05/10/2017- Rio de Janeiro - A Polícia Federal prende o presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Carlos Arthur Nuzman, investigado por envolvimento num suposto esquema de compra de votos no Comitê Olímpico Internacional (COI) para a escolha dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Na foto o presidente do COB, Carlos Arthur Nuzman. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Carlos Arthur Nuzman não é um caso isolado num mundo em que o esporte serve de engrenagem à corrupção e aos lucros das grandes empresas

A prisão do presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e do Comitê Rio 2016, Carlos Arthur Nuzman, e de seu braço direito Leonardo Gryner, no último dia 5, expôs mais uma vez o submundo do esporte no Brasil e no mundo. Nuzman é suspeito de comprar votos na escolha da cidade para abrigar os Jogos de 2016.

A chamada “Operação Unfair Play”, desdobramento da Lava Jato, achou evidências, junto às autoridades francesas, de que o COB comprou os votos na eleição para a cidade-sede das Olímpiadas que deu vitória ao Rio de Janeiro. Entre essas evidências estão trocas de mensagens entre Nuzman e o filho do senegalês Lamine Diack, ex-presidente do IAAF (Associação Internacional das Federações de Atletismo) e membro do COI (Comitê Olímpico Internacional). Nas mensagens, Lamine cobra 2 milhões de dólares que seriam parte desse acordo, que certamente envolveu muito mais que isso. O presidente do COB funcionaria como um intermediário entre o governo Cabral e o COI.

O Ministério Público Federal resolveu pedir a prisão de Nuzman após ele ter feito uma retificação em sua declaração do imposto de renda, já depois da deflagração da operação da Polícia Federal. De repente, o presidente do COB declarou nada menos que 16 barras de ouro de 1kg num cofre da Suíça. Vendo que o cerco apertava, o cartola tentava dar uma cara de legalidade aos milhões que recebeu por conta dessas negociatas.

Esse ouro todo é apenas uma mostra do que Nuzman ganhou à frente do COB. O MPF avalia que o cartola aumentou seu patrimônio em 457% nos últimos dez anos. Ex-jogador e presidente da Confederação Brasileira de Vôlei, Nuzman estava há 22 anos no COB, o que dá para se ter uma ideia do que ganhou durante todo esse tempo. Enquanto isso, o Ministério dos Esportes teve um corte de 87% de seu orçamento para 2018.

Peça de uma engrenagem corrupta
Longe de ser um caso isolado, ou mais um corrupto se beneficiando de sua posição para se enriquecer, o caso de Nuzman demonstra como o esporte é utilizado como parte de uma engrenagem corrupta, com o objetivo de enriquecer grandes políticos e empresários. Nuzman reunia a grana com o governo Cabral e seus parceiros, intermediava as negociações para a compra de votos no COI, e trazia os jogos para o Brasil.

As empreiteiras superfaturavam as grandes obras, o governo levava propina e Nuzman tinha garantido sua parte no botim. Nessa toada, todos ganhavam. Menos a população e os atletas realmente envolvidos, grande parte obrigada a enfrentar uma situação de extrema precariedade e tudo o que envolveu os grandes jogos no Brasil.

Ex-presidente da FIFA, João Havelange

Nuzman repete, assim, a história de tantos outros grandes cartolas envolvidos em corrupção, como o ex-presidente da FIFA João Havelange, morto em 2014. Em seus últimos anos, Havelange enfrentou várias denúncias de corrupção, incluindo sua própria eleição para o cargo da Federação Internacional de Futebol, armada num esquema fraudulento com a Adidas. Ou o ex-presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), Ricardo Teixeira, envolvido no caso CBF-Nike, assim como seu sucessor, José Maria Marin.

Esses são os casos mais estridentes de algo que se reproduz nas entidades internacionais, nas federações e confederações espalhadas país afora, inclusive nos grandes clubes de futebol. Não foi à toa que nenhum presidente de nenhuma federação tenha dito nada sobre a escandalosa prisão de Nuzman. Dirigentes esportivos se unem a grandes empresas e multinacionais, assim como a grandes emissoras de TV como a Globo, e a políticos corruptos. E botam a máquina para funcionar em troca de basicamente duas coisas: lucros e corrupção.

Remoção de moradores da Vila Autódromo

Tivemos o dramático exemplo disso nas Olímpiadas do Rio, em que populações pobres inteiras foram removidas à força e reprimidas em nome dos lucros das grandes empreiteiras e multinacionais. Todo o espetáculo e a beleza do esporte, que deveria servir como um elemento de integração e confraternização entre os povos, se subordina e transforma, no capitalismo, em justificativa para a repressão em nome do lucro.

Já imaginou como seria se o esporte estivesse realmente a serviço do desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes, integrado à educação, assim como do conjunto dos trabalhadores e da população desse país? Se contasse com uma política pública que o  transformasse em um direito para todos e não mais um privilégio de poucos? Se fosse algo que não só trouxesse entretenimento, mas uma verdadeira integração entre os povos?

Infelizmente, isso não vai ser realidade enquanto houver Nuzmans, Havelanges e Ricardos Teixeira. E também enquanto houver um governo ligado a banqueiros empresários, ou uma CBF, uma Adidas e Rede Globo mandando no esporte. Enfim, enquanto houver capitalismo.