Pesquisas indicam que Lula poderá terminar seus dois mandatos com uma alta popularidade entre os trabalhadores. Muitos deles veem o governo como seu, e acreditam que o presidente “governa para os pobres”. Afinal, pela primeira vez na história, um ex-metalúrgico, cuja trajetória política foi construída nas greves operárias do ABC, chegou à Presidência. “Lula é um dos nossos”, pensavam muitos trabalhadores em 2003 e ainda agora.

Mas a história de Lula e sua origem operária escondem para quem efetivamente o presidente vem governando. É verdade que Lula foi um operário. Mas hoje governa para os grandes empresários e banqueiros, não para os trabalhadores. Apoiado nessa ilusão, ele tenta eleger a ministra Dilma Rousseff e, assim, tentar voltar numa nova reeleição em 2014.

Para comprovar isso, é preciso colocar lado a lado e comparar as principais medidas do governo para socorrer os empresários com as que supostamente ajudaram os trabalhadores. Dessa maneira, poderemos ver para quem Lula realmente governa.

O que o governo fez para os ricos

“Sou governante dos ricos também. E tenho certeza de que eles estão muito satisfeitos porque ganharam muito dinheiro no meu governo”, lembrou Lula em setembro (Valor Econômico, 17/9/2009).

De fato, os ricos têm muito a comemorar. Só os primeiros três anos e meio de governo Lula foram mais lucrativos para as grandes empresas brasileiras do que o mesmo período do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (FHC). Entre janeiro de 2003 e junho de 2006, as 227 maiores empresas de capital aberto tiveram lucro líquido de R$ 131,694 bilhões, segundo levantamento da consultoria Economática. Entre janeiro de 1999 e junho de 2002, esse valor foi de R$ 29,281 bilhões. Essa é a verdade que diz tudo sobre o governo Lula: em seu primeiro mandato, os lucros dos empresários cresceram 394,8%, ou seja, quadruplicaram.

Os banqueiros também quebraram recordes nesse mesmo período. A mesma pesquisa da Economática mostra que os 23 bancos brasileiros de capital aberto também lucraram mais de 100% no governo Lula. Entre o governo FHC e o primeiro mandato de Lula, os lucros passaram de R$ 26,7 bilhões para R$ 54,5 bilhões, ou seja, mais que dobraram. E, ao contrário dos Estados Unidos, a crise mundial não afetou os bancos daqui. Mais uma vez, a política econômica do governo Lula rendeu aos bancos lucros de mais de R$ 14 bilhões apenas no primeiro semestre de 2009.

Para os grandes fazendeiros, o presidente também é “o cara”. Desde 2003, o governo repassou para o agronegócio mais de R$ 106 bilhões de reais através do Ministério da Agricultura e do fornecimento de crédito do Banco do Brasil e do BNDES (Gazeta Mercantil, 18/05/2009). Só para comparar, esse valor é dez vezes maior do que o orçamento de R$ 11,4 bilhões previsto para o programa Bolsa Família este ano. Também é duas vezes e meia maior do que o orçamento de R$ 41,6 bilhões do Ministério da Educação e quase 75% maior que toda a verba do Ministério da Saúde. Enquanto isso, a reforma agrária está paralisada.


Avanço para os trabalhadores?

Todos esses números astronômicos do texto ao lado se chocam com a dura realidade vivida pelos trabalhadores que, na sua maioria, recebem pouco mais de um salário mínimo e fazem milagres para permitir que seus filhos tenham o que comer: duplas jornadas de trabalho, bicos nos finais de semanas e feriados etc.

Apesar dos discursos oficiais para iludir o povo, o valor do mínimo continua rebaixado. Na campanha eleitoral de 2003, Lula prometeu dobrar o salário mínimo em seus primeiros quatro anos de governo. Na época, o mínimo era de R$ 200. Para que fosse dobrado seu poder de compra (descontada a inflação), o salário deveria ser de R$ 580 em 2006. Mas nem passou perto, chegando a R$ 350. Lembremos que nesse período os lucros das grandes empresas quadruplicaram.

Hoje, quase terminando o segundo mandato, o salário mínimo é de R$ 465. Para ter uma vida digna, garantir alimentação, vestuário e moradia, o Dieese calcula que o valor deveria ser de pelo menos R$ 2.085. É importante lembrar que a elevação significativa do mínimo traria um benefício direto a mais de 40 milhões de trabalhadores e suas famílias.

