Rafael Borges, da Baixada Santista

Em tempos de crise econômica ressurgem os demagógicos slogans patronais: “Não pense em crise, Trabalhe!”, ou então, coisas como “trabalhadores e empresários são igualmente atingidos pela crise e devem igualmente fazer sacrifícios”. Entretanto, no mundo real, distante do marketing do governo e das empresas, sabemos que as coisas não são bem assim.

Para os grandes empresários a crise significa tão somente uma oscilação na sua taxa de lucro representada em alguma tabela. Mas para os trabalhadores, a crise significa desemprego, miséria e até mesmo a dispersão das famílias operárias. Assim, aquele que até então era um “colaborador”, como muitas empresas designam seus trabalhadores, rapidamente se transforma em uma peça qualquer descartável. Apenas mais um número para se somar aos outros 12 milhões de trabalhadores desempregados no Brasil.

O desemprego no país ainda cresce e parece não demonstrar sinais de que irá diminuir. Segundo a MCM Consultores, mesmo que a atividade econômica do país volte a crescer em 2017, a taxa de desemprego – que hoje está em cerca de 11%, deverá continuar subindo até atingir o pico de 13,4% de desempregados no terceiro trimestre de 2017.

Esses números ainda não refletem a realidade, pois levam em consideração apenas os que ainda estão procurando emprego. A taxa de desemprego ampliado – que também leva em consideração aqueles desempregados que já desistiram de procurar trabalho- já é de 21,2%. Por tanto, são 23 milhões de pessoas sem trabalho ou vivendo de pequenos bicos.

O desemprego, evidentemente, já é um mal por si só. Mas infelizmente, a realidade mostra que muitos trabalhadores demitidos precisam suportar o não pagamento das verbas rescisórias. Em outras palavras, um verdadeiro calote patronal.

O crescimento do número de demissões sem o devido pagamento das verbas rescisórias é perceptível quando vemos o crescimento do número de ações trabalhistas ajuizadas no ano de 2016 a fim de requerer algum direito não cumprido durante a rescisão do contrato de trabalho.

O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 15° região, que abrange Campinas e o interior paulista, teve um aumento de 50,4% de ações ajuizadas no primeiro semestre de 2016, em comparação com o mesmo período em 2015, devido à falta de pagamento de verbas rescisórias. Em Cubatão, importante polo industrial da região da baixada santista, no primeiro semestre de 2015, foram ajuizadas 1.598 ações. No mesmo período de 2016, o número saltou para 2.567, um acréscimo de 60% na comparação de um ano com o outro.

Os patrões e seus advogados falam frequentemente em “segurança jurídica” e “legalidade” quando querem evitar uma greve ou coibir qualquer ação independente dos trabalhadores, mas a realidade mostra que os defensores da sagrada legalidade estão dispostos a passar por cima da própria lei para preservar o lucro da patronal, mesmo que isso signifique lançar milhões de trabalhadores na rua sem qualquer direito.

A demissão seguida pelo calote patronal – o não pagamento devido das verbas rescisórias- torna o que já era ruim em um verdadeiro pesadelo para as famílias trabalhadoras. As Contas de luz, água, cartão de crédito e aluguel ficam atrasadas. Mas as necessidades mais básicas não podem aguardar os longos meses de espera para a audiência trabalhista ou alguma decisão judicial e aí, inevitavelmente, é preciso apelar para empréstimos e as dívidas começam a acumular.

Depois de meses de agonia e espera, quando é chegado o momento da sentença, não nos surpreenderia uma decisão negativa. Afinal de contas, com raras e honrosas exceções, a justiça do trabalho acaba se convertendo numa verdadeira “justiça patronal”, sempre ávida a homologar os calotes dos empresários e limitar a capacidade de resistência dos trabalhadores.

Outro fato que torna ainda mais complicada a vida dos trabalhadores demitidos são as mudanças nas regras de aquisição do seguro-desemprego realizadas pelo Governo Dilma, em 2015, que dificultaram ainda mais o acesso ao benefício. Segundo o Ministério do Trabalho mais de um milhão de trabalhadores demitidos ficaram sem o seguro-desemprego depois das mudanças promovidas pelo governo Dilma.

Atrasos no pagamento do 13° salário

Os calotes da patronal não atingem apenas os trabalhadores demitidos. Empregados de vários setores da economia brasileira também enfrentam o descumprimento por parte da patronal dos mais elementares direitos trabalhistas. Nos últimos meses tivemos inúmeros casos de descumprimento de cláusulas de acordos e o não pagamento de direitos, tais como o 13° salário.

Em 2015, 87 empresas da construção civil de São Paulo atrasaram o pagamento do décimo terceiro. Já em 2016, esse número saltou para mais de duas mil empresas, segundo o sindicato da categoria. No setor industrial a situação também não é diferente. Mais de 60 empresas do ramo metalúrgico da região de São Paulo e Mogi das Cruzes não pagaram um centavo sequer do décimo terceiro até o momento.

Os servidores públicos de vários Estados e inúmeras cidades também enfrentam o atraso no pagamento do décimo terceiro, férias e cestas básicas. O caso dos servidores do Rio de Janeiro, sem sombra de dúvidas, é o mais gritante, mas com toda certeza esse quadro é generalizado. Há alguns dias, servidores públicos de Cubatão realizaram um protesto contra o prefeito para cobrar o pagamento do décimo terceiro.

Desse modo, a crise econômica, acaba sendo o subterfugio que patrões e governos encontraram para deliberadamente pisotear os direitos dos trabalhadores em um nível mais acelerado. A reforma trabalhista é a maior expressão disso. Aproveita-se o desemprego e o receio de demissão para criar uma retórica que legitime a criação de um novo e maior patamar de exploração.

A única saída que a patronal brasileira encontrou para sair da crise é esmagar os direitos e conquistas dos trabalhadores. A reforma trabalhista defendida pelos corruptos do governo Temer e pela patronal é, em essência, a aniquilação de direitos e a legalização do calote patronal.

Organização e luta para enfrentar o desemprego e o calote patronal

O descumprimento dos mais elementares direitos trabalhistas e o não pagamento das verbas rescisórias não é um caso circunstancial, mas sim, como mostramos aqui, um fenômeno generalizado pela patronal brasileira, sobretudo em tempos de crise econômica. Assim, não se trata de um problema de um ou outro trabalhador ou determinada categoria, mas sim um problema que diz respeito a todos os trabalhadores brasileiros.

Para os empresários e ricos, a crise econômica significa, na pior das hipóteses, uma fazenda ou um iate luxuoso a menos. Mas para os trabalhadores é sinônimo de desespero e panela vazia. Evidentemente, os trabalhadores devem ingressar na justiça do trabalho para pleitear os seus direitos. Mas, pelos motivos expostos a cima, não podemos ficar atados e assistindo nossas famílias passarem por necessidades básicas enquanto esperamos uma decisão da justiça. Os trabalhadores têm todo o direito a se rebelar contra o desemprego em massa e os calotes da patronal.

Os empresários e seus representantes no Congresso Nacional e no judiciário estão unidos e dispostos a acabar com os direitos trabalhistas e legalizar os calotes patronais. A única resposta à altura a esses ataques é a unidade dos trabalhadores e a construção de uma grande greve geral que impeça as demissões em massa e derrote as reformas que querem acabar com nossos direitos.