Diego Cruz

Ao contrário do que afirma à imprensa, a mineradora Vale está demitindo trabalhadores diante da crise internacional. Se durante o período de crescimento os mineiros enfrentaram a pressão pela produção cada vez maior, agora arcam com o medo da demissão e o clima de terror criado pela empresa no local de trabalho. O Portal do PSTU conversou com Paulo Soares, presidente do Metabase de Itabira, sindicato de 63 anos que representa os trabalhadores das minas de Itabira e região, abarcando uma base de aproximadamente 15 mil trabalhadores. A cidade foi o berço da empresa, fundada em 1942. Há três anos o Metabase se desfiliou da CUT e hoje integra a Conlutas.

Explique um pouco a realidade do trabalho dos mineiros na empresa.
Paulo Soares – O trabalho de extração do minério é muito duro e também muito perigoso. O grau de perigo no trabalho das minas é de nível 4, um dos mais altos. A área das minas a céu aberto é muito agressiva, com um nível de poluição muito alto. Temos turno de seis horas, apesar de a empresa, a todo momento, pressionar para o turno de oito horas. Mas não deixamos. O turno de seis horas foi uma conquista da greve de 89. A mina funciona 24 horas e temos esse turno de seis horas e outro de sete horas para o setor administrativo. E aqui tem todo o tipo de trabalho. O setor extrativo, por mais tecnologia que tenha a cada dia, é ainda um serviço grosseiro, muito duro. Tem a marreta de 10 quilos, alavanca de cinco quilos. É fisicamente muito penoso. Causa muitos problemas de saúde, como problemas de coluna e, principalmente, doenças psicológicas devido á pressão da empresa. Ela exige, muitas vezes, muito além da capacidade do homem.

Como a Vale começou a demitir?
Paulo Soares – Até setembro, as grandes corporações, entre elas a Vale, festejavam lucros de bilhões. Havia uma corrida desenfreada pelo lucro. Quer dizer, o Bradesco anunciava 10 bilhões de lucro, a Vale anunciava 19 bilhões em nove meses. Era uma festa do capital. Havia uma ilusão muito grande. Em outubro começa a ter o primeiro sinal de crise no Brasil. Para se ter uma idéia, a Vale chegou a valer 194 bilhões de dólares em capital aberto no mercado em setembro e, em outubro, o mundo começa a desabar. As empresas começam a encolher. Mais do que depressa, a Vale vai para a imprensa dizer que a crise era passageira, e o próprio governo fala isso, quando fala da “marolinha”. A Vale dizia que ia manter seus investimentos, que segurava a onda. E, em novembro, a primeira empresa que começa a demitir é a Vale. Fecha minas, dá férias coletivas, demite, o contrário de tudo o que vinha anunciando. É a primeira empresa que toma uma medida contra os trabalhadores e os municípios mineradores.

O Roger Agnelli, presidente da empresa, foi à imprensa defender a flexibilização de direitos. A Vale chegou a propor isso ao sindicato?
Paulo Soares – Chegou a falar mesmo. A empresa nos procurou propondo suspender o contrato dos trabalhadores. Nosso entendimento é que, ao contrário, isso é um facilitador para as demissões. Colocamos à empresa que não vamos facilitar as demissões, e que iríamos fazer um processo de enfrentamento e não iríamos admitir que a crise fosse jogada nas costas dos trabalhadores, que não tem nada a ver com essa crise. Não é o trabalhador o manipulador do mercado financeiro. Vamos colocar todos os instrumentos possíveis para impedir que a empresa demita.

A Vale vem fazendo uma ofensiva de mídia contestando as demissões.
Paulo Soares – A Vale está colocando para a imprensa inteira que no ano passado começou com 42 mil empregos e fechou com 47 mil e que vai criar mais 11 mil até 2011. Mas não falada nada sobre os oito mil que colocou em férias coletivas e que não sabe o que fazer com eles. E está chamando os sindicatos para discutir demissões. Estamos desmentindo a Vale hoje em nível de imprensa.

Quais as medidas que o sindicato já tomou?
Paulo Soares – A primeira coisa que analisamos é que isso não era apenas um assunto que nos dizia respeito. Ela envolve toda a comunidade e chamamos toda a sociedade para se envolver nessa discussão. Também fazemos um diálogo permanente com os trabalhadores da Vale, através de assembléias, panfletos, conversando diretamente com eles. Estamos hoje com uma mina parada aqui, a de Cauê, que nunca tinha parada em 63 anos de atividade. E o trabalhador, claro, tem medo da demissão. Está hoje muito apreensivo e a todo momento recebe ameaças da empresa. Tivemos informação esses dias que qualquer trabalhador que participar de nossas manifestações será demitido. A empresa passa 8, 10 horas por dia com o trabalhador nas minas e tem todo esse tempo para fazer uma enorme pressão em cima dele. Se ele mexer um dedo, é demitido. Só nas minas de Itabira já teve quase 2 mil demissões, entre empregados da Vale e terceirizados. Mas estamos tentando puxar ele pras mobilizações, colocando que ele é o ator principal desse processo. Que a sociedade está do lado dele. Estamos defendendo os empregos e os direitos. E não vamos aceitar nenhum tipo de flexibilização.

Qual a expectativa que o sindicato tem desse movimento?
Paulo Soares – Fizemos já quatro atividades. Uma audiência pública, um culto ecumênico com a sociedade civil, também teve uma discussão com vice-governador do estado e esse ato do dia 8 será a quarta atividade. Queremos mostrar para Itabira, para Minas e para o Brasil nossa indignação contra o sistema. Não é só contra a Vale. É contra a postura do governo Federal, que joga dinheiro para os bancos e empresas. Mas não dá garantia nenhuma ao emprego. Estamos exigindo a reestatização da Vale. O setor que dirige hoje essa empresa aposta nas roletas de Las Vegas. Grande parte do lucro dela vai para acionistas, para os banqueiros. Precisa mudar esse processo todo. E que outras cidades copiem esse movimento e que ele cresça. Em defesa do emprego e do Brasil.