Essa semana o Datafolha publicou uma pesquisa sobre o perfil ideológico brasileiro. É uma pesquisa bem interessante porque mostra bem o como é complexo trabalhar com a ideia de campos políticos (esquerda e direita) e opinião pública.

A matéria publicada na Folha de S. Paulo (3-7-2017) traz um um perfil ideológico da população brasileira e afirma que as ideias à esquerda voltaram a empatar com as ideias à direita, comparado com setembro de 2014 (antes do impeachment, portanto). Em 2014, centro-direita (32%) e direita (13%) somavam 45%, centro-esquerda (28%) e esquerda (7%) 35%, e centro 20%. Esse ano, centro manteve-se com 20%, a centro-esquerda (31%) e esquerda (10%) somam 41%, e centro-direita (30%) e direita (10%) somam 40%. Empate técnico dentro da margem de erro dos 2%. Isso respondendo a perguntas temáticas.

No quesito auto identificação, a comparação é entre 2010 e 2017. A direita passou de 24% para 23%. A centro-direita de de 13% para 9%. O centro cresceu de 17% para 26%. A centro-esquerda de 8% para 9%. E a esquerda passou de 12% para 19%.

O problema é que pesquisas de opinião são como resultados da rodadas do Brasileirão. Para saber quem é o campeão é preciso ter todas elas juntas, considerando sua dinâmica, e não apenas uma isolada.

Qual é a contradição então?

Bom, a primeira delas, sem dúvida, é que é questionável o que a pesquisa identifica historicamente com pautas da esquerda e da direita. “Liberdade”, por exemplo, é um termo tão vago que abarca todo espectro ideológico.

Segundo, é que de acordo com a pesquisa, nos últimos sete anos a população brasileira passou a se auto identificar mais com a esquerda. O que não necessariamente significa um maior apoio às ideias de esquerda.

Por exemplo: a pesquisa mostra quem em 2014 o espectro ideológico nacional pendia para a direita e hoje volta a se equilibrar. Essa volta ao equilíbrio foi puxada principalmente por questões como a pobreza, crescimento econômico, migração e homossexualidade.

Em outras questões, o espectro foi em sentido contrário entre 2014 e hoje. Foram à direita questões como o porte de armas, o papel dos sindicatos, legislação trabalhista e interferência do governo na economia.

Sobre esse último ponto, é interessante o fato de que mais pessoas passaram a afirmar que o governo não deve interferir na livre concorrência (+7% no período) ao mesmo tempo em que mais pessoas passaram a achar que o governo deve ajudar as grande empresas nacionais para evitar a falência (+4%).

E essa é a terceira contradição. Pessoas afirmam tranquilamente posições à direita e à esquerda sem problema nenhum. Isso porque a a consciência não é um monolito.

Segundo a pesquisa (e a série histórica), a população brasileira está mais à direita em questões comportamentais e mais à esquerda em questões econômicas. Um ponto interessante é que a inclinação à direita em 2014 é puxada por questões econômicas e não há grande variação em comportamento. Talvez as Jornadas de Junho tenham algo a ver com isso. Existem muitas outras contradições. Outras tendências nas entrelinhas. Outras hipóteses e outras interpretações. Acho tudo isso muito rico e interessante. É um longo debate…

Mas isso também mostra o quão fraco são teses de “disputar algo pela esquerda” ou de “enfrentar a onda conservadora”, em nome de uma suposta “unidade da esquerda”. Desconfie de quem diz isso. O binômio esquerda-direita é insuficiente para uma análise política mais séria.

A realidade é dinâmica e contraditória. Por isso nada substitui um programa político bem definido.

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