Em impostos, brasileiro trabalhou 13 dias em 2008 para custear o SUS, e 14 dias para pagar os juros da dívida públicaQuem passa em frente à sede da Associação Comercial de São Paulo, na rua Boa Vista, bem no centro da capital paulista, depara-se com o tal “impostômetro”, uma enorme bugiganga que supostamente marca o valor dos impostos pagos pelos brasileiros. Na tarde do dia 30 de junho, o painel marcava R$ 500 bilhões em impostos nas três esferas de governo: municipal, estadual e federal.

Arquitetado por empresários para denunciar o tamanho da carga tributária no país, o impostômetro, contudo, não marca o essencial. No Brasil, a maior parte dos impostos incide sobre o trabalho e não sobre o capital. E são justamente os mais pobres que arcam proporcionalmente com a maior parte de sua renda em tributos. E o pior, grande parte desse dinheiro não se reverte em benefícios à população.

É o que revela o estudo Receita Pública: quem paga e como se gasta no Brasil, divulgado neste dia 30 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pela Receita Federal. O estudo partiu de dados do IBGE e do Tesouro Nacional e revela a estrutura injusta do sistema tributário.

Tributos incidem sobre os assalariados
Segundo o estudo, peso dos proprietários no PIB de 2006 foi de R$ 2 trilhões, enquanto o rendimento dos não-proprietários somou R$ 969 bilhões. No entanto, os não-proprietários contribuíram para a receita, via tributo previdenciário e imposto de renda, ou seja, através de tributos diretos, com R$236 bilhões, ou 24%. Já a arrecadação que incidiu sobre a propriedade e renda do capital totalizou apenas R$141 bilhões, ou 13,6%.

Isso significa que os assalariados são os que pagam a maior parte da conta dos impostos, apesar de sua participação no PIB ser menor.

Pobre paga mais
Ainda segundo o Ipea, a estimativa da carga tributária para 2008 foi de 36% do PIB. Ou seja, de todo o valor que foi produzido ano passado, 36% foram para os cofres do governo. Dividido por pessoa em um ano, significa que cada brasileiro trabalhou 132 dias para pagar os impostos.

Dividido por faixa salarial, revela-se o caráter perverso do sistema tributário brasileiro. Quem ganhou até dois salários mínimos por mês, teve que trabalhar 197 dias no ano para o governo. A carga tributária equivaleu a 53,9% de seu rendimento. Em 2004, equivalia a 48,8%, mostrando a tendência de esta injustiça aumentar cada vez mais. Já quem ganha 30 salários mínimos trabalhou 107 dias do ano para pagar impostos, ou 29% de seu rendimento.

Injustiça que se revela de forma ainda mais contundente ao se observar que, em 2008, os 10% mais pobres gastaram 32,8% de sua renda aos tributos, enquanto que os 10% mais ricos destinaram 22,7% da renda. O estudo considerou apenas os impostos diretos, fosse abranger os impostos indiretos, ainda mais injustos por incidir de forma igual para ricos e pobres, tal disparidade aumentaria ainda mais.

Pra onde vai
Se não bastasse a carga tributária injusta, o pior é destino desses recursos. Para se ter um exemplo, segundo projeção do Ipea, em 2008 o governo gastou 3,6% do PIB com o Sistema Único de Saúde, o SUS. Isso equivale, em média, a 13 dias de trabalho no ano para cada brasileiro. O Bolsa Família, principal programa social do governo, despendeu o equivalente a apenas 0,4% do PIB, ou um dia e meio de trabalho de cada contribuinte.

Já o pagamento de juros da dívida pública consumiu o ano passado 3,8% do PIB, ou 14 dias de trabalho. Ou seja, enquanto trabalhamos 13 dias para custear o SUS, trabalhamos 14 dias para os lucros do grande capital internacional.

  • Leia o estudo na íntegra (.pdf)