Franck Mata Machado
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Francisco Mata Machado, conhecido como Franck, é um militante com tradição na esquerda mineira. Antes de se decidir pelo PSTU, foi militante do PT e, mais recentemente, dirigente das Brigadas Populares, grupo que atua em ocupações urbanas.

Em janeiro deste ano, Franck rompeu com as Brigadas Populares alegando que o grupo se transformou numa ONG em que não há um programa claro, nem democracia interna, nem independência financeira dos governos. Na ocasião, ele escreveu uma carta de ruptura com o grupo.

A partir de então, o PSTU iniciou um debate com o militante que culminou na sua adesão ao partido. Abaixo, publicamos sua carta de ingresso no PSTU.

  • Caríssim@s Companheir@s e amig@s,

    Desde a queda dos regimes stalinistas no final do século XX, um vendaval oportunista assolou o que de mais precioso se edificou em toda a modernidade ocidental, ou seja, as organizações independentes dos trabalhadores, sem as quais os desígnios de emancipação social, autonomia, razão, reconhecimento, igualdade e liberdade jamais podem se tornar realidade histórica, condenando-se eternamente à precária condição de promessas enganosas, elegantemente definidas pelo cinismo da filosofia liberal como horizontes regulativos.

    O fim das tiranias conduzidas pelas burocracias coincidiu com um sério descrédito do projeto de uma sociedade socialista, ao tempo em que capitalistas e antigos ativistas da esquerda coincidiram, menos por ingenuidade e mais por oportunismo, em propagar duas errôneas lógicas, quais sejam:

    a) a de entender que o ocaso de um projeto revolucionário na antiga URSS implicaria, por inferência indutiva, o malogro de qualquer tentativa histórica de superação do capitalismo, de tomada do poder pelos trabalhadores e de implantação do modo de produção socialista, expressando-se, assim, uma delirante metodologia da história, segundo a qual um caso empírico permite a formulação de uma regra atemporal e;

    b) a de se atribuir aos regimes burocráticos não apenas a equivocada caracterização de Estados Socialistas, como a exclusividade do referido predicado, de tal arte que se associou inarredável e absolutamente o socialismo ao stalinismo, como se de significante (socialismo) e de significado histórico (stalinismo) se tratassem. Derrotado o modelo em comento, antigos PCs, social-democratas e até mesmo muitos autoproclamados trotskistas abdicaram da luta por uma sociedade em que não haja dominação da humanidade pela humanidade e se enclausuraram nos aparatos do Estado, dos sindicatos e das ONGs. Todos nós conhecemos aos menos uma dúzia de pessoas que, outrora militantes, hoje são gestores comissionados de políticas públicas, assessores semi-vitalícios de sindicatos, executivos de ONGs ou redatores de projetos para captação de recursos junto ao Estado ou ao mercado. Enquanto isso, a renda se concentra, as finanças se mundializam, a repressão se exacerba e muitos, outrora camaradas na luta contra tais ataques, dão de ombros e buscam se adaptar à mais nova forma de acumulação privada e exploração do trabalho, a atender pelo nome de terceiro setor.

    Mas nem tudo é desolação…

    Há um partido que ainda sustenta a necessidade de internacionalização da luta dos trabalhadores e sabe que, tendo em vista a derrota histórica da doutrina do socialismo em um só país e a necessidade de enfrentamento global contra ofensivas do capital apátrida, se constitui como seção brasileira de uma organização internacional.

    Há um partido que, coerente com o materialismo histórico e com o aforismo marxiano de que “a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”, não se financia por projetos ou convênios, mas mediante a contribuição daqueles que se identificam com seu programa.

    Há um partido que conhece a história e sabe que pouquíssimos na esquerda objetaram o stalinismo, mas foram imprescindíveis na preservação do marxismo. Há um partido que compreende que muitos não anteviram o colapso da social-democracia, dado seu caráter estruturalmente capitalista e afeito à acumulação privada, mas que jamais se isentou de denunciá-la. Há um partido que não ignora que, desde as Guerras de Independência até a doutrina da aliança com uma certa burguesia nacional, poucos foram os que, em nosso subcontinente, resistiram ao canto sedutor, mas enganoso, dos caudilhos e líderes carismáticos, cuja atuação não se submete à democracia operária e cujas trajetórias não se forjam nas lutas sociais.

    Há um partido que, mesmo temporariamente minoritário no âmbito da esquerda, preserva sua responsabilidade diante dos trabalhadores e se nega a semear ilusões.

    Há um partido que não se proclama dono da verdade ou única força em favor da superação do capitalismo, mas que apresenta suas contribuições e se engaja em cada tarefa, por mais simples que seja, na resistência contra a exploração e no avanço rumo ao socialismo. Não se trata de um clube intelectual, tampouco de uma seita. É um partido que se vê nas greves, nos atos públicos, nas ocupações estudantis, nas assembleias fabris, nas ações diretas e nos protestos.

    Há um partido que ainda cultiva a moral proletária e, assim, não poupa sequer seus altos dirigentes quando se trata de assegurar, a qualquer custo, princípios como a igualdade de gênero, a independência perante o Estado e a defesa intransigente dos trabalhadores e da independência de suas organizações.

    Há um partido que pode dizer aos trabalhadores do Haiti que está ao lado de suas lutas, haja vista que, no Brasil, se opõe ao governo que os oprime militarmente. Há um partido que não se associa às oligarquias argentinas, em arroubo esquerdista, de modo a defender os que têm fome contra os lock outs do agronegócio sojeiro.

    Há um partido que se empenha, junto a outros companheiros, na construção de uma central sindical cuja recente formação não a impede de se constituir como ponto de apoio daqueles que resistem às demissões na Embraer e na Vale, e de todas e todos os que sabem que, para além das burocracias sindicais atreladas ao governo, há uma legião de pessoas sinceras em busca da autônoma construção de alternativas à grave crise econômica ora a assolar a humanidade. Há, igualmente, um partido que se engaja na reconstrução do movimento estudantil, para além do irrecuperável atrelamento da UNE à máquina governamental.

    Há um partido que respeita a democracia interna, tão esquecida em tempos de vendaval oportunista e, a um só tempo, sabe da importância de se atuar disciplinada e unitariamente contra os seus inimigos, o que também anda pouco presente em tempos de apologia do suposto pluralismo de ações que, de fato, só produz historicamente a esterilidade das práticas de resistência social. Não é o partido em que os militantes são amordaçados e, precisamente por isso, também não é o partido em que tudo vale e em que cada qual age isolada ou indisciplinadamente.

    Há, ainda, um partido socialista, revolucionário, jamais corrompido pelo stalinismo ou pela social-democracia, organizado segundo a democracia operária, autofinanciado e internacionalmente constituído com vistas à reconstrução da IV Internacional e à emancipação de todos os trabalhadores do mundo.

    Hoje me filio e inicio minha militância nesse partido, o PSTU, seção brasileira da Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT-QI). O faço com muita alegria e orgulho e, permitam-me dizer, com a convicção pessoal de que, finalmente, estou em casa, estou entre camaradas!

    Convido cada um de vocês a conhecer a atuação do PSTU, a discutir o respectivo programa e, caso assim entendam, a se somarem nesta imprescindível luta por um mundo sem dominação.

    Saudações marxistas!

    *Francisco Mata Machado, o Franck, é professor de Ciências Políticas e advogado

    Leia a carta de ruptura de Frank Mata com as Brigadas Populares (.pdf)