Em ano eleitoral, papa foi esquivo sobre imigrantes e não anunciou medidas contra pedofilia na igrejaO papa Benedito XVI fez uma visita oficial de seis dias aos Estados Unidos, chegando àquele país no dia 15 e encerrando-a no dia último 20, domingo. Um assunto monopolizou a viagem: os casos de pedofilia de mais de 5000 padres católicos norte-americanos, que cometeram abusos sexuais em pelo menos 13000 crianças e causaram despesas da ordem de US$ 2 bilhões à igreja católica para indenização das vítimas. Uma verdadeira epidemia.

Porém, apesar de dizer-se “profundamente envergonhado” pelas ações dos padres, nada de concreto foi anunciado para por fim aos casos ou para a punição dos culpados. Ao contrário, a igreja sempre buscou acordos financeiros com as vítimas para abafar os contínuos escândalos, mas nunca puniu qualquer um dos pedófilos ou removeu algum bispo de sua diocese.

Isto levou Anne Burke, juíza da Suprema Corte de Illinois a afirmar que “há uma crise Enron (em referência à Enron, empresa que enganou seus acionistas na crise econômica de 2001) na igreja católica. A única diferença é que os acionistas da Enron foram capazes de livrar-se de sua equipe de diretores”. Peter Isely, vítima de abuso sexual e membro da “Rede de Sobreviventes dos Abusados por Padres” disse que o papa estava “olhando para aqueles homens que eram diretamente responsáveis, e ao invés de repreendê-los, ele elogiou-os”, ao referir-se aos bispos durante uma conferência.

Imigração
O único objetivo do papa era, aparentemente, tirar a igreja católica de uma crise que abalou seus alicerces nos Estados Unidos, levando à perda de um número incalculável de praticantes. Objetivo semelhante ocorreu com suas declarações sobre os imigrantes, que são de países predominantemente católicos da América Latina. Dos 65 milhões de católicos norte-americanos, 18 milhões são latinos.

Sem nunca defender a legalização dos imigrantes ou seu direito de trabalharem nos EUA, afirmou estar preocupado com a separação das famílias dos imigrantes, pois “é verdadeiramente perigoso para o tecido humano, moral e social”. Isto é, existe o risco social de revoltas. No mesmo dia em que Bush e o papa divulgavam um comunicado conjunto de defesa dos direitos humanos dos imigrantes, agentes federais invadiam fábricas e prendiam mais de 300 imigrantes acusados de serem trabalhadores ilegais. Esta ação, normal durante todo o governo Bush, não mereceu qualquer nota do papa em defesa dos “direitos humanos” dos imigrantes presos.

A preocupação papal está na manutenção do setor responsável por mais de dois terços de novos católicos desde 1960 em suas fileiras, mas não numa luta real pelos seus direitos. Por isso, disse aos bispos que os imigrantes são “pessoas de fé, e nós estamos aqui para recebê-los bem”.

A visita e a eleição presidencial
Nada ficou mais evidente nesta visita que o apoio dado pelo papa ao presidente Bush, num ano eleitoral em que todas evidências indicam uma vitória do Partido Democrata, tirando os republicanos do poder. É a primeira visita de Benedito XVI aos Estados Unidos, coincidente com seu aniversário de 81 anos, em que alguns dos assuntos em discussão fazem parte da pauta eleitoral do Partido Republicano.
Entre eles o combate ao “extremismo no mundo islâmico”, isto é, ao terrorismo; a situação na Palestina e a condenação da legalização do aborto. Apesar das mensagens de paz do Vaticano, a guerra do Iraque não estava na pauta de discussões, por ser muito embaraçosa para Bush.

Numa alusão à posição comum contra a legalização do aborto, Bush afirmou em seu discurso de boas-vindas que “os americanos precisam de sua mensagem de que toda vida é sagrada”. Mas, talvez nem toda vida seja sagrada para Bush. Pelo menos não são as vidas de um milhão de iraquianos assassinados pela invasão de seu exército, nem as vidas dos palestinos mortos pelo exército israelense, ou dos haitianos que lutam contra a fome, alvejados pelas tropas de ocupação da Minustah.

Da mesma forma, o papa afirmou que, “a democracia só pode florescer quando os líderes políticos e aqueles que eles representam são guiados pela verdade”. Mas a verdade do presidente Bush, que quer manter a invasão do Iraque, é diferente à verdade do povo iraquiano, que quer a retirada do exército invasor.

Para a classe operária, a defesa da exploração capitalista, mesmo que disfarçado sob um “manto sagrado”, não passa de mais uma mentira.