Publicamos a seguir uma versão resumida do Correio Internacional 98, que analisa a grave crise que atravessa o Paraguai às vésperas das eleições presidenciais e apresenta a plataforma de Tomás Zayas, candidato à presidência pela Esquerda Unida e membro do Partido dos Trabalhadores daquele país

As eleições de 27 de abril no Paraguai se darão em meio a uma profunda crise política, econômica e social do país. Esta situação abre grandes possibilidades ao Partido dos Trabalhadores – seção da LIT-QI no Paraguai – e à frente eleitoral Esquerda Unida, com a candidatura presidencial do dirigente camponês Tomás Zayas.
A crise econômica é insustentável: há uma paralisia total das inversões produtivas. A recessão golpeia o povo pobre que sente a grave deterioração do nível de vida, o aumento do desemprego e a pobreza. Também golpeia a débil burguesia industrial que, segundo o presidente do setor, “metade está morta e a outra metade sobrevive em estado de coma”. A burguesia comercial fechou as portas de milhares de estabelecimentos e o setor financeiro não consegue se recompor de uma crise bancária que dura dez anos. Além do mais, a corrupção generalizada corrói a todos os setores do Estado.

Segundo dados oficiais e do FMI, em 2002 a economia caiu 4% e o PIB por habitante, 7% (1.180 dólares). O déficit fiscal foi recorde, 140 milhões de dólares, o que derivou num atraso crônico dos salários dos funcionários para pagar a dívida externa, que aumentou 2,2 bilhões de dólares. O salário mínimo perdeu 9,6% de seu valor. O Guarani se desvalorizou 45% frente ao dólar e a inflação chegou a 14,5%. O desemprego aberto aumentou 7,6% e a pobreza aflige 35% da população, dos quais 909 mil vivem na extrema pobreza.
O Estado é incapaz de garantir que o país funcione. Na educação este ano, mais de 50 mil crianças não poderão ir à escola por não se ter como pagar o salário dos professores. Tampouco garante a saúde: o orçamento é cada vez menor e os hospitais estão aos pedaços. Sem falar na habitação, terra e a infra-estrutura de serviços.

A crise do regime político e do governo

Agudizou-se visivelmente a crise do regime e de suas instituições. Hoje não podem garantir sequer a passagem do mandato presidencial porque não se sabe se González Macchi chegará até esta data.

Os partidos políticos e o Parlamento caíram em um descrédito inédito. O Poder Judiciário não oferece garantias para exercício da “justiça”. A participação de altos chefes militares no desvio de 1,7 milhões de dólares se evidencia com a prisão de um ex-comandante do Exército, que promete “não cair sozinho”. A Igreja Católica se viu envolvida em um escândalo sexual.

O governo de Luís González Macchi nasceu de uma crise profunda, o “março paraguaio” de 1999, e seguiu sempre submerso a ela. O atual presidente chegou ao poder logo depois do assassinato do vice-presidente Luís Maria Argaña e da renúncia do ex-presidente Raul Cubas Grau. Hoje, até seus próprios correligionários do Partido Colorado retiraram seu apoio, de olho nas eleições, com tanta ineficiência e corrupção.

Macchi foi acusado de corrupção e submetido a um julgamento político no Congresso. O processo terminou com sua absolvição, mas nenhum senador o defendeu. Votaram contra sua destituição alegando não ser “o momento oportuno”. O custo disto foi o aprofundamento da instabilidade política: o presidente ficará em seu cargo, mas sem nenhum poder. É possível prever um traumático fim de mandato: 92% da população considera seu governo ruim ou muito ruim.

Por que o governo não foi destituído?

Um motivo é a corrupção. O julgamento político, mais uma palhaçada do Congresso, teve ao menos a virtude de desnudar a podridão reinante no Parlamento e nos partidos burgueses. As denúncias de venda de votos por dinheiro e cargos seguem até hoje.
Por outro lado, o Partido Colorado, principal sustentáculo do regime, por seu descrédito crescente, necessita se desvincular do governo. No entanto, não pode propôr a destituição do presidente, por um simples motivo: Macchi é filiado ao Partido Colorado.

Por isso, o candidato presidencial colorado, Nicanor Duarte Frutos, fez campanha contra a destituição, mas mandou um de seus principais operadores políticos, o presidente do Congresso, impulsionar a destituição. Desta forma pôs a nu a profunda decomposição do Partido Colorado.

Duarte Frutos, “escolhido” para dar continuidade aos planos imperialistas, necessita que o atual presidente aplique medidas urgentes para acalmar o descontentamento popular nos próximos dois meses, tempo suficiente para ganhar as eleições. Por exemplo, o governo decretou um aumento do salário mínimo de 11%, que beneficiará a cerca de 200 mil trabalhadores urbanos; estabeleceu o preço do quilo do algodão em 1.900/2.100 guaranis, insuficiente para os agricultores, mas superior ao do ano passado; e nomeou um novo diretor de Aduana para garantir as arrecadações requeridas para pagar o salário dos 200 mil funcionários estatais.

Mas o principal motivo pelo qual se mantém o governo é a debilidade das organizações dos trabalhadores, camponesas e populares, que não conseguiram articular mobilizações para exigir sua queda. Durante o julgamento político não houve uma só manifestação contra o governo e no dia em que se definiu a continuidade de González Macchi, a praça em frente ao Congresso estava vazia.

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