No dia 8 de abril, após 33 dias de muita luta, terminou a greve dos professores paulistas. Neste mais de um mês, os professores, de forma corajosa e heroica, enfrentaram a truculência do governo de São Paulo, realizando quatro manifestações na avenida Paulista, centro financeiro da capital, três passeatas até a praça da República, onde fica a sede da Secretaria Estadual de Educação, e uma manifestação no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo. O governo do agora presidenciável José Serra (PSDB), através do Ministério Público, entrou com ação judicial tentando impedir assembleias na Avenida Paulista, com ameaça de multa no valor de R$ 350 mil.

Como os professores não se intimidaram diante destes ataques, no dia 26 de março, o governo Serra patrocinou uma agressão nunca vista contra os professores. Foram centenas de feridos, alguns gravemente, pelas bombas e balas de borracha da Força Tática (batalhão policial especializado em repressão a criminosos), com cenas dignas dos tempos de exceção, com policiais à paisana, infiltrados na manifestação e provocando tumultos, inclusive ateando fogo num automóvel, ação que foi reconhecida pelo comando da PM após divulgação de foto de um P2 pelo jornal O Estado de São Paulo, além de utilizarem o helicóptero da PM para jogar bombas sobre os professores.

Apesar dessa atrocidade cometida por Serra, os professores novamente não se intimidaram e tomaram novamente a Avenida Paulista no dia 31 de março. Desta vez, Serra, talvez em homenagem aos 46 anos do golpe militar, enviou a PM que apreendeu o caminhão de som, para tentar inviabilizar a assembleia. Mais uma vez, numa demonstração de coragem, os professores seguiram em passeata silenciosa até a Praça da República e realizaram a assembleia da categoria.

Professores enfrentaram a truculência de Serra e Paulo Renato
A educação paulista, que até a década de 1990 estava entre as sete melhores redes de ensino do país, chegou ao século 21 entre as sete piores redes de ensino. Essa situação é reflexo de uma política educacional de sucessivos governos do PSDB. Eles fizeram com que os salários dos professores paulistas caíssem do 10º para o 14º no ranking nacional, segundo o jornal Folha de São Paulo (1/4/2010).

Para se ter uma ideia, as salas de aula tinham limite máximo de 35 alunos. Portanto, se uma escola tivesse 54 alunos matriculados no 1º colegial, se constituiriam duas salas com 27 alunos cada. Hoje se constitui uma única sala com os 54 alunos. Os professores recebiam um piso salarial referente a dez salários mínimos (cerca de R$ 5.100). Hoje, o piso por 40 horas do professor do ciclo I é de R$ 1.309,17, sendo que a maioria desses professores tem jornada de 30 horas (R$ 981,88) ou de 24 horas (R$ 785,50). Vários professores estão cumprindo jornada de 12 horas (R$ 392,75).

No caso dos professores de ensino fundamental II e ensino médio, o piso por 40 horas é de R$ 1.515,53. Para 30 horas, é de R$ 1.136,65; 24 horas, de R$ 909,32; e por 12 horas, de R$ 454,66. Ou seja, houve uma redução de mais de 200% nos salários dos professores nesses últimos 20 anos, tendo como referência o mínimo. Além da superlotação das salas de aula e do arrocho salarial, se instituiu a chamada progressão continuada, que nada mais é do que uma promoção automática, pois o único critério para aprovação é a frequência escolar e não o aprendizado.

Essa situação, combinada com a falta de perspectiva profissional para a juventude brasileira, torna a escola pública um barril de pólvora, por isso a crescente onda de violência que passou a atingir o ambiente escolar. Diante dessa deterioração das condições de trabalho e de salários, os professores chegam a cumprir jornadas de até 64 horas semanais em sala de aula (permitido por lei), tornando a profissão um fardo.

Com essa significativa piora da escola pública paulista, motivada por estas políticas dos sucessivos governos e diante da impossibilidade de esconder o drama social nas escolas públicas, o governo Serra, tentando se isentar de sua responsabilidade, iniciou uma campanha para culpar os professores por essa crise. Faz uma propaganda enganosa nos meios de comunicação, afirmando que existem dois professores por sala de aula, que as escolas estão equipadas com computador e internet, inclusive aos fins de semana para a comunidade, que professores receberam até R$ 15 mil de bônus e que com a promoção da carreira os professores podem receber até R$ 6.270 de salário.

É tudo mentira! Justamente por isso que os professores foram à greve. Não existem computadores à disposição da comunidade e sequer dos alunos na grande maioria das escolas estaduais. Não existem os dois professores por sala, e dos mais de 220 mil professores, mais de 176 mil professores não terão nenhuma reposição salarial e os que terão receberão 25% de reposição sobre o salário base, além de terem de ficar mais três anos no mínimo sem nenhum reajuste. Se fosse pouco, nas medidas combatidas pela greve está a lei 1093/09, que institui um novo contrato de trabalho aos novos professores, que estabelece: contrato de no máximo um ano letivo (fevereiro até dezembro), não garantindo a estes profissionais receberem as férias, além de impor que os professores que tenham esse contrato, ao final do ano letivo terão de ficar 200 dias sem trabalhar no serviço público. Ou seja, o professor trabalha ano sim e ano não. Essa aberração contratual se deve, por um lado, à total falta de compromisso do governo com a educação e serve para reduzir gastos do governo. Alguém acredita em melhora da escola pública com a precarização do trabalho?

