2.600 Km. Esse é o tamanho da primeira leva de privatizações de rodovias federais realizada pelo governo do PT, algo que jogou
por terra todas as mentiras de campanha

O que é mais parecido com o governo FHC? No dia 9 de outubro, Lula deu uma inestimável colaboração a esse enigma. Seu governo leiloou mais de 2.600 quilômetros de rodovias federais, dando seqüência a uma rodada de privatizações que visa colocar setores estratégicos nas mãos do capital privado.

As novas privatizações do governo petista estão previstas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado no início do ano. O Comitê Gestor do PAC projeta privatizações no valor de R$ 48 bilhões entre 2007 e 2008. Além das rodovias federais, estão na mira do governo aeroportos, ferrovias, usinas hidrelétricas, linhas de transmissão de energia e portos, num total de 66 obras de infra-estrutura.

O PAC, alardeado como a volta do Estado empreendedor em detrimento do desmonte do setor público, vai se revelando um megaprojeto privatista. “Não podemos dizer que o PAC é um projeto estatal. O PAC é demandado pelo governo e executado pela iniciativa privada. A iniciativa privada é a protagonista do PAC”, chegou a afirmar, recentemente, a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef. Um discurso bem diferente do que foi feito no lançamento do programa.

Mentiras eleitorais
Nas eleições de 2006, o então candidato à reeleição, Luís Inácio Lula da Silva, procurava uma diferenciação com seu adversário tucano, Geraldo Alckmin. Não encontrando diferença significativa em seu programa de governo, o candidato petista pôs-se a atacar as privatizações de FHC. Dito e feito. Lula subiu nas intenções de votos e abriu larga vantagem sobre Alckmin.

O que é mais parecido com um governo tucano? A resposta hoje está mais óbvia do que nunca.

Capital internacional agradece
A privatização das rodovias deu à iniciativa privada o controle de importantes estradas federais. Ao todo, foram licitados sete lotes de trechos, incluindo a Fernão Dias, que liga Belo Horizonte (MG) a São Paulo, e a Régis Bittencourt, que vai de São Paulo a Curitiba (PR). Cinco dos lotes, incluindo as duas principais rodovias, foram comprados pelo grupo espanhol OHL, que adquiriu os direitos de exploração das estradas pelos próximos 25 anos.

Com essas licitações, a OHL passa a ser a maior concessionária de rodovias em extensão, ultrapassando a CCR (Companhia de Concessões Rodoviárias) e ampliando a desnacionalização de estradas no país. Outro trecho ficou nas mãos da BRVias, dona da Gol Linhas Aéreas. O último lote ficou a cargo da também espanhola Acciona.

Governo e imprensa comemoraram a entrega das rodovias à OHL. Como o modelo de licitação premiava a empresa que oferecesse o menor valor de pedágio, foi anunciado que o preço vencedor estava muito abaixo do teto máximo estipulado pela Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT). O deságio, ou seja, a diferença de valor entre o máximo que a concessionária poderia cobrar e o oferecido pela empresa espanhola, chegou a 65% na Fernão Dias.

No entanto, nada garante que os valores não tenham sido superestimados para causar um “deságio” artificial, como ocorre com as privatizações tradicionais, ou seja, os valores mínimos são defasados para que o “ágio”, ou o lucro, seja grande. Além disso, esse discurso tenta de forma deliberada mudar o rumo do escândalo que foram as privatizações das rodovias. O ponto essencial é que mais de 2 mil quilômetros de estradas federais foram vendidos ao capital internacional. Pelo governo Lula.

Ou seja, viajar vai ficar mais caro. Só no trecho entre a capital paulista e a paranaense, a OHL vai fincar seis pontos de pedágio. Na Fernão Dias, serão oito.

O governo que privatiza melhor?
A licitação das estradas obrigou o governo Lula a adotar uma estratégia para se diferenciar do governo FHC e do governo de José Serra, em São Paulo. Agora, o governo se coloca como aquele que “privatiza melhor”, que consegue os “melhores pedágios”. “Pela primeira vez na história, os pedágios ficaram mais baratos ontem”, chegou a comemorar Lula, “esquecendo-se” do fato de que os pedágios que “ficaram mais baratos” simplesmente não existiriam caso ele não privatizasse as rodovias.

Além disso, os editais de licitação abrem brechas para aumentos nos preços. De acordo com os editais, os valores das tarifas poderão sofrer aumentos além da inflação, “sempre que ocorrências supervenientes, decorrentes de força maior, caso fortuito, fato da Administração ou de interferências imprevistas resultem, comprovadamente, em variação extraordinária nos custos da Concessionária que lhe proporcione enriquecimento ou empobrecimento injustificado”. A concessionária poderá alegar elevação de determinado gasto, justificando toda sorte de aumentos nos preços dos pedágios.

Mesmo assim, foram alardea­dos, quase em tom de espanto, os “supostos baixos preços” dos pedágios. “Como vocês conseguiram esse preço?”, chegou a perguntar de forma teatral um eufórico ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, ao presidente da OHL no Brasil, logo após a venda das estradas. Simples. Além das inúmeras praças de pedágios espalhadas pelas rodovias, a multinacional espanhola contará com financiamento público, através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), como ocorria nos anos de FHC.

O BNDES vai financiar cerca de 70% dos investimentos da OHL nos primeiros anos, mais de R$ 11 bilhões. Em outras palavras, o orçamento público vai garantir o lucro do capital privado internacional.

Onda privatizante
A nova farra das privatizações teve início no dia 3 de outubro, com a concessão da ferrovia Norte-Sul, que liga Belém (PA) a Anápolis (GO). A ferrovia começou a ser construída durante o governo Sarney. Denúncias de corrupção paralisaram as obras, que foram retomadas por Lula.

A licitação concedeu o direito de exploração sobre o trecho que parte do Maranhão e segue até Palmas, capital do Tocantins. A Vale do Rio Doce comprou a estrada de ferro por R$ 1,48 bilhão. Depois de pesados investimentos públicos realizados no decorrer de anos, o governo entrega sua exploração ao capital privado. Essa é a lógica das privatizações.

Lógica esta que estará presente nas próximas licitações de rodovias. Desta vez, na Bahia. Duas estradas, a BR-324 e BR-116 serão licitadas. Porém o prazo de concessão será de “apenas” 15 anos. “É o tempo suficiente para recuperar investimentos e ganhar dinheiro”, justificou o ministro dos Transportes.