O aumento do preço do feijão é um primeiro reflexo da crise econômica internacional que já atingiu diversos países e se aproxima do Brasil. Até agora, os trabalhadores não tinham sentido o peso da crise, porque a economia brasileira ainda não está em recessão. Agora, o aumento do preço dos alimentos faz com que os trabalhadores comecem a sentir a crise diretamente no bolso.

A produção de alimentos para matar a fome da população em todo o mundo foi substituída pelos produtos destinados à exportação, controlados pelas grandes empresas multinacionais do agronegócio. Essa é a conseqüência de mudanças profundas na produção agrária em todo o mundo, causadas pela globalização. Além disso, a produção de biocombustíveis – como o etanol no Brasil – diminui ainda mais a área destinada à produção de alimentos. Para piorar, com o início da recessão nos EUA, os capitais se deslocaram para uma forte especulação sobre os preços dos alimentos. O preço do arroz, por exemplo, duplicou no mercado mundial desde o começo do ano.

Portanto, está chegando ao Brasil uma crise que já levou a grandes comoções sociais no mundo, como as greves gerais no Senegal e no Egito e o levante popular no Haiti. Isso é só o início de um processo que vai ter conseqüências bem mais graves.

Uma das primeiras manifestações é o aumento da inflação, que vai reduzir o poder de compra dos trabalhadores. Isso pode detonar uma insatisfação que empurre mais fortemente as campanhas salariais. A greve radicalizada dos trabalhadores da construção civil de Fortaleza é um exemplo a ser seguido. É preciso que os trabalhadores saiam à luta por aumentos salariais e exijam do governo Lula a redução e o congelamento dos preços dos alimentos.

Ritmo de trabalho brutal
Existe uma irritação crescente no interior das empresas também por outros motivos. Um dos grandes temas é o ritmo de trabalho imposto pelos patrões, com horas-extras que muitas vezes não são pagas, através do banco de horas. Estão diminuindo o tempo de almoço, das folgas, até o tempo para ir ao banheiro. Isso se junta à precarização do trabalho, com terceirização da mão-de-obra em todas as empresas estatais e privadas.

Nesse sentido, a luta dos trabalhadores da General Motors de São José dos Campos (SP) é também um exemplo a ser seguido. Os metalúrgicos votaram contra a proposta da multinacional, que queria impor o banco de horas e a redução dos salários dos trabalhadores, com a desculpa de contratar 600 novos operários.

A CUT e a Força Sindical lançaram uma campanha pela redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas. Trata-se de uma reivindicação justa, com uma direção manobrista. Como essas centrais têm um compromisso direto com o governo e os patrões, estão conduzindo essa campanha como uma negociação que pode levar a mais perdas para os trabalhadores. Estão aceitando o banco de horas e apoiando os patrões com a desoneração na folha de pagamentos e “incentivos fiscais”.

Os trabalhadores da GM apontaram o caminho: estão lutando pela redução da jornada de trabalho sem redução dos salários. É preciso exigir do governo uma lei que reduza a jornada de trabalho, bandeira defendida pelo PT no passado, quando era oposição. E exigir dessas centrais governistas que promovam mobilizações reais pela redução da jornada, sem redução dos direitos, sem “incentivos” para os patrões.

O governo e a Câmara dos Deputados se preparam também para impor novamente o fator previdenciário (que reduziu em 40% as aposentadorias), extinto pelo Senado. Temos que exigir de Lula a extinção do fator previdenciário, o que também defendia quando estava na oposição.

O Haiti é aqui
A revolta do povo haitiano contra o aumento do preço do arroz foi reprimida duramente por tropas brasileiras enviadas por Lula. As tropas tiveram um papel decisivo na repressão quando a população chegou aos portões do palácio do governo Préval. A mancha de sangue dos haitianos mortos não sairá jamais da história de Lula e do PT.

Os trabalhadores brasileiros que se irritam com o aumento no preço do feijão devem imaginar o que significa não ter o que comer. Os haitianos têm ou não têm o direito de revoltar-se? A repressão das tropas brasileiras já sinaliza qual vai ser a postura do governo caso o povo brasileiro também se revolte.

O povo negro e pobre das favelas conhece a repressão indiscriminada da polícia brasileira. O general que comanda as tropas brasileiras no Haiti já afirmou que a “experiência” de lá servirá para a repressão nas favelas aqui.

Os trabalhadores brasileiros devem exigir de Lula a imediata retirada das tropas do Haiti. Todos os sindicatos, entidades estudantis e populares, assim como todos os partidos que se dizem de esquerda, também devem se pronunciar pela retirada.

Necessitamos de um governo socialista dos trabalhadores
O governo Lula manteve o movimento de massas sob controle até este momento. As pesquisas continuam indicando que ele tem um apoio recorde do povo, mesmo sendo um governo a serviço dos banqueiros e das multinacionais.

Isso se explica pela importância de Lula e pelo crescimento econômico que vem ocorrendo na economia mundial desde 2002. Agora, a primeira conseqüência séria da crise econômica já atinge o país, com o aumento dos alimentos. Vem aí uma situação muito pior com a recessão inevitável.

Inicialmente, os trabalhadores não relacionam essas questões diretamente com o governo, mas com os setores da burguesia (comerciantes e produtores) envolvidos diretamente com o alimento. Mas o ambiente está ficando cada vez mais tenso e radicalizado. Com a continuidade da inflação e o início da recessão, isso pode mudar.

Os revolucionários têm a obrigação de explicar pacientemente aos trabalhadores que o governo Lula serve, na verdade, aos interesses da grande burguesia. O governo pelo qual batalhamos não é esse, mas um governo socialista dos trabalhadores. Um governo que rompa com o imperialismo e evite as brutais conseqüências sociais da crise econômica que se avizinha. Um governo que deixe de pagar a dívida externa e interna para investir em saúde, evitando problemas como a dengue. Um governo que promova a reforma agrária, expropriando as grandes empresas do agronegócio e produzindo, em primeiro lugar, os alimentos que o povo necessita.

Post author Editorial do Opinião Socialista Nº 336
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