O governo tampouco combateu as bases da miséria. O país da Olimpíada continua recordista em desigualdade social. O gasto anual de um pobre no Brasil é o mesmo de um rico em apenas três dias, segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Mas os ricos são apenas 1% da população. Hoje, quase metade dos jovens de até 17 anos está em situação de pobreza ou extrema pobreza. Ou seja, mais de 11 milhões de pessoas têm um rendimento domiciliar de até meio salário mínimo por mês (R$ 230). (Síntese dos Indicadores Sociais – IBGE). Um dos trágicos resultados dessa realidade é o aumento da violência nas grandes cidades.


Governo ataca aposentados

Ataques contra os aposentados foram expedientes rotineiros dos governos de direita. Com Lula, a situação não é diferente. Seu governo mantém os reajustes miseráveis da aposentadoria.

Desde 1991, quando o governo Collor impôs a desvinculação das aposentadorias do salário mínimo, os benefícios vêm sofrendo uma profunda defasagem. Estudos mostram que quem ganhava dez salários mínimos em 1991, recebe hoje o equivalente a apenas 4,8 salários (R$ 2.259). Um estudo da Comissão de Orçamento do Congresso mostra que, enquanto o salário mínimo havia sido reajustado em 104,2%, as aposentadorias acima desse piso tiveram aumento de apenas 20%.

Quem ganhava dois salários mínimos na época da desvinculação recebe hoje apenas um. Ou seja, teve sua aposentadoria reduzida pela metade. Quem recebia três recebe hoje pouco mais que um salário mínimo. Como se não bastasse, o governo FHC criou o fator previdenciário, que adia ao máximo a aposentadoria do trabalhador.

O governo Lula manteve o conjunto desses ataques. Um projeto do governo que tramita no Congresso mantém a desvinculação do salário mínimo e estabelece uma fórmula de reajuste que prevê a reposição da inflação no período mais 50% do crescimento do PIB de dois anos antes. Assim, em 2010, os aposentados teriam reajuste real entre 1,5% e 2,5%. No ano seguinte, haveria apenas reposição da inflação, por causa da crise deste ano. Depois disso, não existe política definida.

Além disso, haveria o fator 85/95. Isso significa que a aposentadoria só seria integral ao segurado cuja idade e tempo de contribuição somem 95 (85 para as mulheres).

O pior de tudo foi essa política ter sido um acordo com as centrais sindicais. CUT, Força Sindical, UGT e CGTB assinaram uma proposta que trai as batalhas dos aposentados, como a recomposição das perdas nos últimos anos.


Crise econômica: a quem o governo apoiou?

Ao ligar a TV, os trabalhadores assistem a uma enorme campanha sobre como o país superou a crise econômica. Na verdade, o Brasil acompanhou a dinâmica da economia internacional, entrando em recessão no final de 2008, início de 2009.

A crise, porém, foi atenuada devido a alguns fatores como o mercado interno, que sustentou a economia depois da queda das exportações, e a ajuda bilionária do governo ao empresariado. No total, o Estado entregou cerca de 300 bilhões de reais aos bancos e grandes empresas. Além disso, estimulou o consumo, reduzindo o IPI para automóveis, eletrodomésticos e materiais de construção. Assim, o setor automobilístico foi um dos que mais mandaram lucros para fora do país. As remessas para o exterior superaram os 2,8 bilhões de dólares só nos últimos meses de 2008. Com a isenção do IPI, deixou-se de arrecadar algo entre R$ 1,3 bilhão e R$ 2,5 bilhões em impostos, enviados para fora do país pelas multinacionais para tapar o rombo das matrizes.

Mas não houve aumento no número de empregos do setor. As empresas aproveitaram a crise para demitir e aumentar a exploração sobre os trabalhadores. O resultado é que nós estamos pagando os custos da recuperação parcial da economia, com salários rebaixados, ritmo de trabalho brutal (para compensar os demitidos) e precarização das condições de trabalho.

Outros setores da burguesia também foram beneficiados com empréstimos do governo. Só o BNDES fez o maior desembolso de sua história no último semestre. Liberou aproximadamente R$ 75 bilhões até julho, três vezes mais do que no mesmo período do ano passado.