Apesar da forte greve dos professores, não conseguimos derrotar esse projeto nefasto à escola pública, pois a intransigência do governo se materializou até agora em ZERO de reajuste salarial e manutenção dos projetos que atacam ainda mais as condições de trabalho, retiram a garantia do emprego, além de não trazer nenhuma melhora para a qualidade do ensino, punindo os estudantes, maiores vítimas deste processo.

Porém a disposição de luta do professorado paulista demonstra que apesar de não vencermos esta batalha, a guerra em defesa da escola pública, gratuita, de qualidade, a luta pela garantia do emprego, do salário e das condições de trabalho vão continuar.

Lula toma medidas que ajudam Serra
No dia 19 de março, enquanto mais de 60 mil professores ocuparam a Avenida Paulista, Lula publicou no Diário Oficial da União o decreto Nº 7.133, que “regulamenta os critérios e procedimentos gerais a serem observados para a realização das avaliações de desempenho individual e institucional e o pagamento das gratificações de desempenho” dos servidores federais. Essa atitude de Lula reafirma sua política favorável à avaliação desempenho, que é justamente a mesma política de Serra em relação à política de valorização por mérito (prova para se ter reposição salarial).

Lula faz com os servidores federais o mesmo que Serra faz aos professores estaduais. Essa política de Lula/Haddad já estava expressa no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que é o decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2007, que no seu inciso XIII diz ser necessário “implantar plano de carreira, cargos e salários para os profissionais da educação, privilegiando o mérito, a formação e a avaliação desempenho”.

Essa política educacional, federal e estadual, parte da mesma premissa que é responsabilizar os professores pela crise educacional, deixa evidente que a disputa entre PT e PSDB é uma disputa pelo controle do governo federal, mas o projeto de ambos é igual. Dilma ou Serra representam a continuidade da precarização das relações de trabalho e a continuidade de uma política educacional excludente.

É muito importante compreender que as dez metas de Serra, Goldman e Paulo Renato em São Paulo partem da mesma base legal do PDE de Lula e do ministro da Educação Fernando Haddad. Portanto, para derrotar a política educacional de Serra é necessário derrotar a política educacional de Lula.

O Papel da direção da APEOESP (ArtSind-CUT)
Apesar de toda disposição de luta demonstrada pelos professores, nossa luta esbarrou nos limites estabelecidos pela direção majoritária do sindicato. A corrente que dirige a Apeoesp (ArtSind e ARTNova-CUT e o CTB) por serem defensores do governo Lula, priorizaram durante toda greve os discursos de desgaste de Serra. Queremos deixar claro que somos radicalmente favoráveis a desgastar e denunciar esse governo truculento de Serra, porém também queremos uma luta que conquiste as reivindicações dos professores.

Reafirmamos isto porque o fato de apoiarem o governo Lula e a candidatura Dilma, faz com que não possam ser coerentes no combate a política de avaliação desempenho de Serra (provas), justamente por ser esta a posição do governo Lula. Uma direção coerente tem de dizer aos professores que temos a tarefa de derrotar Serra e sua política educacional e, que para isso, nossa luta também é contra o PDE de Lula/Haddad. Essa política limitada da direção majoritária da Apeoesp foi expressa no meio de nossa greve, quando a direção majoritária vai à imprensa e protocola documento junto a SEE sinalizando que um reajuste salarial seria suficiente para por fim a nossa greve. Esse rebaixamento da pauta de reivindicação demonstra as limitações de uma direção governista (ligada ao Lula), que para defender seu governo, tenta abrir mão da pauta da categoria.

Por pressão dos professores e por decisão de assembléia estadual os professores reafirmaram nossa pauta completa, impondo uma derrota à direção majoritária que tentou o tempo todo limitar nossa greve ao salário, que é parte importante de nossa pauta, porém tão importante quanto à luta contra as provas e a avaliação desempenho e o reajuste por mérito, política que unifica Serra e Dilma.

Nossas Tarefas
Diante disso, nós professores temos que manter nossa organização por escola, reafirmar nossa luta por salário, emprego e condições de trabalho e preparar os novos embates que teremos em defesa da escola pública, gratuita e de qualidade para todos.

Temos que fortalecer a Oposição Alternativa/Conlutas, que durante toda greve foi o único setor que denunciou que a política educacional de Serra e de Lula são iguais e que a direção majoritária da Apeoesp tem limites para conduzir nossa luta, justamente por ser correia de transmissão da política do governo federal.

Nos dias 3 e 4 de junho, em Santos (SP), ocorrerá o II Congresso da Conlutas, e nos dias 5 e 6 de junho, será o Congresso da Classe Trabalhadora (Conclat), congresso que unificará a Conlutas e Intersindical. A nova central que será construída tem importância estratégica para todos os trabalhadores e também para os professores, pois representa uma alternativa de esquerda à CUT governista, que pode unificar as lutas dos trabalhadores, dos movimentos sociais e da juventude, na defesa de uma sociedade justa e igualitária, uma sociedade socialista.

*João Zafalão é secretário de Política Sindical da Apeoesp, membro da Oposição Alternativa – Conlutas e militante do PSTU