O Portal do PSTU publicou um artigo de nosso colega Jeferson Choma sobre a greve realizada em uma refinaria inglesa. O artigo ressaltava que a greve era contra a contratação de trabalhadores estrangeiros com o lema “trabalho britânico para trabalhadores britânicos” e que, portanto, era uma greve xenófoba. Pouco depois de sua publicação chegou uma carta à direção do PSTU de André Ferrari, da corrente Socialismo Revolucionário (SR), do PSOL. O autor ataca duramente a postura que defendia no artigo: “Um recente artigo publicado na página do PSTU na internet intitulado ‘Grã Bretanha: uma greve que os patrões agradecem’, acusa os grevistas, trabalhadores subcontratados, da Refinaria de Petróleo de Lindsey, em North Lincolnshire , Inglaterra, de adotarem uma postura que só ajuda os patrões.

Repetindo a mesma abordagem distorcida dos grandes meios de comunicação da burguesia, o artigo repreende os trabalhadores grevistas por realizarem uma ‘campanha xenófoba’, um movimento contra a contratação de trabalhadores imigrantes. O título e o conteúdo do artigo não deixam dúvidas em relação à postura contrária à greve por parte do articulista do PSTU”.

O Socialismo Revolucionário faz parte de uma corrente internacional (que defendeu esta greve) e reproduz as informações que seus colegas do Socialist Party da Inglaterra difundiram.
Considerando que existe uma polêmica internacional, onde há organizações que defendem a greve e negam seu caráter xenófobo, acusando os que não compartilham de sua posição de cair nas mentiras da imprensa burguesa, achamos necessária uma resposta pública. Algo que tem urgência, pois, mesmo após o fim desta greve, conflitos deste tipo e novas greves têm surgido na Inglaterra com os mesmos lemas. Os sindicalistas que convocaram a greve já tinham avisado de que isto era só o começo.

XENOFOBIA NA INGLATERRA
A greve que começou no final de janeiro dos trabalhadores da construção civil britânicos da Lindsey Oil se estendeu para várias plantas de outras cidades. André Ferrari explica que ela chegou atingir 20 cidades e que foi imposta pelas bases contra a direção sindical (o que faz a greve ser considerada ilegal na Inglaterra), e produziu importantes mobilizações.

A causa da greve foi a contratação de 198 trabalhadores estrangeiros, portugueses e italianos. Uma empresa contratista britânica anunciou que iria demitir trabalhadores a partir do dia 17 de fevereiro, porque a refinaria tinha concedido a construção de uma planta a outra sub-contratista, neste caso à italiana IREM, que trazia seus próprios trabalhadores da Itália e Portugal. Os grevistas exigiam a contratação de trabalhadores britânicos. O lema da greve era “trabalho britânico para trabalhadores britânicos”. O conflito acabou com o acordo que previa a contratação de 102 trabalhadores britânicos.

Segundo o porta-voz do sindicato que convocou a greve, o movimento era “contra as companhias forasteiras que discriminam os trabalhadores britânicos. É uma luta por nosso direito ao trabalho, não uma briga racista”. Este é o argumento defendido por Ferrari, o Socialist Party e a Corrente Marxista Internacional de Alan Woods. Além disso, todos eles insistiram que inclusive houve algum tipo de apelo em unificar na greve os trabalhadores estrangeiros para que exigissem iguais condições trabalhistas.

A multinacional TOTAL e a contratista da obra em questão, a italiana IREM, bem como o governo britânico, disseram que as condições trabalhistas dos estrangeiros eram iguais as dos trabalhadores britânicos e que a contratação de italianos e portugueses foi realizada porque não se encontravam especialistas entre os trabalhadores locais. É provável que as multinacionais e o governo britânico de Gordon Brown usaram essa mentira para tirar força da greve. De fato, existem três sentenças judiciais que permitiram a contratação de trabalhadores estrangeiros com salários dos países de origem. Sabemos também que os trabalhadores italianos e portugueses dessa obra vivem em um barco da companhia.

