Em São Paulo, há tempos, o “Comitê contra o Genocídio da Juventude Negra” tem realizado protestos – como a ocupação do shopping Higienópolis, em fevereiro, e um ato no MASP, em julho – para denunciar a crescente onda de violência racial e policial na periferia. País afora, organizações dos movimentos negro, popular e em defesa dos direitos humanos também têm se mobilizado. E, infelizmente, motivos não faltam.

Somente no final de julho, três raros episódios em que a verdade veio à tona, servem como exemplos disto. Em Guarulhos, no dia 30, cinco policiais foram presos por estarem envolvidos com o “desaparecimento”, no dia 12, de dois jovens. No dia 31, um pai indignado, provou, através de uma investigação particular, que seu filho e um amigo foram executados pelos policiais que forjaram uma cena de “resistência seguida de morte”. No mesmo dia, as redes de TV mostraram um policial dando um tiro no pé de um jovem negro, de 16 anos, rendido e desarmado (leia no site).

Absurdos e escabrosos, estes casos não só são exceções no que se refere à impunidade que cerca os criminosos fardados, como também formam apenas a fétida ponta de um monstruoso iceberg formado por milhares de corpos, como prova o “Mapa da Violência 2012”: entre 2005 e 2011, por exemplo, 3.921 pessoas foram mortas por PMs de São Paulo, sendo 3.074 em episódios de “resistência seguida de morte”, na verdade, execuções sistemáticas realizadas pela polícia. Se considerarmos os anos de 1999 a 2004, somando os números do Rio e São Paulo, o número chega a quase 10 mil pessoas.
São números como esse que fazem como que a polícia brasileira seja conhecida como uma das mais violentas do mundo, responsável por 108 vezes mais mortes do que a de todo os Estados Unidos.

A serviço da higienização e do racismo
A mesma polícia responsável pelos assassinatos cotidianos também é notória por sucessivos massacres, como em 2006, quando 493 pessoas foram mortas em suposta represália ao Primeiro Comando da Capital (PCC). Braços armados dos governos estaduais (aliados aos policiais civis e às guardas municipais), também protagonizam episódios de extrema violência, como no Pinheirinho, na “cracolândia”, nas comunidades “pacificadas”, na Universidade de São Paulo ou em qualquer lugar onde haja um protesto ou mobilização.

Histórias que são parte de uma mesma política, patrocinada e alimentada pelos governos em todas suas instâncias (federal, estaduais e municipais): a higienização social e a criminalização da pobreza. Algo que, num país onde 50,4% da população é formada por negros e negras, já marcados historicamente pelo racismo (como “reza” o famigerado ditado “negro suspeito é suspeito, parado é ladrão”), é evidente que a violência também “tem cor”: na faixa dos 15 e 24 anos, morrem 139% mais negros do que brancos e, entre 2001 e 2010, enquanto, na mesma etária, o número de vítimas brancas caiu 27,5% (de 18.852 para 13.668); o de negros aumentou 23,4% (de 26.952 para 33.264).

Uma política que tem aumentado principalmente nos locais onde estão sendo realizadas as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), da Copa ou das Olimpíadas. Mas, não só neles.

Crimes do Estado e criminalidade cotidiana
País afora, abusos de poder, truculência e autoritarismo são práticas constantes nas ações de uma polícia que trata a população, principalmente a pobre e preta, como verdadeiros inimigos. Prática particularmente comum no caso da polícia comandada pelo tucano Geraldo Alckmin, que somente no primeiro semestre de 2012 assassinou 637 pessoas, um aumento de 53% em relação ao mesmo período, no ano passado.

Não faltam aqueles (no governo ou na imprensa) que “justifiquem” as mortes, afirmando que são “casualidades” ou “fatalidades” Uma farsa absurda. Primeiro, porque o que deixa a população exposta à criminalidade é, na verdade, outro tipo de “marginalidade”: aquela provocada pelo mesmo sistema que a PM protege à bala: a falta de moradia, de acesso à saúde, à educação e ao emprego.

É esta marginalização cruel que, segundo o Mapa da Violência de 2012, fez com que, nos último 30 anos (de 1980 a 2010), nada menos que 1,1 milhão de brasileiros (50 mil por ano) tenham sido assassinados, o que levou o coordenador da pesquisa, Julio Waiselfisz, a fazer uma terrível comparação: “É como se uma cidade inteira tivesse sido atingida por uma bomba atômica”. E o pior que isto não é um exagero. Basta lembrar que no Iraque, onde a população, desde 2003, sofrem sob canhões, metralhadoras e bombas, morrem por ano, cerca de 13 mil pessoas.

Contudo, o que imprensa e governos minimizam, é que a própria PM é responsável por uma parte significativa destas mortes. Em São Paulo foram exatamente uma em cada cinco: 290 (22,3%) dos 1.299 assassinatos de 2011 foram praticados por policiais militares.

Parte significativa das mortes vieram pelas mãos da famigerada Rondas Ostensivas Tobias Aguiar, a Rota, a mesma que é o “grande orgulho” do asqueroso Paulo Maluf, cujas mãos sujas de sangue foram recentemente vistas entrelaçadas com Lula e seu candidato em São Paulo, Fernando Haddad. Em 2011, a Rota fuzilou 91 pessoas, 82 duas delas em situações de “resistência”. Uma tendência que está longe de ser revertida: entre janeiro e maio de 2012, foram cometidos outros 45 assassinatos (17 só em maio), o que equivaleu a 104,5% a mais do que o mesmo período em 2010.

Para por fim às mortes, somente o controle dos trabalhadores
Para que os trabalhadores e a juventude negra (como também homossexuais, mulheres e demais oprimidos e explorados) não continuem sendo transformados em “alvos” pelas forças policiais é necessário uma completa mudança na estrutura da corporação.
Foi isso que Ana Luiza Figueiredo, candidata à prefeitura de S. Paulo, pelo PSTU, defendeu em artigo assinado juntamente com o professor de Sociologia da USP Ruy Braga, na Folha de S. Paulo, em 28 de julho: “a desmilitarização da polícia é uma exigência democrática sem a qual, 25 anos depois, a sociedade brasileira ainda não terá superado a ditadura”.

Algo que começa pela total democratização do sistema, com direito de que os soldados se organizem sindicalmente, elejam (e possam destituir) seus superiores, possam fazer greves e protestos e, acima de tudo, seja controlada pela população, que deveria ter o direito de eleger os delegados, promotores e juízes.

Essas são apenas algumas medidas iniciais, que os candidatos do PSTU estão defendendo. Mas não é tudo. Também estamos a serviço de organizar a população para que sejam os próprios trabalhadores que gerenciem sua própria segurança, através de grupos comunitários encarregados de controlar e trabalhar com policiais nos bairros, formados pelos trabalhadores e voluntários para combater a violência e a criminalidade.
Post author Wilson H. da Silva, da Secretaria de Negros e Negras do PSTU
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