Ajuste fiscal, arrocho, reforma trabalhista e previdenciária. As verdadeiras medidas que marcarão o futuro governo passaram ao largo do debate que polarizou eleitoralmente o segundo turno. As equipes econômicas de Lula e Alckmin estudam medidas para assegurar a continuidade da política neoliberal e, mais que isso, colocar em prática o que está sendo chamado de um “novo ciclo de reformas”.

Após a abertura generalizada da economia, impulsionada na era Collor, a privatização levada a cabo pelos dois mandatos de FHC e a reforma da Previdência realizada por Lula, a nova onda de reformas pretende atacar os direitos trabalhistas e lapidar ainda mais a previdência. O objetivo seria conferir maior “eficiência” à economia, ou seja, aumentar a exploração dos trabalhadores e a transferência de recursos para os juros da dívida a fim de elevar os lucros dos investidores estrangeiros.

Tal necessidade ganhou certo destaque no dia 16 de outubro, quando foi divulgado o relatório da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad). O estudo mostra que o Brasil perdeu quatro posições no ranking dos países que mais receberam investimentos estrangeiros, caindo do 14º para 10º em 2005. Além do real valorizado, o principal motivo apontado para a queda dos investimentos seria o suposto “alto custo do capital”, ou seja, elevada carga tributária e principalmente os direitos trabalhistas que encareceriam as contratações.

Já está no papel
Longe dos holofotes, a equipe do governo já está adiantada na preparação das novas reformas. Artigo divulgado em setembro pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão subordinado ao Ministério da Fazenda, traça a agenda econômica para 2007. Assinado pelos economistas Fabio Giambagi e Paulo Mansur Levy, o artigo defende um conjunto de reformas para garantir um crescimento econômico da ordem de 4,5% a 5% a partir de 2011.

Para isso, seria necessário um forte ajuste e elevação do superávit primário (economia que o governo faz para pagar os juros da dívida). O prêmio tão almejado para o esforço é a promoção do Brasil ao grau de “investment grade”, ou seja, o status de país modelo para os investidores conferido pelas agências internacionais de risco. Entre as metas para os próximos anos segundo o artigo estaria a “redução substancial da dívida líquida do setor público na próxima década, mediante uma política de superávits primários que conservem durante vários anos as contas fiscais superavitárias mesmo após o pagamento de juros”.

No entanto, não é apenas um longo e brutal arrocho que os economistas do governo planejam. Para eles, o principal problema das contas públicas não é o gigantesco montante destinado ao pagamento dos juros da dívida, mas a Previdência social. Para resolver tal “problema”, a solução dada pelos técnicos passa textualmente pela “desvinculação entre piso previdenciário e o salário mínimo”.

Num dos trechos mais escandalosos, os economistas defendem a “explicitação na Constituição de que todas as aposentadorias – incluindo o piso – serão corrigidas por um índice de preços a ser definido em lei (…) igualando o Brasil à grande maioria dos países do mundo, onde a remuneração dos aposentados, na melhor das hipóteses, acompanha a inflação, porém sem aumentos reais”.

Além disso, o documento defende a prorrogação e ampliação do mecanismo da DRU (Desvinculação das Receitas da União), criado pelo governo FHC. A DRU possibilita atualmente que o governo desvie 20% das verbas do orçamento destinado à saúde e educação, por exemplo, para pagar juros da dívida. Para os economistas do Ipea, a DRU deveria ser de 35%. O próprio Lula defendeu a mudança no jornal Folha de S. Paulo do dia 23 de outubro. “Isto pode ser discutido dentro de um programa de melhora da qualidade do gasto primário”, afirmou. A medida é orientada pelo FMI, dentro do plano de flexibilizar gastos com saúde e educação, isto é, eliminar da Constituição a obrigação de gastar determinada porcentagem fixa do orçamento com esses setores.

O modelo de gestão econômica apontada como ideal seria o praticado por países como Chile, Índia e, em última instância, a própria China, ou seja, países cujos trabalhadores não gozam da mínima proteção trabalhista. Isso mostra que, dentro desse modelo econômico empunhado tanto pelo PT quanto o PSDB, a aplicação das reformas neoliberais torna-se inevitável.

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