Os defensores da greve minimizam a importância do uso das consignas xenófobas que foram largamente utilizadas. Afirmam que a plataforma aprovada na assembléia dos trabalhadores (proposta de um militante do Socialist Party), não incluía o lema de “trabalho britânico para trabalhadores britânicos” e de que o movimento era a favor de todos os trabalhadores.

Afirmam também que foram exibidos cartazes em italiano chamando os trabalhadores a participar na greve. Diziam que nos primeiros dias da greve não havia uma direção e que essas consignas foram adotadas pelos trabalhadores de forma espontânea. Por fim, acabam reconhecendo que a xenofobia existia, mas graças a sua intervenção ela não se fortaleceu.

“Se o Partido Socialista não tivesse participado ativamente desta briga, haveria o perigo de que tais atitudes tivessem se fortalecido. No lugar disso, foi conquistada uma maravilhosa vitória que senta as bases da sindicalização dos trabalhadores estrangeiros e fortalece a unidade de classe”, afirmou Bill Mullins, do Socialist Party (CWI Inglaterra e Gales).
Esta tese é defendida por Rob Sewell, editor da Socialist Appeal (corrente de Alan Woods, conhecido propagandista do chavismo). Segundo ele, “os representantes sindicais negaram a se unir à campanha racista da imprensa amarela.” (A greve em Lindsey e as mentiras dos meios de comunicação).

Em resumo, para os defensores da greve elas não eram racistas e nem xenófobas. Foram greves contra a possibilidade de as empresas utilizarem mão de obra mais barata. Foi uma greve que defendeu os direitos dos trabalhadores imigrantes, seus direitos sindicais e servem como um exemplo para todos os trabalhadores europeus. Se houve alguma consigna xenófoba, foi porque não existem greves puras ou que foram adotadas por uma confusão dos grevistas.

“Trabalho britânico para trabalhadores britânicos”
As razões de fundo da greve são os estragos causados pela crise econômica: o crescimento do desemprego, fechamento e demissões na indústria britânica. Por mais que se queira enfeitar, a greve teve um caráter xenófobo. A consigna da greve “trabalho britânico para trabalhadores britânicos” foi um lema criado pelo primeiro ministro britânico Gordon num evento do Partido Trabalhista. Posteriormente, o slogan foi copiado pelo partido de ultradireita PNB (Partido Nacional Britânico).

Outras bandeiras levantadas pelos grevistas exigiam colocar “os trabalhadores britânicos em primeiro lugar” e ainda diziam que “os estrangeiros tiram nosso trabalho”. Tais consignas são as mesmas utilizadas pelas organizações ultradireita em toda Europa. Isso teve conseqüências diretas contra os trabalhadores imigrantes. Um piquete de trabalhadores da refinaria de Lindsey, por exemplo, se dirigiu à embarcação onde se encontravam os trabalhadores italianos e portugueses para lhes dizer que voltassem a seu país. Os trabalhadores estrangeiros relataram que foram alvo da rejeição da população e que, por isso, circulavam pouco pela cidade.

O que pediam os trabalhadores em greve?
A burguesia utiliza a mão de obra imigrante para pressionar para baixo os salários e as conquistas dos trabalhadores. A chamada Diretiva Bolkstein é uma lei que permite contratar trabalhadores de outros países da União Européia com os salários do país de origem. Embora ainda não tenha sido aprovada, a diretiva começou a ser aplicada em várias empresas graças a sentenças judiciais.

Mas a greve de Lindsey não tinha como eixo a oposição à discriminação salarial dos trabalhadores imigrantes. O movimento exigia a contratação de mão de obra britânica. “É um escândalo e mais ainda nas atuais circunstâncias econômicas. Não temos nada contra os trabalhadores de outros países, mas sim de que os nativos não possam competir com eles em igualdade de condições”, diz um comunicado do movimento.
Uma reportagem do jornal Begoña Arce afirma: “se em Lindsey os questionados eram trabalhadores portugueses e italianos, em Staythorpe são espanhóis, subcontratados pela empresa francesa Alston, para construir uma turbina. Os principais sindicatos do setor falam de 850 postos de trabalho em jogo e pedem que eles sejam repartidos com os britânicos. ‘Claramente, não há a intenção de contratar ninguém. A empresa realiza os contratos fora, com empregados que não são britânicos, mas achamos que há mão de obra local disponível’, declarou à BBC o representante do sindicato Unite, Steve Syson. ‘Queremos transparência e ver o quanto se tem pago aos contratados estrangeiros’”.