Durante a crise, ficou claro que o governo Lula age em defesa dos grandes patrões. Deu a eles 300 bilhões de dólares. Para os trabalhadores, sobraram os sacrifícios.
O destino da economia brasileira está ligado aos rumos da crise mundial. As multinacionais dominam nossa economia. Uma nova crise internacional vai ocorrer e ela deve atingir o Brasil com força. Não há como prever quando e como isso vai ocorrer. Mas o grau de dependência da nossa economia vai cobrar um alto preço. Enquanto isso, Lula tenta manter seu plano de jogar a crise para depois das eleições de 2010 e, assim, eleger Dilma.

O mito do país do futuro?
Um bombardeio de declarações ufanistas, enaltecendo o potencial brasileiro, é realizado pela mídia e o governo. Olimpíada, Copa do Mundo, pré-sal e empréstimo ao FMI estão sustentando uma onda de entusiasmo nacionalista pelo país. Afinal, será que o Brasil será desta vez “o país do futuro”?

Todo o otimismo propagado contrasta com a realidade do país, que não escapa dos graves problemas sociais e continua com sua economia subordinada às multinacionais.
Livres do FMI?

Em abril, o governo anunciou que emprestaria dinheiro ao FMI. De imediato, o país deixou à disposição 4,5 bilhões de dólares. Esse valor é maior do que o orçamento do Bolsa Família (R$ 11,4 bilhões), vedete do governo. Ou seja, esse dinheiro poderia ser usado no Brasil para ajudar a resolver graves problemas sociais. Por outro lado, o empréstimo não significa o fim do rigor fiscal imposto a países como o nosso, com os superávits fiscais para cortar gastos sociais e pagar as dívidas aos bancos. Ao contrário. Toda a economia do país continua voltada ao pagamento de juros da dívida pública. Dados da Auditoria Cidadã da Dívida mostram que, entre 1995 e 2008, os governos pagaram R$ 1,8 trilhão em juros e amortizações das dívidas. Mas a dívida interna só cresceu nesse período, saltando de R$ 61 bilhões para R$ 1,68 trilhão. Em 2008, o governo Lula gastou R$ 282 bilhões com juros e amortizações da dívida pública, o que representa 30,5% da arrecadação tributária do país.

Pré-sal e soberania
O anuncio de como será a exploração do petróleo do pré-sal foi acompanhado de um discurso supostamente nacionalista. Lula e Dilma falam em “independência nacional” para esconder que esse projeto continuará com a entrega das nossas riquezas ao grande capital internacional.

No modelo tucano (regime de concessão), as áreas de exploração petrolíferas eram leiloadas e o Estado recebia impostos, royalties e participações especiais. No modelo petista (partilha), o Estado é proprietário de parte do óleo extraído e a empresa, da outra parte. Ou seja, ao contrário da propaganda governista, existe um grande ponto de acordo entre o projeto de Lula e o de FHC: as multinacionais continuam “sócias” na exploração de nosso petróleo. E isso não tem nenhuma justificativa, nem por tecnologia (a Petrobras detém o maior conhecimento na exploração de águas profundas), nem capital (muito disso será financiado pelo BNDES).

Lula manteve e realizou os leilões das áreas de petróleo criados por FHC. O governo não vai retomar nenhuma área ou bloco entregue às multinacionais em regime de concessão. Por meio dele, 29% do pré-sal já foi entregue a essas multinacionais. Apenas 71% da área do pré-sal será explorada sob o regime de partilha, ou seja, o petróleo existente será dividido entre a União e as multinacionais. Em somente 30% desta área, a Petrobras terá garantida sua exclusividade, ou seja, apenas 21% do total.

Se realmente fosse nacionalista, o governo Lula teria cancelado todas as medidas entreguistas do governo FHC e restabelecido o monopólio da exploração do petróleo ao Estado.

Como se não bastasse, Lula continua impondo uma privatização silenciosa nas estatais. Recentemente, anunciou que vai permitir o aumento da participação do capital estrangeiro no Banco do Brasil. A decisão vai aumentar o limite na composição acionária de 12% para 20%. A medida foi elogiada pelo ex-presidente FHC. “Na Petrobras, o que nós fizemos foi o que ele está fazendo no Banco do Brasil agora, dar maior dinamismo, transformar em uma grande empresa. (…). No Banco do Brasil, o Lula está fazendo isso, parabéns”, disse FHC.

