Rio de Janeiro: A saúde estadual cada vez mais entregue aos abutres! Corrupção na saúde deve ser crime hediondo

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Perciliana Rodrigues

A “dança das cadeiras” da Saúde estadual, promovida pelo governo Witzel, faz todo sentido quando o verdadeiro objetivo é manter o esquema de corrupção e favorecimento ao setor privado, em detrimento da garantia do direito à saúde pública de qualidade e combate à pandemia.

Apesar da “estabilidade” do número de contágio pela Covid-19 no Rio de Janeiro, o Brasil ultrapassou a marca de dois milhões de infectados e 78 mil mortos, sem falar da triste média de mais de mil mortes por dia. No estado do Rio, mais de 130 mil foram contaminados, e os mortos somam mais 11 mil (dados de 17/07/2020). Isto sem falar da subnotificação e do atraso de registros e óbitos em investigação, que, segundo os especialistas, daria um número de 5 a 10 vezes maior.

Sem vacina e sem medicamento que, seguramente, previna ou controle a doença, corre-se o risco dela virar uma doença endêmica (que se mantém sob certa frequência), e sermos obrigados a conviver com ela, matando centenas e/ou milhares de pessoas por dia. A pandemia vem provando ao mundo todo as diferenças entre existir, ou não, um sistema público de saúde. Tem provado a irresponsabilidade dos governantes para com a vida dos trabalhadores, posto que eles se comportam como representantes dos empresários da saúde e do neoliberalismo, colocando o lucro acima da vida. O sucateamento do SUS – Sistema Único de Saúde – implementado por décadas pelos diferentes governos, traduz-se, hoje, no abandono das vítimas da Covid-19.

Diariamente, somos bombardeados com mais notícias de superfaturamento e desvio de dinheiro, devido a um planejamento que visa a atender aos interesses do mercado de insumos e materiais da saúde. Antes mesmo da decretação de calamidade pública, as negociações entre corruptos e corruptores já estavam em curso.  O valor empenhado, segundo os noticiários, chegou a quase R$ 1 bilhão. Desse valor, R$ 250 milhões já foram pagos à empresa contratada, sendo que pouco mais de 100 leitos foram entregues somente.

Apenas depois do escândalo, anunciaram a suspensão do contrato com a IABAS – Instituto de Atenção Básica e Avançada de Saúde, Organização Social – entidade privada responsável pelo contrato de gestão dos hospitais de campanha, que não o cumpriu e atrasou, em mais de dois meses, a entrega dos leitos de hospital de campanha.  Diga-se de passagem, que esta instituição responde a inúmeros processos trabalhistas, e outros, em tribunal federal. Enquanto os grandes empresários e políticos brigam, centenas de trabalhadores estão sem receber seus salários, e muitos foram, sumariamente, demitidos. Faltam medicamentos básicos e condicionantes para garantir a estabilidade dos pacientes intubados. Sem estes medicamentos, muitos vieram a óbitos ou entraram em sofrimento profundo.

No entanto, a situação de caos da Saúde estadual não é de agora. Faz parte de um processo histórico de locupletação, ou seja, de enriquecimento entre governantes e empresários, fruto da relação estabelecida entre o público e o privado. Entre os anos de 2005 e 2012, mais de 7 mil leitos foram fechados no estado, segundo os dados do Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde (2013). O estado já era o terceiro lugar em perda de leitos, 18% do total nacional. O governo de Sérgio Cabral (MDB) foi responsável pelo maior processo de privatização ocorrido no estado, servindo como balão de ensaio para as políticas privatistas dos governos de Lula e Dilma, do PT. Junto ao governo municipal de Paes, redistribuiu as gestões das UPAS (Unidade de Pronto Atendimento), repassando-as, totalmente, para as Organizações Sociais (OSs). Essas organizações privadas levaram, entre 2012 e 2013, algo em torno de R$ 2 bilhões dos cofres públicos. Esta relação de superfaturamento e sangria dos cofres públicos não é de hoje e tem de ser combatida com radicalidade. O governo de Pezão (MDB) deu continuidade a ela, e Witzel (PSC) aprofunda essa mesma política.

O Rio de Janeiro, mesmo sendo um dos concentradores de equipamentos públicos, desde atenção ambulatorial até os hospitais de média e alta complexidade, não é o estado campeão em garantia de acesso à saúde pública, muito ao contrário, infelizmente. Com pontuação que vai de 0 a 10, as aferições do IDSUS 2012 (Índice de Desempenho do Sistema Único de Saúde) avaliaram o estado como um dos piores nacionalmente. Esse instrumento de avaliação foi, posteriormente, questionado por vários governos locais, já que expunha a triste realidade nas diferentes regiões do país.

Para os servidores da saúde estadual a situação só piorou. Continuam recebendo os piores salários, com condições precárias de trabalho, sem um PCCS (Plano de Cargos, Carreira e Salários). Faltam equipamentos de proteção individual – EPIs– e condições dignas e seguras de trabalho, fazendo com que centenas de profissionais de saúde tenham se contaminado, e muitos chegado a óbito.