Se a greve fosse como dizem seus defensores, o movimento não deveria ter incluído entre suas reivindicações simplesmente a contratação dos trabalhadores britânicos. Mas teria reivindicado que, os que fossem contratados, tivessem os mesmos direitos salariais e sindicais.

Vejamos o resultado da greve inglesa dos trabalhadores britânicos, tomada como um triunfo pelos seus defensores: dos 198 que seriam contratados para essa obra, 102 seriam britânicos sindicalizados. Ou seja, há 102 trabalhadores italianos e portugueses que estavam a ponto de assinar o contrato de trabalho, mas que agora ficaram sem emprego.

No seu afã de buscar argumentos a favor de seu apoio à greve inglesa, Ferrari a compara com uma greve encabeçada pela Conlutas em São Jose dos Campos no Brasil: “O próprio sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos e região, onde o PSTU tem maioria na direção, protagonizou no ano passado uma heróica luta contra a tentativa da General Motors de contratar 600 novos trabalhadores temporários com menos direitos e com salários rebaixados em relação aos demais trabalhadores da empresa.
Essa mobilização teve que enfrentar uma brutal ofensiva unificada dos patrões, prefeitura, Igreja e meios de comunicação que acusavam o sindicato de ser contra a geração de empregos e o desenvolvimento da região. O sindicato e os trabalhadores resistiram e ao final conseguiram arrancar mais direitos, ainda que não o ideal, para os novos trabalhadores contratados”, afirma.

Mas a greve Lindsey Oil não foi uma luta como a do Brasil para que os novos contratados tivessem os mesmos direitos. Mas sim um movimento para que se contratassem outros trabalhadores, os britânicos que. segundo os sindicalistas ingleses. estavam sendo discriminados por não serem contratados pelas empresas IREM ou pela Alston.

O governo britânico – a raiz da greve xenófoba de Lindsey Oil – exigiu das instituições da União Européia a regulação dos trabalhadores deslocados de seus países em benefício dos trabalhadores locais. Isto facilitaria ainda mais a discriminação da qual sofrem os trabalhadores imigrantes.

A exigência de contratar trabalhadores (e de realizar greves e ocupações de empresas para conquistar essa reivindicação) é uma ação operária de grande importância e que obteve sucessos em muitas ocasiões. É provável que seja uma prática que se amplie em tempos de aumento do desemprego. Contudo, quando se faz contra outros trabalhadores pelo fato de serem estrangeiros, a luta perde todo caráter de classe: divide os trabalhadores por nacionalidades e acabam fomentando a opressão do setor mais explorado da classe trabalhadora: os imigrantes. As mensagens racistas e xenófobas acabam entrando nas fileiras operárias através de argumentos cuja justificativa é de que “os imigrantes aceitam salários e condições de trabalho inferiores às dos trabalhadores nacionais”. Até parece que os imigrantes aceitam tais condições porque gostam ou como se tivessem possibilidades de escolha.

Os governos agora aparecem como defensores da livre circulação de trabalhadores e contra a xenofobia e o racismo, quando na realidade são os responsáveis pelo racismo e por leis que transformam os imigrantes em cidadãos de segunda categoria. O que interessa a eles é que as empresas possam contratar trabalhadores com os salários mais baixos. Nesse sentido, esta greve ajuda a burguesia em dividir os trabalhadores. Seu objetivo é ir afastando a possibilidade de uma mobilização de conjunto da classe operária européia contra a crise e o desemprego.

