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Redação

Farra do auxílio-moradia a juízes é só a ponta do iceberg dos privilégios, enquanto metade da população sobrevive com salário mínimo ou menos

Imagine você receber mais de R$ 4 mil todo mês só para pagar o aluguel, e ainda viver com um salário de mais de R$ 33 mil. A divulgação do auxílio-moradia e outros privilégios recebidos por juízes da Lava Jato como Marcelo Bretas e Sérgio Moro causa indignação e recoloca a discussão sobre os privilégios da cúpula do Judiciário.

O caso de Bretas foi que chamou primeiro a atenção. Ele recebe o auxílio-moradia mesmo tendo imóvel próprio no Rio e, por decisão judicial, acumula o benefício junto com a esposa, também juíza federal (o Conselho Nacional de Justiça havia determinado que nesses casos apenas um dos cônjuges receba o auxílio). Quem também ganha a mamata é o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato. Mesmo tendo casa em Curitiba (e dois apartamentos), recebe R$ 4.377 de auxílio-moradia, além de outros penduricalhos que somam R$ 6.659.

No caso dos juízes, a lei da magistratura determina que quem tem imóvel próprio na região que atua não deve receber o auxílio. Uma liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal, Luis Fux, porém, liberou em 2014 a farra desse penduricalho cujo objetivo é, como o próprio Moro confessou, driblar o teto salarial de R$ 33 mil. Para o juiz-estrela da Lava Jato, o privilégio “compensa a falta de reajuste dos vencimentos desde 1 de janeiro de 2015 e que, pela lei, deveriam ser anualmente reajustados”. Um escárnio, um verdadeiro tapa na cara da metade da população que sobrevive com um salário mínimo ou menos.

Um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Antonio de Paula Santos Neto, um dos que recebem o auxílio, não tem apenas um imóvel próprio, mas 60. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, a lista de imóveis registrados no nome do magistrado inclui apartamentos em áreas nobres como Higienópolis e Morumbi.

O absurdo auxílio-moradia dos juízes, que por si só já é o dobro o rendimento médio mensal dos brasileiros (de R$ 2.149), porém, é só a ponta do iceberg de uma lista quase interminável de privilégios e mordomias destinados não apenas à cúpula do Judiciário, mas também aos políticos.

Morar é um direito… para políticos e juízes
Para os juízes, procuradores e deputados, que também contam com o auxílio-moradia que pode chegar a R$ 4 mil, morar é um direito. Morar bem é um direito, diga-se de passagem, cujo gasto nem pode sair dos salários das “excelências”. Não é assim para você, que precisa apertar o cinto para dar conta do aluguel, ou teve que ralar por anos para ter sua casa própria. E muito menos para quem nem isso tem, caso das 6,1 milhões de famílias que não contam com um teto, segundo dados do déficit habitacional no país da Fundação João Pinheiro (FJP).

E quando famílias sem-teto ocupam um imóvel vazio destinado à especulação imobiliária em flagrante atentado à Constituição, descumprindo a função social da terra e acumulando milhões em dívidas em impostos, como foi o caso do Pinheirinho, são esses mesmos juízes privilegiados, sentados na varanda de seus apartamentos de luxo, que determinam a reintegração de posse.

Juiz Federal Marcelo Bretas. Foto Agência Brasil

Privilegiados e marajás
Os juízes compartilham os privilégios e mordomias com seus amigos deputados. Cada deputado federal recebe o teto de R$ 33.763. Tem à disposição um apartamento funcional ou o auxílio-moradia. Não tem a preocupação com saúde que todos nós temos. Toda despesa com saúde, seja internação ou qualquer outro serviço médico, é ressarcido integralmente pela Câmara. Do mesmo jeito, todos os gastos com passagem, combustível, ou qualquer outra coisa, entra na cota parlamentar que pode chegar a R$ 45 mil. Isso sem falar nos R$ 97 mil para contratação de assessores.

São esses mesmos políticos, os verdadeiros marajás, que querem aprovar a reforma da Previdência dizendo que servidor público ganha muito e que os trabalhadores no país se aposentam muito cedo. São os mesmos que, não bastando receber tudo isso, ainda são pegos em escândalos de corrupção. É ou não é uma provocação?

Marx já alertava que o Estado é o comitê executivo da burguesia. E para cumprir essa função, seus funcionários precisam ser bem remunerados, como executivos de uma grande empresa. Do presidente, ministros, passando por deputados, senadores e, claro, os juízes. Se os deputados fazem leis em favor da burguesia, os juízes têm a função de fazê-la cumprir. Precisam viver como a burguesia, morar onde ela mora, frequentar seus espaços, comer da sua comida.

Não precisam esquentar a cabeça com o caos da saúde pública, a falta de moradia, o preço nos supermercados ou a segurança pública. Os políticos e juízes não precisam se perguntar porque o piso do magistério, de R$ 2.455, não é pago pela maioria dos municípios no país. Seus filhos estudam em colégios particulares ou no exterior.

Pelo fim dos privilégios
As mordomias e privilégios gozados pelos políticos, juízes e procuradores é um verdadeiro tapa na cara da população e dos trabalhadores, que penam para chegar ao final de cada mês. É preciso acabar com os privilégios dessa gente. Um deputado, ou qualquer político com cargo eletivo, deveria ganhar o mesmo que ganha um professor ou um operário especializado. Todos os benefícios e mordomias deveriam ser simplesmente extintos.

Os juízes, por sua vez, além de terem seus privilégios cortados, deveriam ser eleitos pela população. São medidas democráticas, o mínimo do mínimo, que deveriam ser implementadas.