Esse verso de Lô Borges e Milton Nascimento, da canção “Clube da Esquina”, vem à cabeça quando lemos as notícias das mobilizações dos trabalhadores europeus contra os efeitos da crise mundial. Nelas, as bandeiras vermelhas socialistas voltam ao primeiro plano no debate sobre qual é a saída para crise capitalista. Esse é um importante contraponto à cartilha sobre os 10 anos do PT no governo. Ela é um marco na história do partido, que abandona qualquer referência classista e socialista, em defesa do “desenvolvimentismo”, que supostamente se contraporia ao “neoliberalismo”.
Fui parte da enorme vanguarda que construiu o PT e a CUT nos anos 1980. Cento e cinquenta mil ativistas das greves abraçaram o sonho de um partido operário socialista de massas. Naqueles tempos, o PT defendia uma posição classista um pouco confusa, mas classista, necessária para afirmar um partido bem diferente dos partidos burgueses da época, como o PMDB. Lula foi candidato ao governo de São Paulo em 1982 com o slogan “vote no três porque o resto é burguês”. O número do partido ainda não era o 13. Outro slogan era “trabalhador vota em trabalhador”.
O classismo é a referência de que existem interesses opostos entre trabalhadores e patrões. Hoje, o classismo desapareceu dentro do PT. Não defendem o socialismo nem nos dias de festa. Lula e Dilma (des)educaram os trabalhadores dizendo que isso é coisa do passado.

“Governar para todos”
O classismo foi declarado irreal e utópico. É necessário e realista “governar para todos”, ou seja, com a grande burguesia nacional e imperialista.
Apoiado em uma onda de crescimento econômico, os governos do PT combinaram a garantia de altíssimos lucros para as grandes empresas com pequenas concessões para os trabalhadores, como reajustes do salário mínimo, queda do desemprego e políticas compensatórias como o bolsa família; turbinadas com a ampliação do crédito.
A ideologia de que era possível “governar para todos” foi, assim, legitimada pela sensação de melhoria. O resultado é que existe uma enorme redução das expectativas sobre as mudanças que o país necessita. Enquanto a vanguarda esperava mudar o mundo na década de 80, hoje se aceita que o bolsa família é uma demonstração da “preocupação com o social”.
Mas não é possível “governar para todos”. Ou se está do lado dos trabalhadores ou dos patrões. E o PT fez a opção de governar para as grandes empresas. Não existe comparação entre os gigantescos ganhos da burguesia e as modestíssimas concessões para os mais pobres. As mesmas multinacionais e grandes bancos que governavam o país com o PSDB, seguem mandando hoje, com o PT.
Os primeiros reflexos da crise mundial e a desaceleração economia provavelmente significarão ataques aos direitos dos trabalhadores (leia na p. 11). Estes ataques vão questionar a sensação de “melhoria” que sustenta a ideologia petista.

“Não é preciso lutar, basta votar no PT”
Nos tempos do ascenso da década de 1980, o culto à luta direta era muito forte. Nos primeiros congressos do PT todas as teses, mesmo as mais à direita, defendiam a prioridade das mobilizações diretas e a desconfiança na institucionalidade, porque só daí poderiam se gerar revoluções.
Isso desapareceu completamente da ideologia petista. Em sua cartilha, a fonte das conquistas é a política dos governos de Lula e Dilma. Na verdade, o PT diz aos trabalhadores: “não é preciso lutar, basta votar em nós que as conquistas virão”.
Essa ideologia tem uma consequência fortíssima na contenção das lutas dos trabalhadores. E facilita que milhares de ativistas, surgidos das mobilizações, sejam sugados pelos aparatos dos parlamentos e governos. A maioria dos dirigentes sindicais de hoje sonham em virar deputados, assessores parlamentares ou dirigentes de estatais.
Hoje, revoluções sacodem o Norte da África e Oriente Médio, assim como as mobilizações na Europa. Novamente, as revoluções voltam a pautar o debate dos ativistas, se chocando com a ideologia predominante no PT. Prova de que revolução não é coisa do passado. Está no presente para todo mundo ver.
 

Post author
Publication Date