Num sistema que já era incapaz de atender com qualidade seus usuários, com a pandemia, entrou em colapso. Além das longas e velhas conhecidas filas de espera para atendimento e cirurgias, a fila de leitos de assistência intensiva para tratar a Covid-19 agravou e, ainda, agrava a situação. Isso tem levado milhares à morte, o que poderia ser evitado. A “estabilidade” no estado tem a infeliz marca de mais de 100 mortes ao dia.

Voltando ao tema da “troca de cadeiras”, o mais novo Secretário de Saúde, o Sr. Alex Busquet, foi homem de confiança de Sérgio Cabral e Sérgio Côrtes, governador e Secretário de Saúde em 2012 respectivamente, que indicaram o tenente-coronel do Corpo de Bombeiros Busquet para ser interventor do IASERJ – Instituto de Assistência aos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Busquet comandou a transferência – ilegal – de pacientes em uma noite fria de julho de 2012, à revelia das equipes de saúde e dos familiares. E, depois, a “cessão” do terreno do IASERJ ao INCA (Instituto Nacional de Câncer), com a fatídica demolição do Hospital Central do Iaserj. Diga-se de passagem que a empreiteira que cumpria o triste papel de colocar abaixo aquele grande complexo hospitalar foi alvo em uma das operações da Lava-Jato e, por isso, as “obras” foram suspensas. Ou seja, este é o mais novo indicado de Witzel, mais um governante que também responde a processo por má gestão pública e, assim, enfrentará seu impeachment. Então, exigimos a imediata exoneração de Busquet.

Trabalhadores protestam contra a demolição do Iaserj, em 2012

Nas últimas semanas, um novo escândalo foi ao ar, envolvendo o ex-secretário da saúde estadual, o tenente-coronel da Polícia Militar Edmar Santos, também ex-diretor do Hospital Universitário Pedro Ernesto, vinculado à Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), onde é médico e professor (afastado para o cargo de Secretário). Malas de dinheiro, em reais e euro, um montante que somava R$ 8,5 milhões, foram achadas e vinculadas ao ex-secretário.

O buraco da corrupção parece um poço sem fundo que precisa ser mexido e expurgado. Desde sua gestão no hospital universitário, o movimento organizado dos trabalhadores, que enfrentou a “crise fiscal do estado”, já denunciava sua postura autoritária, assediadora moral e de práticas não transparentes, para quem dirigia um equipamento público. A forte greve dos trabalhadores da universidade, junto a outros segmentos do estado, foi a melhor barreira e resistência às ameaças de privatização advinda daquela gestão.

Tanto nacional quanto no plano estadual, a Saúde continua à deriva e à mercê da política neoliberal e, agora, de extrema-direita, racista, homofóbica e privatista, que tem levado milhares de trabalhadores à morte.

Resgate do SUS 100% estatal e sob controle dos trabalhadores

O SUS é uma importante conquista democrática da classe trabalhadora brasileira. O reconhecimento constitucional garantindo saúde como direito de todos, e dever do Estado, se deu em meio ao ascenso das lutas na década de 1980.  Após 30 anos de sua concepção, na prática, a configuração do SUS universal e estatal não se efetivou, devido a problemas estruturais resultantes do subfinanciamento e da forte presença do setor privado, que perduram.

Embora a saúde apareça como a principal necessidade da classe trabalhadora, esta área não está entre as prioridades de governo, ainda mais em tempos de crise econômica e pandemia. As iniciativas do governo para o setor têm sido a manutenção e aprofundamento do subfinanciamento, acrescido de sucessivos cortes orçamentários em várias áreas e, ainda, a ampliação da saúde como espaço de acumulação de capital e terceirização da gestão pública. Uma transformação real no SUS só poderá acontecer nos marcos de uma política econômica que coloque como prioridade o atendimento às necessidades da população. E isso só será possível num governo dos trabalhadores e para os trabalhadores, que resgate o direito universal à saúde como algo inalienável.

Exigimos

1 – SUS 100% estatal, público e de qualidade sob o controle dos trabalhadores

2- Investimentos de, no mínimo, 12% das recitas do estado na saúde pública estatal; duplicar o investimento atual em saúde

3 – Revogação de todas as leis privatizantes da saúde e reestatização de todos os serviços de saúde privatizados por Organizações Sociais, Fundação Saúde etc.

4- Fim do financiamento e subsídio estatal à saúde privada

5- Unificação de todos os leitos, públicos e privados, sob gestão pública e com controle dos trabalhadores

6- Combate à precarização das relações e condições de trabalho, garantia de EPIs e proteção aos grupos de risco

7 – Amplo concurso público com contratação por Regime Jurídico Único (RJU) para suprir a defasagem de profissionais, com garantia de salários dignos e Planos de Cargos Carreiras e Salários

8- Contratação emergencial de profissionais durante o período da pandemia

9- Construção de conselhos populares de saúde classistas, autônomos e independentes de governos e empresários

10- Eliminação de toda forma de opressão nas políticas e nos serviços de saúde, seja ela de gênero, racial ou por orientação sexual

11- Quarentena geral com garantia de direitos sociais, remuneração, estabilidade de emprego para todos os trabalhadores

12- Prisão para corruptos e corruptores e expropriação de seus bens para investimento imediato na saúde, com política de remuneração emergencial para todos que dela necessitem

13-Condenação dos corruptos e corruptores da Saúde por crime hediondo.

Fora Bolsonaro e Mourão! Fora Witzel e Cláudio Castro! Fora Busquet!