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Márcio Magalhães

Marcamos para amanhã com o MP uma reunião para discutirmos possíveis medidas que possam ser adotadas para as pessoas que não ficam em casa” (Governador Wilson Witzel ao O Globo, em 4 de maio de 2020)

Não podermos relaxar” (Prefeito Marcelo Crivella ao G1 Rio, em 29 de abril de 2020).

Uma rápida leitura acima, nas declarações de Witzel e de Crivella, leva-nos à impressão de que os governos passaram a se preocupar com o bem-estar da classe trabalhadora, pelo menos nesses dias de pandemia.

Não nos deixemos enganar pelas aparências. No capitalismo, sistema sócio-econômico baseado na exploração de uma classe social (burguesia) sobre outra (trabalhadoras/res), os fenômenos sociais não se apresentam como, de fato, são. Porém, a COVID-19 retira o véu que encobre o capitalismo e nos revela a incapacidade deste sistema em garantir a vida das trabalhadoras e dos trabalhadores, no Brasil e no mundo.

As declarações nada valem se não forem devidamente acompanhadas por ações que garantam as condições necessárias para que trabalhadoras e trabalhadores, cariocas e fluminenses, possam, efetivamente, cumprir o isolamento social.

A dura realidade imposta pelo capitalismo nos dá a dimensão dos inúmeros obstáculos que a classe trabalhadora enfrenta para evitar o contágio.

No complexo da Maré, conjunto de favelas na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, essa dura realidade adquire contornos dramáticos. É o caso de “X”, recentemente demitida da empresa de telemarketing em que trabalhava há pouco mais de seis meses. Sua demissão, lamentavelmente, comprova a farsa da MP 636. Editada pelo governo Bolsonaro – Guedes, sob o argumento de preservar os empregos, mediante a redução da jornada de trabalho e do salário, durante a pandemia –  a MP não resiste, nem ao novo coronavírus  nem, tampouco, à busca incessante dos patrões pelo lucro.

Desempregada, X não possui nenhuma proteção social. Apesar de seu filho, matriculado na rede municipal, a trabalhadora carioca não tem o direito nem mesmo ao auxílio “Cesta Básica”, no valor de R$ 100,00. Concedido por Crivella, o auxílio se mostra insuficiente, pois, de acordo com o DIEESE, R$544,34 foi o valor da cesta básica no estado do Rio de Janeiro, no mês de abril.

Na mesma trágica condição, se encontra “Z”, moradora, também, da Maré e trabalhadora autônoma. Impossibilitada de desenvolver a sua atividade profissional, nesses dias de pandemia, perdeu sua fonte renda para garantir a sua vida e a de seus filhos. Sobrevive, no momento, da boa vontade solidária de amigos e do apoio limitado de seu pai, um ambulante.

Em Nilópolis, região metropolitana do Rio, “Y”, 38 anos, empregada doméstica desempregada e aluna da Educação para Jovens e Adultos (EJA), segue dependendo da solidariedade alheia, pois, também, se encontra excluída da insuficiente rede de proteção social existente para o conjunto da classe neste país.

Os casos apresentados, com certeza, se multiplicam por todo o estado, demonstrando que a pandemia não apenas atinge a classe trabalhadora de forma avassaladora, assim como, em seu interior, tem um impacto ainda maior sobre as mulheres.

Como se não bastassem os obstáculos impostos pelo sistema capitalista e os ataques dos governos, a classe trabalhadora assiste atônita e incrédula à pressão exercida por setores da burguesia e, até mesmo da pequena burguesia, no sentido de flexibilizar o isolamento social.

Tal qual a agulha e a linha tecem a trama, a forma e o conteúdo das carreatas contra a quarentena realizadas por empresários, devidamente protegidos em seus confortáveis automóveis importados e de luxo, na Zona Sul da cidade, revelam tanto o seu desprezo pela vida da classe trabalhadora, quanto denunciam o seu único objetivo – garantir a produção e a realização do lucro. Para os patrões, o lucro estará, sempre, acima da vida das trabalhadoras e dos trabalhadores.

Os dados sobre o avanço da pandemia no país não deixam margem para dúvidas acerca da ameaça que paira sobre a classe trabalhadora no estado. Segundo o sítio eletrônico do UOL Notícias, em 8 de maio, o estado do Rio de Janeiro apresenta a maior taxa de mortalidade. Hoje, já são mais de 2.000 mortes por conta da COVID-19.

Na Zona Sul da cidade do Rio, a taxa de mortalidade estava em torno de, aproximadamente, 4%, já na Zona Oeste, região popular, a taxa gravitava em torno dos 20%, conforme divulgado pela imprensa burguesa há duas semanas.

De acordo essas taxas, é preciso destacar que se o vírus atinge a todas e a todos indiscriminadamente, o seu impacto é inversamente proporcional à renda. Nesse sentido, as consequências são muito mais nefastas entre as trabalhadoras e os trabalhadores, pois, sem condições de permanecerem em suas casas, ficam muito mais expostos à COVID-19. Infectada, a classe trabalhadora conta apenas com o SUS sucateado, apesar da heroica atuação das trabalhadoras e dos trabalhadores nas unidades de saúde (hospitais, postos de saúde, clínicas etc.), na capital e no estado.

Diante do crescimento exponencial das mortes e do contágio da COVID-19, pouco efeito surtirá os apelos na imprensa burguesa para que todos fiquem em casa. Os indivíduos são movidos pelas suas necessidades. Portanto, para que a classe trabalhadora, no estado do Rio de Janeiro, possa permanecer em suas casas é preciso, sobretudo, dar-lhe condições.

Trabalhadores autônomos e ambulantes se revoltam com o funcionamento normal das Lojas Americanas, em Madureira

Os recursos para garantir o isolamento social de trabalhadoras e de trabalhadores existem. É preciso exigir de Witzel e de Crivella a suspensão, imediata, do pagamento da dívida pública. Com a suspensão, interrompemos a criminosa transferência de recursos públicos para o sistema financeiro, o parasita que a classe trabalhadora de conjunto necessita “erradicar”.

Mas, para além da suspensão no pagamento da dívida pública, é preciso exigir, igualmente, dos governos e dos patrões, outras medidas que garantam o cumprimento da quarentena.

No nosso estado, por exemplo, sendo a CEDAE uma empresa pública e estadual, o governo Witzel pode e deve suspender a cobrança da taxa de tratamento e de distribuição da água. Essa medida, sem dúvida, atenuará os efeitos deletérios da pandemia sobre a classe trabalhadora fluminense. Sobretudo, entre os mais pobres, logo, os mais vulneráveis socialmente.

Para isso, o PSTU apresenta à classe trabalhadora carioca e fluminense o programa necessário ao combate às duas catástrofes em curso, a sanitária e a social:

– Não às demissões e à redução salarial;

– Suspensão do funcionamento das atividades econômicas consideradas não essenciais;

– Suspensão da cobrança das taxas de luz, água e dos aluguéis,

– Redução no preço do gás de cozinha;

– Distribuição gratuita de máscaras e de álcool em gel;

-Abastecimento imediato de água potável;

– Realização gratuita e em massa de testes para detectar o vírus;

– Auxílio emergencial no valor de, no mínimo, 2,5 salários mínimos.