Burocracias sindicais contra a unidade da classe operária
Os sindicalistas britânicos que impulsionaram a greve das refinarias também contribuíram ao dividir os trabalhadores europeus. O perigo do “nacionalismo” se fortalecerá enquanto se realizarem greves contra a contratação de trabalhadores de outros países. Além disso, facilitou a penetração do fascismo entre os trabalhadores britânicos. Isso explica porque o BNP fez uma festa com esta greve.

Seu exemplo poderá ser seguido em outros países, colocando os trabalhadores de cada país contra trabalhadores de outras nacionalidades. Na Itália, por exemplo, se chegou a propor a expulsão de trabalhadores britânicos do país.

Os sindicatos britânicos exigem medidas protecionistas para os trabalhadores britânicos, o que significa discriminar os trabalhadores estrangeiros, incluídos, como neste caso, também os trabalhadores de outros países da União Européia. Na Espanha as centrais sindicais CCOO e UGT aceitam que se discriminem os trabalhadores imigrantes que não tenham permissão de residência de longa duração.
É nefasto, portanto, o papel da burocracia sindical que utiliza argumentos como os de defender as condições trabalhistas dos trabalhadores locais, promovendo assim o corporativismo dos trabalhadores. Por isso, não é surpreendente o papel dos dirigentes sindicais relatado por Rob Sewell de Socialist Appeal: “Surpreendentemente, o secretário geral do sindicato UNITE, Derek Simpson, posou para o (jornal) Daily Star, rodeado de duas mulheres jovens que usavam camisetas com a imagem do jornal e com os mesmos cartazes: ‘empregos britânicos para os trabalhadores britânicos’. Nesse mesmo dia, os fotógrafos do Daily Star e as mulheres em questão tinham participado do piquete de greve, mas os grevistas deixaram claro que eles não eram bem-vindos.”

Defender bandeiras xenófobas é a conseqüência lógica de anos de incentivo à divisão entre os trabalhadores. Alguns a manifestam claramente, como no caso de Simpson, em outros casos o apoio é envergonhado.

Uma resposta de classe ao desemprego
Para dar uma resposta de classe à crise e ao desemprego, os trabalhadores europeus terão que enfrentar a xenofobia patrocinada pelos governos e as burocracias sindicais. Os problemas dos trabalhadores são os mesmos, independente de sua nacionalidade. A ampliação de consignas xenófobas ocorre porque não há um combate das burocracias sindicais. Esconder ou minimizar a falsa consciência dos setores mais atrasados dos trabalhadores é o que fazem as correntes defensoras da greve de Lindsey Oil. Na prática, capitulam às bandeiras xenófobas.

Combater a xenofobia e o racismo entre os trabalhadores não se faz apenas com discursos, mas propondo soluções de classe contra os efeitos da crise. Para combater o desemprego é necessário mobilizar os trabalhadores para diminuir a jornada de trabalho, sem redução de direitos e salários. Dessa forma, pode-se garantir que existam empregos para todos. É esta bandeira que levanta o Programa de Transição contra o desemprego: escala móvel de horas de trabalho.

A lógica que propõe a burocracia sindical conduz a discriminação dos imigrantes, mas em outros lugares leva a idéia de que é preferível que não se contrate trabalhadores que não sejam nativos, ou que se demitam os trabalhadores das empresas subcontratadoras, pois não são parte dos empregados fixos. Ou ainda, que se demitam os trabalhadores precários porque não existem as mesmas garantias salariais e trabalhistas que os trabalhadores fixos.

A única garantia para defender os postos de trabalho é a unidade de todos os trabalhadores. Para isso temos que exigir igualdade salarial, e que todos os trabalhadores tenham os mesmos direitos trabalhistas, sindicais e políticos. Exigir os mesmos direitos vai servir para que enfrentemos juntos os capitalistas que condenam à miséria milhões de trabalhadores em todo o mundo. Quem deve pagar pela crise econômica são os capitalistas e não os trabalhadores.

Post author José Moreno, da Liga Internacional dos Trabalhadores
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