Durante oito dias, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre permaneceu sob o controle de centenas de jovens organizados no Bloco de Lutas. No centro das exigências estavam a abertura imediata das planilhas de custos do transporte urbano e o passe livre para estudantes, desempregados, indígenas e quilombolas. A ocupação foi vitoriosa e representou uma rica experiência de auto-organização do movimento. Deixou um recado para a classe dominante: a juventude está insatisfeita com os políticos e as instituições do regime
 
Greve geral e ocupação da Câmara: a força da aliança entre jovens e trabalhadores
A ocupação da Câmara teve início às vésperas do 11 de julho. Enquanto a juventude tomava de assalto o Poder Legislativo, os trabalhadores se organizavam para paralisar a produção e os serviços. No dia seguinte, Porto Alegre viveu uma greve geral. Desde cedo, piquetes foram armados nas principais vias da cidade. A mobilização dos rodoviários e metroviários garantiu a paralisação dos transportes. Bancos, repartições públicas e comércio estavam de portas fechadas.
Milhares participaram das mobilizações na cidade. A marcha, articulada pelo Bloco de Lutas, CSP-Conlutas e  organizações sindicais que compõem o Espaço de Unidade de Ação, reuniu cerca de 1,5 mil pessoas durante a tarde e terminou no pátio da Câmara.
A ocupação foi o ponto alto de um processo de mobilizações em defesa do transporte público, que já se estende por oito meses. Foram encaminhadas propostas de debates e ações relacionadas a temas como educação, saúde, democratização dos meios de comunicação, legalização das drogas, desmilitarização da polícia e combate às opressões, expressando as reivindicações que surgiram das jornadas de junho.
Os ocupantes se orgulhavam em afirmar que estavam trabalhando mais que os vereadores. Essa expressão resume a situação política atual, pois é das mobilizações que estão surgindo as respostas para os anseios da ampla maioria da população. A ofensiva do movimento colocou a Prefeitura e os vereadores contra a parede e conseguiu encaminhar Projetos de Lei, elaborados durante a ocupação, sobre o passe livre e a publicização das planilhas de custo do transporte urbano municipal. Agora, a pressão das ruas é pela aprovação imediata das demandas.
 
Cresce o desgaste do regime político e dos governos
O prefeito José Fortunati (PDT) e o governador Tarso Genro (PT) insistem em caminhar na contramão das reivindicações populares. O primeiro afirmou que não há possibilidade de mexer no lucro dos patrões para instituir o passe livre e anunciou, na última semana, um corte histórico no orçamento, justamente nas áreas sociais.
Já Tarso Genro apresentou um projeto de passe livre para estudantes, mas quem pagaria a conta seria a população, com a isenção de impostos para os empresários e retirada de verbas da Saúde e da Educação. A insatisfação com as respostas improvisadas e os ataques dos governos cresce a cada dia. Denúncias de corrupção começam a gerar fissuras importantes na base de sustentação da Prefeitura. A popularidade de Tarso caiu para 25%, segundo pesquisa do IBOPE.
A realidade é que as vitórias obtidas nas mobilizações fazem crescer a confiança da população no movimento e diminuem as ilusões com os políticos no poder. Na explosão de junho, perdemos o medo, e o mês de julho foi marcado pela ocupação das câmaras em Porto Alegre, Belo Horizonte, Belém, São Luis, Natal e Salvador.
Como os jovens da Espanha, os brasileiros repetem a frase: “o que chamam de democracia, não é”, expressando a insatisfação com a democracia representativa e indireta, que só serve aos ricos e legitima as desigualdades sociais. O fracasso da Reforma Política de Dilma expressa que as urgências do movimento não cabem na agenda institucional e vão continuar se ampliando e desenvolvendo nas ruas até que sejam conquistadas.
 
Bloco de Lutas: explosão das ruas se transforma em organização
A unidade de ação entre o movimento estudantil, sindical e popular no Bloco de Lutas ocorre desde o mês de janeiro. O movimento surgiu para barrar o aumento das passagens e defender o transporte 100% público, mas hoje ampliou seus horizontes. O Bloco foi fundamental para disputar o caráter das Jornadas de Junho e se consolidou como direção das mobilizações em Porto Alegre. A independência política frente aos governos e patrões e a defesa da classe trabalhadora são princípios do Bloco.
Do ponto de vista organizativo, a hierarquia está nas assembleias, que submetem um conjunto de comissões e são abertas à participação do ativismo. Num modelo de organização que se assemelha ao da Assembleia Nacional de Estudantes – Livre (ANEL), quem participa das lutas pode intervir nos rumos do movimento. Há um rechaço ao método de decisão por consenso e também aos acordos burocráticos que marcam as entidades tradicionais como UNE, CUT e Força Sindical, onde a democracia de base não tem vez.
A militância do PSTU seguirá participando do Bloco para desenvolver essa rica experiência de representação e unidade de ação dos movimentos sociais, defendendo a necessidade de aprofundar a relação política e organizativa do Bloco com os métodos desenvolvidos pela classe trabalhadora ao longo da história. A construção de uma nova greve geral em Porto Alegre, no dia 30 de agosto, é o próximo passo para que as pautas do movimento contra os governos de Fortunati, Tarso e Dilma avancem, mas também deve ser um momento para enfraquecer as burocracias sindicais que se negam a unir as mobilizações de junho e julho. É o momento de “organizar a esperança e conduzir a tempestade”, unificando jovens e trabalhadores em luta e fortalecendo as novas alternativas de organização do movimento.
 

Post author Matheus “Gordo”, de Porto Alegre (RS)
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