A era Lula terminou em clima de euforia. O governo e grande parte da mídia relançaram a propaganda do “país do futuro”, à semelhança do que a ditadura militar fazia nos anos do “milagre econômico”. Lá fora, a imprensa internacional deu seu aval a essa visão, apoiando o governo e sua política. Nem bem começa 2011, porém, as notícias começam a desfazer essa imagem tão otimista.

No Rio, as centenas de mortes causadas pelos deslizamentos de terra revelam de forma dramática a precariedade das moradias da população pobre e o total descaso dos governos. Em Brasília, o governo analisa quantos bilhões deverá cortar do orçamento para conseguir o superávit primário (economia para pagar a dívida pública). Ao mesmo tempo, anuncia um salário mínimo que sequer repõe a inflação do período, enquanto deputados dão a si mesmos um aumento abusivo.

Passadas as eleições e com a nova presidenta no Planalto, a força dos fatos insiste em mostrar o que a propaganda oficial e o relativo crescimento econômico não escondem: o Brasil é ainda um país em que a injustiça é a regra, os salários são baixos e os políticos fazem o que querem.

Mínimo para os trabalhadores
Uma das últimas medidas de Lula na Presidência foi editar um decreto estabelecendo R$ 540 (na verdade R$ 538) para o salário mínimo a partir deste ano. O reajuste de 5,8% fica abaixo até mesmo da inflação do último ano, calculada pelo IBGE em 6,4%. Ainda em discussão, o governo Dilma admite apenas “aumentar” esse valor para R$ 545.
Isso num momento em que o próprio governo exalta o crescimento do último ano, estimado em até 7,5%. Ou seja, a economia cresce, a arrecadação do governo idem, a inflação dos alimentos para os mais pobres dispara, mas só o salário mínimo não tem reajuste.

Máximo para os políticos
A lógica da falta de dinheiro, por outro lado, não se aplica aos deputados. O ano passado terminou com a aprovação absurda do novo aumento dos parlamentares, que vão receber R$ 26,7 mil, em vez de R$ 16,5 mil. Os deputados, solidários que são, estenderam o aumento para senadores, ministros e a própria Dilma, para equiparar os salários. A medida significa um aumento de quase 134% à presidenta.

Mas os altos salários são apenas um dos privilégios que os parlamentares terão. Além de R$ 30 mil mensais para manutenção do gabinete e R$ 60 mil só para a contratação dos funcionários, eles têm gastos como plano de saúde totalmente cobertos pelo dinheiro público. Ao todo, segundo estimativa da Folha de S. Paulo, cada deputado recebe R$ 128 mil por mês, em média. Já os senadores ganham R$ 146 mil cada um.

A farra dos aumentos vai impactar os cofres públicos em R$ 860 milhões só em 2011, segundo cálculos do site Congresso em Foco. O aumento em cascata para vereadores vai resultar, nos municípios, em um gasto extra de R$ 1,8 bilhão, segundo a Confederação Nacional dos Municípios. Coincidentemente, o mesmo valor que o Ministério da Integração Nacional deixou de investir nos últimos sete anos em obras de prevenção a desastres, incluindo obras contra enchentes e de contenção de encostas.

O aumento imoral foi aprovado por praticamente todos os partidos, do governo e da oposição, à exceção do PSOL. O mesmo governo que prega o ajuste fiscal e reclama da falta de recursos para o salário mínimo, nada diz sobre o aumento. O governo Dilma começa com esta marca: R$ 10 mil a mais para os deputados; R$ 30 para os trabalhadores.
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