A constituição, há dez anos, dos Comitês Sindicais de Empresa (CSE) no ABC paulista foi uma resposta organizativa e política consciente da direção do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC para eliminar e substituir as Comissões de Fábrica (CF). A medida também deu espaço à parceria e à conciliação com a patronal e o governo em detrimento da luta direta dos trabalhadores por melhores salários, condições de trabalho e contra a flexibilização dos direitos e conquistas da categoria.

Ao avançar a colaboração de classes com os patrões, o papel das CF, principalmente nas montadoras, inviabilizava vários acordos diretos com a patronal. A comissão, além de deter um peso político e histórico muito grande na consolidação da representação direta dos trabalhadores, detinha uma autonomia política e organizativa no chão de fábrica. Não havia, necessariamente, anuência ou organicidade com a direção do sindicato nas decisões das lutas dentro das fábricas, pois representava, diretamente, todos os trabalhadores da base nas empresas e congregava as diversas opiniões e divergências, de trabalhadores sindicalizados ou não.

A conquista histórica das CFs se deu no calor das lutas dos anos 1970-80. Várias garantias foram conquistadas, como estabilidade, tempo livre, direito à negociação direta com as empresas tanto na contratação quanto na manutenção dos trabalhadores e postos de trabalho. Ou seja, a mediação dos conflitos passava, de forma autônoma, necessariamente pela CF, em consenso ou não com a direção do sindicato. Cabia à base dirimir qualquer divergência nos encaminhamentos e desfechos das negociações. Era a democracia operária a mediadora direta das deliberações da base da categoria nas fábricas, garantindo ampla e irrestrita liberdade e autonomia sindical aos trabalhadores.

Hoje, a sua substituição pelos CSEs tem claro apelo burocrático e de controle, tanto do processo eleitoral do sindicato quanto da organização dos trabalhadores e suas demandas no chão de fábrica. Esses comitês visam harmonizar a relação capital-trabalho para domesticar esse organismo de representação direta dos trabalhadores, retirando sua autonomia política e organizativa. Além disso, cria distorções representativas, já que na eleição dos tais CSEs só votam os sindicalizados, consequentemente os representados legais dessa instância sindical.

Tendo em consideração o baixo nível de sindicalização dos trabalhadores no Brasil – que gira em torno de 30% no geral e 42% nos metalúrgicos do ABC, que é uma das categorias mais organizadas -, uma análise leva a questionar vários aspectos: qual a representatividade efetiva dos CSEs no conjunto da base e que regulamentação existe para os membros dos CSEs (estabilidade, tempo livre, etc.)? A liberdade e autonomia sindical no chão das fábricas deu espaço ao atrelamento estrutural dos organismos da classe à conciliação com os patrões e os governos, através dos fóruns tripartites que serão criados para flexibilizar os direitos da classe.

A comparação dos CSEs com a estrutura e autonomia das CFs se faz necessária, pois os avanços da organização e das conquistas dos metalúrgicos no ABC está intimamente ligado ao grau de resistência possível por intermédio das CFs, contrariando, muitas vezes, as orientações da própria direção do sindicato. A Batalha de Piraporinha, em 1989, é um exemplo histórico e claro dessa autonomia. No próximo período, pode haver um retrocesso e manchar de maneira irreparável toda a luta e resistência de centenas de companheiros que doaram parte, ou mesmo a sua vida, à causa dos trabalhadores por uma sociedade justa e sem exploração, onde seus filhos e netos possam avançar rumo a uma sociedade socialista, a partir desse acúmulo histórico da classe.