MARIUCHA FONTANA,
da Redação

Tudo indica – salvo uma hecatombe imprevisível – que Lula sairá vitorioso do 2º turno das eleições. No Brasil, este será um fato histórico e inédito. Nunca, em nosso país, houve um governo dessa natureza. Um governo chefiado por partidos operários, que governam em colaboração ou unidade com a burguesia. Isto, entretanto, já ocorreu inúmeras vezes na história em diversos países.
Tais governos de colaboração de classes, chamados de governos de Frente Popular, sempre que não foram superados por uma alternativa revolucionária de massas levaram a derrotas graves, senão históricas do movimento de massas.
Atados à burguesia, esses governos se propõem a gerir o capitalismo (sempre em épocas de crise) e o Estado burguês. São, portanto, governos burgueses. Ao mesmo tempo, são governos burgueses anormais, pois o normal é que a classe dominante governe seu Estado, ou seja, que seja um representante direto seu a gerir seus negócios.

SE ABRIRÁ UMA NOVA ETAPA DA LUTA DE CLASSES NO BRASIL
Governos deste tipo sempre são produto ou inauguram uma nova etapa na luta de classes, pois surgem fruto de uma vitória distorcida das massas. Alguns ascendem eleitoralmente e previamente a grandes lutas, outros são produto direto de um ascenso revolucionário.
São anormais porque a maioria da burguesia tende a vê-los como inimigos, adversários ou com desconfianças. Já as massas tendem a vê-los como o seu governo e têm neles grandes ilusões.
Os governos de Frente Popular, porém, não possuem qualquer incompatibilidade com o capitalismo. Pelo contrário, têm como objetivo a busca da desmobilização, desmoralização e derrota do movimento operário.
Existiram governos deste tipo que não apenas se formaram num tremendo ascenso das massas, como conviveram com um poder popular (ou duplo poder, esse sim incompatível com o capitalismo). Foi o caso do governo de Kerensky na Rússia de 1917 , onde existiam os sovietes, ou o de Allende no Chile, que conviveu com os cordões industriais.
Outros ascenderam previamente a grandes lutas e conseguiram evitar que se generalizassem, derrotando-as uma a uma. Foi o caso de Mitterrand na França.
Na Rússia de 1917, os bolcheviques, chefiados por Lenin e Trotsky ganharam a maioria das massas contra tal governo e fizeram a revolução: derrotaram o governo de colaboração de classes conformado pelos Mencheviques, Socialistas Revolucionários em aliança com a burguesia liberal. No Chile, Allende jamais rompeu com a burguesia e seu Estado – ao ponto de nomear Pinochet para ministro do Exército – e a revolução chilena acabou num golpe militar sangrento. Na França, Mitterrand foi desmobilizando e derrotando as massas por pontos e chefiou o início da implementação de todo receituário neoliberal no país.

O GOVERNO LULA SERÁ UMA FRENTE POPULAR ATÍPICA
Os governos de colaboração de classes clássicos, entretanto, sempre governaram com a “sombra” da burguesia. Os setores fundamentais da classe dominante não estavam na Frente e nem no governo e os tratavam com hostilidade.
Nos países semicoloniais ou coloniais, por sua vez, tais governos eram anti-imperialistas ou se chocavam com o imperialismo. Isto respondia também ao fato de que os mesmos se aliavam a setores nacionalistas da burguesia.
Allende, no Chile, por exemplo, nacionalizou as minas de cobre – principal produto do país – que se encontravam nas mãos de multinacionais.
O governo de Lula, por suas alianças e programa, será um governo de Frente Popular atípico. Pois Lula não terá no governo apenas a “sombra” da burguesia, mas parcelas fundamentais da mesma. A julgar, inclusive, por seus acordos e declarações recentes, seu governo poderá ser um governo de Frente Popular com traços de unidade nacional, ou seja, do qual os principais setores burgueses participam e com ele colaboram.
Será atípico também porque – ao contrário de Allende – não será anti-imperialista, mas pró-imperialista. Será um governo de Frente Popular que (num país que vive um processo de recolonização) nasce se submetendo ao FMI, aceitando as negociações da Alca e sendo aceito (embora não seja o preferido) pelo imperialismo. Um governo Lula, portanto, será muito diferente de Allende. Se assemelhará muito mais a Lagos – ou ao próprio De La Rua – num momento em que a América Latina se convulsiona

CONSTRUIR UM ALTERNATIVA REVOLUCIONÁRIA DE MASSAS
O governo Lula gerará enormes expectativas, esperanças e ilusões nas massas. As massas têm expectativas de emprego, de melhores salários, de concessões de toda ordem. Têm ilusão, entretanto, que Lula atenderá estas e outras reivindicações, quando Lula estará atado à burguesia brasileira colonizada e, por esta via, ao imperialismo. Estará no governo, portanto, gerindo o capitalismo, ou mais precisamente, os negócios da burguesia e implementando os planos do imperialismo, que reclama não apenas pela manutenção da exploração e sofrimento já hoje existentes, mas por maiores ataques ao movimento de massas.
As expectativas das massas podem levá-las à mobilização. Já as ilusões podem levá-las à trégua, à paralisia, à desorganização e à derrota.
O papel dos revolucionários é apoiar-se nas expectativas para combater as ilusões no governo e desenvolver as mobilizações. Pois, se este governo pode derrotar o movimento de massas, é também sob governos assim que se torna possível construir uma alternativa revolucionária de massas.
Mas, para isso, os revolucionários precisam ter firmeza – como tiveram Lenin e Trotsky – , uma estratégia revolucionária e não depositar eles mesmos ilusões nesse governo. Pois, via de regra, a esquerda revolucionária capitula e se propõe a ser um apêndice ou ala esquerda de governos dessa natureza, alentando a ilusão de que seria possível empurrá-lo para a esquerda, ou mudar sua natureza e caráter, levando-o a ser um governo “burguês anti-burguês”.
A sorte da revolução brasileira depende da capacidade que tenha o movimento operário e a esquerda revolucionária de construírem uma alternativa revolucionária de massas ao PT.
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