Erika Andreassy, da Secretaria de Mulheres do PSTU

Érika Andreassy, do Instituto Latino Americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE)

O governo federal anunciou que, no mês de fevereiro, foram gerados 400 mil empregos com carteira assinada e comemorou os números como se fossem os maiores desde 1992. O Ministro da Economia Paulo Guedes afirmou que os resultados mostram que a economia brasileira “está se recuperando em altíssima velocidade” e que o país está “definitivamente no caminho certo” da recuperação econômica. Nada mais falso.

Primeiro, esta comparação não pode ser feita, pois houve uma mudança na metodologia de coleta das informações sobre o emprego formal. Em 2020, o levantamento passou a usar dados mais abrangentes, incluindo, por exemplo, outras categorias de trabalhadores, como temporários, estagiários e bolsistas que, antes, não eram contabilizados, tornando os resultados incomparáveis.

Segundo, esta afirmação mentirosa do ministro contrasta com uma realidade cada vez mais difícil de esconder: o desemprego massivo e o brutal alastramento da fome e da miséria pelo país. Em um ano, o total de desempregados cresceu 20% e o de desalentados (ou seja, que já desistiram de procurar por uma vaga), 25%.

Mas, o drama é ainda maior: 55% da população vive, hoje, em situação de insegurança alimentar. No bom português, passam fome.

“Emprego recorde” não reflete a realidade

Até 2019, o emprego formal era medido pelo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), que registrava, mensalmente, as admissões e demissões de todos os trabalhadores sob o regime da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), ou seja, com carteira assinada; e pela RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), que é enviada anualmente e abarca, também, outras categorias, como trabalhadores avulsos, diretores sindicais, servidores públicos etc.

Em 2017, com a Reforma Trabalhista de Temer, a coleta de dados do Caged instituiu as primeiras mudanças, incluindo nos números de empregados os trabalhadores em regime intermitente, trabalho parcial e teletrabalho. A partir de janeiro de 2020, o cálculo passou a ser feito com base a informações de três sistemas: Caged, eSocial e Empregador Web (onde se registram os pedidos de seguro-desemprego), o que foi batizado de Novo Caged.

O eSocial é um sistema digital, que unifica registros fiscais, previdenciários e trabalhistas. Criado em 2014, é um sistema mais abrangente que o Caged, incluindo modalidades como bolsistas, temporários, trabalhadores autônomos, agentes públicos e até dirigentes sindicais. Ou seja, contabiliza relações de trabalho que nada têm a ver com os empregos formais, baseados na CLT e registrados em carteira de trabalho, os quais, por sua vez, também são captados pela RAIS.

Como se pode ver, o “emprego recorde com carteira assinada” que o governo está anunciando não tem consistência alguma e está longe de refletir a realidade do mercado de trabalho formal. Pra piorar, economistas alertam para a possibilidade de subnotificação de demissões no Novo Caged, em função da quantidade de empresas que fecharam. Os dados do Caged mostram vagas nas empresas que estão declarando, mas as empresas que fecharam não estão informando as demissões, o que pode gerar a falsa impressão de que está havendo menos cortes.

EXPLOSÃO

Trabalho intermitente: informalidade legalizada

O exemplo mais evidente do discurso mentiroso do governo em relação à geração de empregos com carteira assinada é o peso que o trabalho intermitente ganhou no mercado de trabalho “formal”, no último ano. Em 2020, das 142 mil vagas formais geradas, mais da metade (73,1 mil), foi na modalidade de trabalho intermitente, que não prevê nem jornada nem salário fixos.

Em 2018 e 2019, esse formato representou, respectivamente, 9,4% e 13,3% de todos os postos com carteira assinada criados. Os dados de 2020 apontam, portanto, uma explosão desse tipo de emprego, que permite a contratação de trabalhadores sem horário fixo, ganhando somente pelas horas trabalhadas.

Para ter uma ideia do que isso representa em termos precarização do trabalho, de acordo com o Dieese, dos empregados admitidos e demitidos entre janeiro e dezembro de 2018 com vínculo de trabalho intermitente, 43% tiveram remuneração inferior a um salário-mínimo, sendo que 11% desses trabalhadores intermitentes não tiveram qualquer renda. Chamar isso de emprego formal ou colocar no mesmo patamar que uma vaga com jornada e salário fixos só serve para gerar confusão.

É revoltante que, em meio ao aprofundamento da pandemia e da crise econômica, o governo venha com mais esta “fake news” pra cima da classe trabalhadora. Isso só reforça a necessidade de intensificarmos a batalha pela unidade classe, pra botarmos pra fora esse governo mentiroso e genocida, derrotando seu projeto de morte, fome e miséria.