Nessa semana a OEA (Organização dos Estados Americanos) condenou o Brasil por não ter investigado os crimes cometidos por militares durante a Guerrilha do Araguaia. A decisão foi tomada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e determinou a punição dos torturadores e assassinos que agiram contra os guerrilheiros.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, reagiu a sentença e tratou rapidamente de acalmar os ânimos dentro das Forças Armadas. “O processo de transição no Brasil é pacífico, com histórico de superação de regimes, não de conflito” , disse o ministro que ainda lembrou não existir possibilidade de punir os agentes que praticaram tortura, pois o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu contra a revisão da Lei de Anistia.

A decisão da OEA nos faz lembrar que, ao longo de oito anos de governo Lula, não só os militares responsáveis pelos crimes mais bárbaros da ditadura permaneceram impunes, como a maioria dos arquivos sobre o período ainda se encontram inacessíveis.

Em todos esses anos, qualquer menção sobre a possibilidade de abrir os arquivos da ditadura ou punir torturadores foi motivo de inúmeras crises no governo. A última e mais importante ocorreu durante a polêmica sobre o 3° Programa Nacional de Direitos Humanos, no inicio de 2010. O ponto mais importante do programa previa a criação de uma comissão da verdade para apurar os crimes da “repressão política” da ditadura militar. Foi o que bastou para desatar a fúria da direita e da mídia, que acusaram a medida de fomentar o “revanchismo”. A gritaria reacionária fez com que o governo Lula recuasse quase que imediatamente.

O regime militar brasileiro levou a cabo violações sistemáticas dos direitos humanos, desde execuções extrajudiciais, tortura, prisões arbitrárias e restrições à liberdade de expressão. Centenas de pessoas desapareceram. Gente como Honestino Guimarães (último presidente da UNE eleito no final dos anos 1960) ou o ex-deputado Rubens Paiva que foram aprisionados e sumiram. Até hoje ninguém sabe o destino dos desaparecidos, onde estão enterrados, quem os matou e por quê.

Durante a cerimônia de balanço dos oito anos de seu governo, no ultimo dia 15, o presidente Lula mencionou mais uma vez a divulgação dos arquivos diplomáticos dos Estados Unidos pelo WikiLeaks e disse que o site não teria trabalho em divulgar arquivos de seu governo: “O WikiLeaks não vai precisar entrar clandestinamente. Vai ter tudo que precisar. Não vai ter vazamento porque vamos vazar antes” , disse.

Não senhor presidente. Seu governo esteve longe de ser transparente. A não divulgação dos arquivos da ditadura militar é a comprovação mais vergonhosa de que o PT foi incapaz de trazer a luz toda verdade sobre o regime militar. Depois de oito anos, o Brasil é ainda um dos poucos países no continente a não investigar os crimes da ditadura. Outros que amargaram o regime dos militares produziram avanços na investigação dos crimes e punição dos culpados. Como foi, por exemplo, o caso da Argentina que desclassificou como secretos os documentos relacionados com as forças armadas do período da ditadura. Muitos militares argentinos já foram julgados após a criação das comissões da verdade.

O governo Lula termina sob o silêncio vergonhoso perante os crimes dos militares. Dilma, que sofreu o diabo nas mãos dos militares vai seguir pelo mesmo caminho. Como esperança só nos resta que a inspiradora coragem dos diretores do WikiLeaks sirva de exemplo para que estes crimes possam vir a tona algum dia em nosso país.