O deprimente espetáculo da mais recente crise no Congresso rende imagens e situações cada vez mais grotescas. A desfaçatez dá lugar a um cinismo sem precedentes, aprofundando a desmoralização dessa instituição. Nenhum fato qualitativamente novo para uma população que já se acostumou aos permanentes escândalos de corrupção que rondam Brasília.

No entanto, na esquerda, chama a atenção o papel cumprido pelo PCdoB na defesa incondicional do senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Ressuscitando o surrado argumento dos “golpes das elites”, utilizado largamente durante a crise do “mensalão”, o PCdoB ignora todas as evidências de corrupção que pululam contra o presidente do Senado e acusam a “mídia golpista” de conspirar contra Renan.

O Ex-comunista Quintanilha
Um recente exemplo da completa degeneração pela qual esse partido passa responde pelo nome de Leomar Quintanilha (PMDB-TO). O senador eleito o mais novo presidente do Conselho de Ética para livrar Renan, teve uma passagem meteórica pelo PCdoB em 2005. O partido, na época sem representante no Senado, recebeu Quintanilha com fogos de artifício. A nota publicada no site Vermelho na ocasião festeja a filiação do político, mas é sucinta na biografia do senador. “Funcionário do Banco do Brasil, com 49 anos, Quintanilha elegeu-se em 2002 para seu segundo mandato no Senado. Também preside a Associação Tocantinense de Futebol. Sua atuação parlamentar prioriza as questões da educação”, diz a notícia, publicada em 1º de outubro de 2005.

A biografia lacônica e envergonhada tem sentido. Omite que Quintanilha foi presidente municipal da Arena (Aliança Renovador Nacional), o partido da ditadura, na cidade de Araguaiana. Integrou posteriormente o PFL e foi dirigente do PPB durante de 1995 a 2001. Filiou-se ao PMDB antes de entrar para o PCdoB a convite do deputado Renildo Calheiros (PCdoB-AL), irmão de Renan Calheiros. A situação esdrúxula virou piada no Congresso e Quintanilha, um rico latifundiário em Tocantins, passou a ser chamado de “camarada” pelos seus pares. Sua intenção era concorrer ao governo do Estado sob a sigla. Porém, dois anos depois, o senador retorna ao PMDB.

Quintanilha nem havia sentado na cadeira do Conselho quando sua ficha-corrida veio à tona: uma lista de escândalos de corrupção em que está envolvido, passando por processos no Supremo Tribunal Federal e na Procuradoria Geral da República. Ele responde por corrupção como parlamentar, estelionato, fraude, peculato e formação de quadrilha.

O fantástico mundo do PCdoB
No mundo em que os “comunistas” vivem, não há lobistas, gados superfaturados ou notas frias. Toda a crise se resume a um contra-ataque da mídia que não teria conseguido derrubar Lula em 2005. Porém, para apresentar essa versão, só mesmo recorrendo às tradicionais falsificações da realidade praticadas pelo stalinismo. Segundo matéria publicada no site Vermelho, “até agora, todos os depoimentos e documentos que chegaram ao conhecimento da Comissão de Ética do Senado mostram que não há qualquer veracidade nesta acusação plantada pela própria jornalista Mônica Veloso que, junto com seu advogado Pedro Calmon, tentam chantagear o presidente do Senado”.

Se existe ainda algum elemento subversivo no PCdoB, é a subversão da percepção da própria realidade. Os documentos encaminhados pelo próprio Renan ao Senado, a fim de comprovar a renda do senador em seus negócios agropecuários, foram assinados por empresas de fachada, utilizadas em Alagoas para lavar dinheiro. No entanto, para o partido stalinista, tudo não passa de uma ofensiva da direita para atingir Lula. Desta forma, o site do partido se dedicou diariamente à defesa do senador que integrou a primeira linha da tropa de choque do governo Collor. Defesa esta realizada também no próprio Senado através de Inácio Arruda (PCdoB-CE).

Além disso, esse argumento não deixa de exalar um machismo velado, apresentando Calheiros como mera vítima de sua ex-namorada. Afinal, na mais perversa ótica da sociedade capitalista e machista, as mulheres são sempre as interesseiras e golpistas.

O buraco é mais fundo
Exemplos mostram como o PCdoB pode se converter facilmente numa mera legenda de aluguel. Porém, há vários outros exemplos da profunda decadência do antigo partido ideológico de esquerda. O atual diretor da ANP, a Agência Nacional do Petróleo, Haroldo Lima, é dirigente histórico do partido e comanda pessoalmente o leilão e a desnacionalização dos poços de petróleo. Já o ministro dos Esportes, o “comunista” Orlando Silva, é co-organizador dos jogos do Pan, imerso em denúncias de superfaturamento e irregularidades.

O PCdoB recorre à sua história de luta contra a ditadura e à apropriação da simbologia socialista a fim de evitar a desmoralização diante de sua atual política. No entanto, sua crise se aprofunda. Que o digam os não-poucos militantes honestos e de luta que estão em sua base, principalmente no movimento sindical.

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