Em menos de um mês, novamente a cidade do Rio de Janeiro parou e chamou a atenção de todo o mundo. A disputa por sediar as primeiras Olimpíadas da América Latina envolveu o corpo e a mente da maioria das pessoas que, iludidas e enganadas, pararam para comemorar a vitória da cidade maravilhosa.

Esta semana, novamente a cidade chamou a atenção de todos. A diferença é que os risos e alegrias das comemorações anteriores pelas Olimpíadas foram substituídos pelo desespero, o terror, a indignação e a revolta de uma triste rotina de mais uma guerra civil no meio das casas e da população. O local, bairro de Vila Isabel, emblemático território cultural, do genuíno samba carioca, dos passeios em praça pública, da tradição da amizade e convívio entre seus vizinhos acabou nas principais manchetes policiais, vítima de mais um episódio da cultura da violência e da morte que impregna a cidade.

O Morro dos Macacos, lugar de gente humilde e pobre, abandonado pelos governos, é o local onde iniciaram os conflitos. Pertence à região da Tijuca, onde se localiza o bairro de Noel Rosa, uma parcela da cidade onde, coincidentemente, moram diversos ativistas do movimento estudantil e sindical que acabaram testemunhas de horas de terror. A noite de sexta para sábado foi em claro para todas essas pessoas que, chocadas, tiveram de trocar o sono pelo barulho ensurdecedor de verdadeiras armas de guerra das mais variadas, e ainda explosões de bombas e granadas simultâneas.

Munições e armamentos cada vez mais avançados e potentes que, pela primeira vez no Rio de Janeiro, neste conflito, derrubou um helicóptero matando dois policiais e ferindo outros. Sabemos que nenhum desses armamentos são produzidos por aqueles moradores e em nenhum local daquela comunidade. É inaceitável que trabalhadores humildes que sofrem os principais problemas sociais e os descasos dos governos tenham de pagar o alto preço de morarem no morro e serem, com frequência, igualados e tratados como bandidos.

O que começou com uma disputa de facções rivais pelo controle de pontos de vendas de drogas virou uma tremenda guerra civil com a invasão indiscriminada dos policiais na comunidade. Moradores que chegavam cedo do trabalho eram impedidos de entrar nos acessos ao morro e com o tempo passando, ficavam preocupados com a segurança dos parentes que lá permaneciam no meio do fogo cruzado entre polícia e traficantes.

O que os jornais burgueses esqueceram ou não quiseram falar é que boa parte dos policiais que foram mandados para a área do conflito não estavam interessados nos traficantes e sim em moradores que espontaneamente os enfrentavam improvisando barricadas, queimando pneus e arremessando objetos.

Uma moradora do morro, quando questionada por um morador de um prédio em frente, por pegar um lixo da calçada e jogar na rua esbravejou: “Este barulho que você está ouvindo é tiro na porta de minha casa, não consigo subir para ver meu filho, não é seu filho que está lá em cima, não é sua família que está lá”.

No mesmo prédio, uma moradora gritava da varanda: “Um absurdo a polícia invadir o morro assim, essa hora da manhã, as pessoas não podem subir e também não podem descer”.

Outra moradora do morro dos macacos agradeceu: “Obrigada tia, é isso mesmo, é nossa família que está lá em cima. Vocês precisam entender o que passamos todos os dias”.

Como se não bastasse a angústia pela falta de informações dos parentes, os manifestantes foram brutalmente atacados com jatos de spray de pimenta lançados pelos policiais.

No desenrolar desse processo, com o caos produzido pela polícia, começou a haver ameaças de ataques por traficantes em diversos pontos da cidade. Ônibus e fios foram queimados fazendo com que diversas ruas fossem fechadas pelos policiais provocando um verdadeiro estado de sítio com diversas ruas fechadas, engarrafamentos e muita confusão. O saldo foi de 11 mortos e diversos feridos.

Com as Olimpíadas, violência só vai aumentar
A maior promessa dos governos responsáveis pelo início do projeto olímpico passa principalmente pelo aumento da segurança, seguindo a cartilha dos países líderes imperialistas. A situação do Brasil em relação a ter seus graves problemas sociais solucionados pouco vai mudar. A esperança honesta da maioria da população que vislumbrou melhorias nas condições de vida com a chegada do maior evento esportivo mundial tende a se transformar numa grande decepção.

Assim como foi nos jogos Pan-Americandos, realizados no Rio de Janeiro em 2007, o dinheiro gasto ultrapassou todos os orçamentos virando uma verdadeira caixa-preta, boa parcela das construções esportivas estão abandonadas por estarem em locais isolados e também por não haver uma política de incentivo ao esporte. Durante o evento ocorreu uma verdadeira ocupação militar em locais estratégicos para garantir a segurança exclusiva dos competidores. Para a população carioca, principalmente a mais carente, o que restou foi a repressão e a violência desordenada.

O governador do Estado, Sérgio Cabral (PMDB), é um velho conhecido do movimento social e sindical. Tenta implementar a passos largos seu projeto de privatização da saúde, cultura e educação. Ataca os trabalhadores em seus direitos a estabilidade, em seus planos de carreiras e salários e implementa cada vez mais trabalhos terceirizados e precarizados.

Para a população mais carente a política adotada é a construção de muros nos morros para impedir a construção de mais casas. Essa gente continua a sofrer cada vez mais com o desemprego, a carência de atendimento em hospitais, a falta e o preço abusivo dos transportes e a privação do acesso a uma alimentação barata e de qualidade.

Sérgio Cabral, assim como o prefeito Eduardo Paes e Lula, não governam para o povo, mas para os empresários, banqueiros e organizações mundiais. Os bilhões de reais que serão investidos pelo estado na organização das Olimpíadas poderiam servir para resolver todos esses problemas sociais, mas todo ele já está comprometido com os empresários envolvidos no projeto.

Para os trabalhadores e os movimentos sociais, a situação, além de não mudar, vai piorar ainda mais com o aumento do efetivo policial programado para a segurança da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Já que o governo não vai melhorar as condições de vida da classe trabalhadora a saída será investir bilhões em segurança e criminalizar ainda mais os movimentos sociais e a pobreza. Além dos banqueiros e empresários da construção civil, um dos setores que mais vai lucrar são as indústrias de segurança, as mesmas que fabricam os armamentos de alta tecnologia que vão parar misteriosamente nas mãos de traficantes nos morros da cidade, promovendo as rotinas de terror como no morro dos Macacos, num genuíno bairro cultural carioca como Vila Isabel.