do Estado para os empresários.
  • Nenhuma demissão
  • Estatização das empresas que demitirem
  • Reforma agrária sob controle dos trabalhadores
  • Crédito sem juros para os desabrigados
  • Crédito para recuperação da agricultura e da pecuária
  • Controle da distribuição dos créditos e donativos por entidades idôneas, da classe trabalhadora e dos movimentos sociais.
  • Prisão imediata dos corruptos que desviarem donativos e recursos
  • Transferência dos desabrigados para os hotéis, prédios públicos, casas de especulação imobiliária que não foram atingidas, até o restabelecimento da normalidade

    É importante que a Conlutas assuma a dianteira de uma campanha de solidariedade em unidade de ação com outras entidades do movimento sindical e popular, ao proletariado e os mais pobres da região, como caravanas ao local das enchentes, arrecadações nas bases das categorias e a denúncia do governo estadual e do governo Lula.