Redação

Considerações sobre o extermínio da juventude negra


D
aqui a 23 minutos um jovem negro será assassinado no Brasil. É isso que consta no relatório da CPI do Senado sobre o assassinato de jovens apresentado em 2016. No decorrer do ano, serão mortos mais de 23 mil jovens negros, entre 15 e 29 anos, pois essa é a média anual do extermínio em nosso país. Esse número é quatro vezes maior do que a taxa entre jovens brancos e reflete um padrão: 53% das vítimas são jovens; destes, 77%, negros, e 93% do sexo masculino.

Esse genocídio não é novo. O Mapa da Violência, que analisou dados entre 2002 e 2012, caracteriza que há uma “crescente seletividade social” em relação aos assassinatos: enquanto o número de mortes entre os brancos diminuiu, passando de 19.846, em 2002, para 14.928, em 2012, as vítimas negras aumentaram de 29.656 para 41.127 no mesmo período.

Para negros e negras, sequer é possível ser jovem
Poderíamos citar milhares de dados e recortes de raça, classe, gênero, orientação sexual que só comprovariam o extermínio da juventude negra e pobre. Dados, inclusive, disponibilizados, sem nenhuma vergonha na cara, pelo próprio Ministério da Justiça dos governos do PSDB e do PT.

Isso não causa espanto para quem vive nas periferias do Brasil, onde, cotidianamente, os jovens estão sendo vitimados pela completa ausência de políticas públicas de educação, saúde, lazer, cultura e trabalho. O que nos leva à conclusão de que, no Brasil, nem todo jovem goza dos direitos e vantagens associados à juventude. A grande maioria não tem sequer o direito de ser jovem.

Algumas características do que é ser jovem foram construídas ao longo da história burguesa em torno das ideias de se ter a proteção familiar, estar incluído numa instituição educacional e, portanto, afastado do mundo do trabalho.

Para negros e negras, contudo, a história sempre foi diferente. Vivemos num país que tem uma política de extermínio da juventude negra cujas raízes estão na escravidão e há muito, principalmente desde da implementação da República, no final dos anos 1800, se apoia em teorias escravistas e capitalistas, como o discurso raciológico, que tipifica as pessoas a partir de sua raça, e eugenista, que estabelece a branquitude como padrão superior e civilizatório. 

É diante de um histórico como este que devemos nos perguntar: a maior parte dos jovens negros tem a proteção familiar sem os problemas de desagregação social que vitima essas famílias? Tem inserção e permanência nas escolas? Não tem necessidade de trabalhar? Qual é o(a) jovem negro(a), filho(a) da classe trabalhadora com o privilégio quase exclusivo de se dedicar à cultura, ao lazer e ao estudo?

O PSTU entende que a juventude filha da classe trabalhadora, presente nas fileiras do movimento estudantil e moradora dos bairros periféricos e favelas – muitos ausentes da escola, mas presentes no mercado de trabalho precarizado e em movimentos de contracultura como o hip hop e os saraus – deve estar lado a lado na defesa de outro modelo de sociedade, ou seja, na construção do socialismo como garantia de uma nova concepção de juventude para si, adquirindo consciência de classe e identidade étnico-racial.

É preciso que se rompa com o “reino da necessidade”, transformando o mundo para ter garantido o direito de ser juventude. Para que negros e negras possam realmente ter sua juventude conquistada e, assim, não morram muito antes de chegarem à vida adulta, constituírem suas próprias famílias e terem os seus direitos sociais garantidos.

SAÍDA: Um programa mínimo para a Juventude
Redução da jornada dos trabalhadores jovens para que possam conciliar trabalho e estudo.

Legalização e descriminalização das drogas, o que garantiria regulamentação, prescrição terapêutica e pesquisa científica para controle e diminuição dos malefícios sociais associados à dependência química.

Libertação da arte e da cultura dos aparatos capitalistas por meio do acesso irrestrito.

Sistema de cotas e ações afirmativas para a juventude negra nas universidades como luta inseparável do fim do vestibular e acesso irrestrito para entrar no ensino superior e, também, no mundo do trabalho.

Transparência de dados sobre segurança pública e violência dos órgãos públicos; fim dos autos de resistência (termo utilizado por policiais que alegam estar se defendendo ao matar um suspeito) e fim da Polícia Militar.

Defesa intransigente da escola pública, laica e gratuita, onde se discuta e seja eliminada a marginalização da juventude negra.

 

Por Rosenverck Estrela Santos
Graduado em História e mestre em Educação (2007) pela Universidade Federal do Maranhão, onde leciona no curso de Licenciatura Interdisciplinar em Estudos Africanos e Afrobrasileiros. Verck é autor, dentre outros, de Juventude e periferia em tempos neoliberais: cultura, revolução e hip hop e HIP HOP Brasil: história e intervenções político-culturais.