Na semana passada, uma matéria assinada por André Cintra no “Portal Vermelho” tornou pública uma política contida no documento aprovado pelo Comitê Central do PCdoB, intitulado “Tática mais afirmativa e audaciosa do partido”.

No referido artigo, João Batista Lemos, membro da Comissão Sindical, declara em tom de advertência que “os comunistas poderão buscar alternativas para um movimento sindical de alianças amplas e flexíveis. Uma das hipóteses em estudo é a criação de uma nova central” (grifo nosso). Isso nos remete a analisar a nova proposta do PCdoB.

Como o PCdoB encarava a ruptura da CUT?
Tendo em vista a realização do Conat, em maio de 2006, e o 9º Congresso Nacional da CUT no mês de junho do ano passado, Altamiro Borges, responsável pela revista “Debate sindical” da Corrente Sindical Classista (CSC), ligada ao PCdoB, publicava no Portal de seu partido uma matéria intitulada “Dilemas da CUT e racha da Conlutas”. O artigo não escondia seu objetivo: lançar uma clara ofensiva contra a iniciativa do Conat de fundar a Conlutas e, ao mesmo tempo, fortalecer a disputa no interior da CUT.

O artigo considerava que a ruptura com a CUT e fundação da Conlutas era uma atitude totalmente “irresponsável”. Condenava o diagnóstico classificado por Altamiro como “tese da traição da direção”. Para ele, a CUT não era “algo homogêneo, impermeável à mudança”. Afinal, segundo ele, a central reunia o que havia de “mais combativo no sindicalismo”.

Para Altamiro, a proposta de construção de uma nova alternativa “esbanjava” um “otimismo voluntarista”. Ele ainda chamava de “tresloucados” os que afirmavam que a CUT havia morrido para a luta dos trabalhadores. Por fim, concluía que essa alternativa estimulava a “confusão”, servindo “aos interesses da direita” e apostava na “divisão dos trabalhadores”. Para ele, a saída de “lideranças combativas” da CUT “ao invés de reforçar a pluralidade e mesmo as críticas nesta central, acaba piorando a correlação de forças no seu interior”, além de levar um “auto-isolamento”.

Qual é o atual diagnóstico do PCdoB sobre a CUT?
Passado quase um ano desde que Altamiro escreveu seu artigo, algo parece ter mudado nos “diagnósticos” do PCdoB. Agora, repentinamente, descobriram que a “CUT está em crise”, que está “enfraquecida como instrumento dos trabalhadores”, que “não tem mais o socialismo no horizonte, mantendo-se omissa ou mesmo tímida na luta antiimperialista”. Descobriram também que em “vez do sindicalismo classista, da luta e da unidade dos trabalhadores”, a CUT “aposta no sindicato cidadão e nas negociações tripartites”. Criticam a subordinação da CUT ao PT, o que teria levado à “falta de democracia” e a uma “cultura hegemonista” que “impede a democracia interna, o pluralismo e a tomada coletiva de decisões no interior da central”.

Descobriram, enfim, que “não há mais transparência em várias instâncias, como a Secretaria de finanças”. Em outras palavras, descobriram, se nos permitem um resumo, que a CUT morreu como um instrumento de luta da classe trabalhadora.

O argumento de que a ruptura da CUT significava fazer o jogo da direita neoliberal, que violava o princípio da unidade sindical e conduzia ao isolamento, simplesmente desapareceu sem nenhuma explicação.

Na busca por maior espaço
A guinada brusca do PCdoB de colocar na ordem do dia a possibilidade de romper com a CUT e fundar uma nova central, ao invés de sérias considerações teóricas, parece se fundamentar muito mais na tentativa de recuperar um espaço perdido junto ao movimento sindical, do que realmente construir uma nova central com “feições classistas, pautada pelo sindicalismo combativo, com uma concepção democrática, unitária e plural.”

O artigo não esconde isso ao analisar que “uma nova perspectiva da CUT demanda uma profunda democratização interna, com nova repactuação política e programática, de forças e de espaços de poder (grifo nosso)”.

A perda de espaço do PCdoB, por um lado, ficou patente após o resultado do 9º Congresso Nacional da CUT. Ao invés de ampliar suas forças, como era sua expectativa, terminaram perdendo a hegemonia em duas importantes CUT´s estaduais: a CUT da Bahia e a do Rio de Janeiro. Além disso, o PCdoB só não perdeu sua posição de vice-presidente na direção nacional da central, graças a inúmeras negociações que resultaram em um acordo, baseado na criação de duas vice-presidências.

Por outro lado, o desgaste da CUT torna-se cada dia mais evidente. Desgaste esse que é resultado da defesa da política neoliberal do governo junto às suas bases. Não é por acaso que o número de sindicatos que se desfiliam da CUT cresce a cada mês. E esse processo, como não podia deixar de ser, acaba por atingir o próprio PCdoB. Por isso, esse partido muitas vezes se vê forçado a compor chapas sindicais que se comprometem a rediscutir a filiação com a CUT, como foi o caso dos metalúrgicos de Volta Redonda (RJ).

Uma nova central governista?
Mas o que realmente demonstra que o verdadeiro objetivo do PCdoB é ganhar espaço, é que em nenhum momento este partido deixa claro que seu projeto se fundamenta na ruptura política com o governo.

Não há como esconder que esse é um debate crucial. Não é a toa que ele cruza todas as discussões sobre a reorganização do movimento sindical brasileiro, já que o governismo da CUT está na raiz da sua crise.

Há passagens no artigo que vão nesse sentido, ao considerar que a reeleição de Lula está no marco da “eleição” e “consolidação” de “governos progressistas na América Latina, que abrem mais espaço para a luta por um projeto nacional de desenvolvimento, com valorização do trabalho, soberania nacional e perspectiva socialista”. Coerentes com isso, mais à frente afirmam: “É positiva a presença de sindicalistas na presidência da República e no Ministério do Trabalho”. Não é por outro motivo que o PCdoB não anuncia junto com seu projeto o abandono de seus cargos no governo. Lembremos que eles ocupam o Ministério dos Esportes, a presidência da Agência Nacional de Petróleo, responsável pela entrega das nossas reservas petrolíferas.

Assim, o projeto do PCdoB caminha para a construção de mais uma central governista ao não resolver a contradição que vive a CUT. Não se pode lutar de forma conseqüente em defesa dos direitos dos trabalhadores, se não houver disposição não só de se enfrentar com o governo, mas, sobretudo, de derrotar Lula e suas reformas neoliberais. Do mesmo modo, não se pode falar da construção de uma central realmente independente do governo, dos patrões e do Estado, mantendo-se nos confortáveis cargos da Esplanada dos ministérios.

Para se avançar na construção de um projeto coerente é necessário que o PCdoB comece, antes de tudo, por romper com o próprio governo.

Post author Paulo Aguena, da direção nacional do PSTU
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