Rodrigo Ricupero, professor de História do Brasil-USP e presidente da Adusp

Rodrigo Ricúpero*, de São Paulo (SP)

O 1º de Maio é feriado nacional em muitos países, como no Brasil, uma espécie de homenagem aos trabalhadores. Infelizmente, hoje, importantes setores do movimento operário no Brasil e no mundo tentam apagar o passado e a tradição do 1o de Maio, um dia historicamente marcado pelas lutas dos trabalhadores de todo mundo e símbolo do internacionalismo proletário.

Na segunda metade do século XIX, o desenvolvimento do capitalismo nos grandes centros europeus e nos EUA e o enorme aumento da indústria foram sustentados graças a uma superex-ploração da classe trabalhadora. Cada vez mais, camponeses e trabalhadores independentes eram jogados nas grandes indústrias, onde não existiam leis ou regras de proteção ao trabalho. Os trabalhadores, inclusive mulheres e crianças, enfrentavam jornadas extenuantes, de mais de 16 horas diárias, salários baixíssimos e a ausência de qualquer tipo de assistência social.

Contudo, os trabalhadores não aceitaram essa situação, iniciando sua luta por melhores condições de vida, organizando associações e sindicatos. Pouco depois surgiram os primeiros partidos que percebem que essa luta não poderia se restringir ao plano nacional, compreendendo assim, a necessidade de unir forças com outros trabalhadores, independente de raças ou de nacionalidades.

É nesse contexto do final do século XIX que a luta dos trabalhadores contra a exploração se materializa numa grande manifestação em Chicago (EUA), em 1886.

Chicago em 1886

Os EUA, após o final da Guerra Civil (1861-65), em que o Norte industrializado do país derrotou o Sul agrário e escravista, garantindo o fim da escravidão, entraram em uma fase de enorme desenvolvimento econômico, com um impressionante desenvolvimento industrial. Milhares de imigrantes europeus chegavam todos os anos para trabalhar nas grandes fábricas, sendo Chicago o principal centro industrial do país. Lá, como na Europa, não havia leis de proteção aos trabalhadores. Estes impulsionados pelas suas associações, sindicatos anarquistas e socialistas, iniciaram uma grande luta pela limitação da jornada diária de trabalho em oito horas.
Uma grande manifestação foi marcada para o 1o de maio de 1886. A polícia norte-americana, instrumento feroz do patronato contra a organização dos trabalhadores, reprimiu brutalmente a manifestação; os trabalhadores se defenderam e atacaram os policiais, mas a força repressiva foi muito maior. O número de mortos nunca pôde ser apurado, muitos foram enterrados clandestinamente e inúmeras prisões foram efetuadas. Líderes como Albert Parsons, Georg Engel, Adolph Fischer, Louis Lingg e August Spies foram condenados à morte, outros foram condenados à prisão perpétua ou a penas de longos períodos.

A repressão ao 1o de Maio de 1886, em Chicago, foi o ponto alto de um processo de ataques aos trabalhadores nos grandes centros da época. Se, por um lado, inexistiam leis de proteção ao trabalho, por outro, o capital contava com leis para impedir a organização dos trabalhadores. Em muitos países, sindicatos e partidos eram proibidos ou fortemente controlados e quem tentasse organizar os trabalhadores era considerado criminoso.

Na Alemanha, o partido socialista, sindicatos e a imprensa operária foram proibidos. Nos EUA, os sindicatos sofreram um duro golpe, que só foi superado no começo do século seguinte.

a II Internacional e o 1º de Maio
A primeira organização que tentou unificar a luta da classe operária em escala mundial foi a Associação Internacional dos Trabalhadores, conhecida também como Primeira Internacional, fundada em 1864. Apesar da predominância de figuras como Marx e Engels, a luta contra as tendências anarquistas foi fatal. Após a derrota da Comuna de Paris (1871), a Associação foi extinta em 1878.

Apesar disso, o movimento não desistiu e, em 1883, foram iniciadas as discussões para o restabelecimento de uma organização internacional.

O primeiro encontro dessa nova organização aconteceu em Paris, em 1889, durante as comemorações do centenário da Revolução Francesa. Fundou-se, assim, a Internacional Socialista chamada, posteriormente, de Segunda Internacional, com fortes influências marxistas, que seriam abandonadas no século seguinte.

Entre as resoluções práticas do congresso, estavam os apoios à iniciativa da American Federation of Labour (Federação Americana do Trabalho), que pretendia realizar uma grande manifestação no 1o de Maio de 1890, para lembrar a morte dos operários de Chicago. A Internacional Socialista aprovou a idéia e instituiu a data como Dia Internacional do Proletariado, adotando como programa fundamental a luta pelas oito horas. Essa deveria ser uma grande manifestação internacional, com data fixa, de maneira que, em todos os países, e em todas as cidades, ao mesmo tempo, os trabalhadores se mobilizariam. No final, foi decidido que os trabalhadores das diversas nações teriam que “realizar esta manifestação nas condições que lhes são impostas pela situação especial de cada país”. Nascia assim o 1º de Maio, como Dia Internacional de Luta dos Trabalhadores.

* Rodrigo Ricúpero é doutorando em História do Brasil na USP
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