Olimpíada e a Copa do Mundo
Toda a campanha realizada em torno da Olimpíada e da Copa contrasta com a situação esportiva do país. O governo repete a mesma demagogia da época do Pan, dizendo que vai incentivar o esporte brasileiro. Ao anunciar o país como sede dos Jogos Olímpicos, pretendeu reforçar o peso de Lula, além de ser uma grande jogada política das multinacionais e uma aposta segura de bons negócios.

Mas não é possível desenvolver o esporte nacional sem encarar os problemas sociais. Para mudar o acesso do povo a educação, alimentação, saúde e esporte, é preciso mudar radicalmente a estrutura social do país. Ou seja, transformar radicalmente a política econômica, algo que este governo não fez e nem vai fazer.

Para esconder a miséria, os governos de Lula e Sérgio Cabral (governador do Rio) desenvolvem uma política de segurança de ultradireita, com repressão violenta e indiscriminada às favelas e comunidades pobres. Para a polícia, todos os jovens negros são traficantes e podem ser mortos sem julgamento.

Ocupação do Haiti
O governo Lula se orgulha de sua política externa supostamente “progressista”. Mas basta olhar para o Haiti, onde tropas brasileiras lideram uma ocupação militar, para ver que é outra ilusão. A ocupação é talvez uma das mais vergonhosas demonstrações da submissão deste governo ao imperialismo e à burguesia. Há cinco anos, o Exército Brasileiro lidera a Missão de Estabilização do Haiti (Minustah), que ocupa o país com 6.700 soldados. O Brasil possui o maior contingente, 1.300.

Bem diferente do que o governo e a grande imprensa dizem, a missão não é uma “ajuda humanitária” ao povo haitiano. A ocupação exerce uma imensa opressão sobre o povo. Nestes cinco anos, ocorreram inúmeras denúncias de violação dos direitos humanos – como estupros e assassinatos – pelas tropas.

Ao manter a ocupação, o Brasil colabora com o plano do imperialismo norte-americano de transformar o Haiti numa verdadeira colônia, aproveitando sua baratíssima mão de obra. O governo dos EUA aprovou uma nova lei que facilita a exportação dos produtos têxteis fabricados pelas maquiladoras instaladas no país, isentando-as de impostos.

Um exemplo recente foram as ações repressivas realizadas pelos soldados da ONU, com a polícia haitiana, para impedir os protestos do 1° de Maio. As tropas da Minustah também foram acionadas para reprimir a luta do povo haitiano pelo reajuste do salário mínimo, o que resultou em pelo menos duas mortes. Em agosto, os soldados foram novamente acionados para deter uma onda de greves dos trabalhadores da indústria têxtil do país.

Em setembro, empresários brasileiros visitaram o Haiti em busca de novas oportunidades de negócio. Entenda-se, explorar a mão de obra mais barata do continente. Sem a presença militar brasileira, esse plano não seria possível, pois a Minustah assegura a “paz social” para que os trabalhadores do país sigam explorados.

A falsa polarização entre PT e PSDB
Nestas eleições, a ministra Dilma será apresentada como uma defensora da “soberania nacional” e das “conquistas sociais do governo Lula”. Esse discurso não sobrevive aos fatos, mas será usado para que os trabalhadores votem no PT contra “a volta da direita”.

Já a oposição burguesa vai lembrar as histórias de corrupção do governo Lula (mensalão, defesa de José Sarney etc), esquecendo-se de todo o mar de lama de seu governo (privatizações, compra de votos para emenda da reeleição etc).

Apesar dos enfrentamentos eleitorais, não há nada mais parecido com um governo petista do que um governo tucano. Ambos compartilham o mesmo plano econômico neoliberal e a mesma corrupção. Todos têm suas campanhas financiadas por empresários e defendem os interesses do grande capital, em particular das multinacionais e dos banqueiros.

Assim como no governo tucano, Lula teve representantes diretos da burguesia, como Henrique Meirelles (ex-presidente do BankBoston) ou Furlan (Sadia).

Votar em Dilma ou em José Serra significa dar um cheque em branco para que prossigam com a corrupção e os ataques aos nossos direitos e à nossa soberania.