O projeto da reforma sindical articulada pelo governo Lula, CUT, Força Sindical e empresários é um tiro certeiro nos direitos históricos dos trabalhadores. Como se não bastasse dar maior poder às cúpulas pelegas das centrais sindicais e restringir duramente o direito de greve, o próprio projeto antecipa a reforma trabalhista, colocando em xeque direitos fundamentais, como o 13º, as férias e a licença-maternidade.

O projeto, da forma como foi remetido ao Congresso, exclui o “princípio do uso da norma mais benéfica aos trabalhadores“. Hoje, caso duas leis sobre o mesmo assunto se choquem, prevalece a que mais beneficia o trabalhador. No atual projeto esse item some, abrindo caminho para a retirada de direitos.

Todas as conquistas dos trabalhadores seriam passíveis de negociação entre patrões e empregados. Dessa maneira, a reforma sindical quer instituir o princípio de que o negociado prevalece sobre o legislado. Ou seja, todas as conquistas dos trabalhadores seriam passíveis de negociação entre patrões e empregados. Férias, licença-maternidade, 13º, horas extras, tudo isso poderia ser “negociado“.

Como se não bastasse, o empresariado ainda está fazendo uma mobilização para que a reforma sindical tramite juntamente com a trabalhista, a fim de garantir a completa retirada de direitos.

O projeto faz exigências que praticamente inviabilizam qualquer paralisação. O artigo 113 do projeto de lei da reforma estabelece que a greve não poderá causar “prejuízo irreparável ao patrimônio do empregador ou de terceiros“. Ou seja, a greve não pode causar prejuízo ao patrão.

A reforma também impede a realização de piquetes de convencimento e criminaliza o direito de greve. De acordo com o artigo 119 do projeto, “a responsabilidade pelos atos ilícitos ou crimes cometidos no curso da greve será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil ou penal“ – caso já estivesse em vigor, a greve nacional dos bancários realizada em 2004, por exemplo, seria considerada ilegal. Sob o falso argumento de que vai acabar com os sindicatos pelegos e eliminar as taxas compulsórias, a reforma pretende, na verdade, fortalecer as centrais sindicais. Em vez de eliminar o imposto sindical, a reforma dá condições para que os sindicatos pelegos aumentem o teto da contribuição, hoje de 3,3%, para um total de 13% de um salário mensal. Vejamos uma conta rápida, tomando o caso da CUT, que diz representar 22 milhões de trabalhadores: o IBGE calcula o salário médio do trabalhador brasileiro em cerca de R$ 900. O projeto de reforma sindical diz que poderá ser descontado de cada trabalhador (além da mensalidade sindical) até 13% de um salário mensal por ano, e que 10% disso irá automaticamente para a central. O valor descontado, com base no salário médio, seria, portanto, de R$ 117 (13% de 900). Desse valor, R$ 11,70 (10% de 117) iriam para a central.

Multiplicando pelo número de trabalhadores que a CUT diz representar, temos mais de R$ 250 milhões (hoje a CUT recebe anualmente dos seus sindicatos filiados não mais de R$ 15 milhões por ano). A nova redação que se propõe para o artigo 8º da Constituição Federal não só dá ao Estado o poder de atribuir ou não personalidade sindical às entidades fundadas pelos trabalhadores como obriga os sindicatos de base a se filiarem a uma central sindical para terem sua representação reconhecida pelo Ministério do Trabalho. A volta da interferência do Estado nos sindicatos chega a requintes que nem Getúlio Vargas imaginou: o Ministério do Trabalho reconhece ou não a entidade, define o que pode e o que não pode constar em seus estatutos e pode intervir na entidade que não obedecer suas diretrizes, cassando sua representação sindical.

A proposta de emenda constitucional traz também uma “novidade“ ao exigir do sindicato, para que obtenha a representatividade, critérios de “agregação que assegurem a compatibilidade de representação em todos os níveis e âmbitos da negociação coletiva“. Na prática, obriga o sindicato a se filiar a uma central sindical e suas confederações ou federações. Essas centrais /confederações /federações, por outro lado, ganham poder de negociar e assinar acordos em nome dos trabalhadores sem consultar nenhuma assembléia de base. Para se opor a esse projeto, a Conlutas, Coordenação Nacional de Lutas, e os mais de 200 sindicatos que a compõem lançaram uma jornada de lutas que se iniciou nos meses de março e abril, com uma forte campanha de denúncia contra a reforma nos locais de trabalho.

Faremos no 1º de maio um ato contra as reformas e, na primeira semana do mês, manifestações e paralisações em todo o país. No mês de junho, realizaremos uma grande marcha a Brasília contra as reformas sindical e trabalhista e a política econômica do governo Lula.

José Maria de Almeida, o Zé Maria, 48, metalúrgico, membro da coordenação da Conlutas, é presidente nacional do PSTU.
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Artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, no dia 21/4/2005, na editoria Opinião