Como a burguesia e o governo fazem os trabalhadores pagarem os custos da recuperaçãoAs grandes empresas demitiram cerca de um milhão de trabalhadores desde o início da crise. Aos que continuam trabalhando, impõem um forte arrocho salarial e um ritmo alucinado para suprir as tarefas dos que foram demitidos. O governo entregou bilhões para as empresas e nada para os trabalhadores. É assim que Lula e os empresários querem que os trabalhadores paguem os custos da recuperação parcial.

Um dos casos mais escandalosos é o da Embraer, que demitiu 4.270 trabalhadores em fevereiro. “Depois das demissões, o ritmo de trabalho aumentou na produção, pois os operários que ficaram têm que produzir pelos outros trabalhadores que foram dispensados pela empresa”, explica Hebert Claros, vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e trabalhador da Embraer.

Mas o que deixa os operários mais indignados é o fato de a empresa apresentar uma franca recuperação. Segundo balanços divulgados pela Embraer, o lucro obtido até o segundo trimestre deste ano foi de 467 milhões de reais. Um resultado que já é superior ao do ano passado, quando a empresa obteve um lucro de 429 milhões de reais. Até o final do ano, porém, a companhia poderá obter um lucro próximo dos 650 milhões de reais que atingiu em 2007, no auge do período de crescimento econômico. A empresa prevê a entrega de 242 aviões para este ano, contra 204 no ano passado e 169 em 2007.

Comparando os dados, fica claro que a Embraer promoveu as demissões em massa apenas para compensar sua perda com a especulação com os derivativos cambiais. Todo o faturamento obtido neste momento é conquistado à custa de brutal exploração, degradação das condições de trabalho e aumento exagerado no número de horas extras.
As demissões na Embraer também provocaram um efeito nefasto nas empresas fornecedoras, onde as demissões foram bem maiores. Na Sobraer, por exemplo, foram demitidos quase 80% dos funcionários. Restou aos que ficaram cumprir jornadas extenuantes de trabalho.

País das horas extras…
Apesar de ainda não existir um estudo sobre a jornada de trabalho depois da crise econômica, uma pesquisa feita em 2008 pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) a respeito da redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais mostra que o Brasil tem uma das maiores jornadas do mundo. “A queda da remuneração nos últimos anos, as altas taxas de desemprego e a pressão patronal fazem o trabalhador aceitar o prolongamento da sua jornada como forma de retomar o antigo poder aquisitivo e diminuir o risco de demissão”, diz o estudo.

O banco de horas, a reestruturação produtiva e a falta de limites às horas extras são apontados como os principais meios para o aumento da exploração. “O tempo de trabalho total, além de extenso, está cada vez mais intenso, em função de diversas inovações técnico-organizacionais implementadas pelas empresas. Também em muito tem contribuído para essa intensificação a implementação do banco de horas”, conclui o Dieese.

O instituto ainda calcula que o número de horas extras feitas no Brasil chega a 52,8 milhões por semana.

…e das doenças de trabalho
As jornadas extensas e imprevisíveis têm resultados trágicos para os trabalhadores, que são afetados por doenças como estresse, depressão, hipertensão, distúrbios no sono e lesão por esforços repetitivos, entre outras.

Em 2008, uma pesquisa realizada pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos na fábrica da GM revelou que doenças de trabalho afetam a maioria dos trabalhadores. Os dados mostram que 67% dos entrevistados apresentam dores no pescoço e nos ombros. Lesão no ombro foi a queixa de 54% dos pesquisados e 39% disseram ter algum problema de coluna.

“É impressionante a quantidade de jovens em torno de 20 a 25 anos de idade que têm problemas que antes eram relacionados a doença de ‘velho’ como hérnia de disco, bursite e surdez. Esta é a prova de como as fábricas levam os trabalhadores a níveis de vida cada vez mais precários”, afirma Hebert.

É o caso de Júlio (seu nome verdadeiro foi omitido para evitar retaliações), que trabalha na Embraer há três anos. Em depoimento ao Opinião Socialista, disse que em todo este período vivenciou uma jornada cada vez mais brutal, com ritmos alucinantes. Tudo isso o levou a graves problemas de saúde. “Fui obrigado a realizar uma cirurgia na coluna, o que me levou a ficar afastado e assim somar-me ao grande número de trabalhadores lesionados, vítimas da rotina de trabalho”, afirma.

Os lesionados geralmente são as primeiras vítimas das empresas na hora de demitir. Quando o peão chega à “fadiga de material”, como se costuma chamar dentro da fábrica, o operário é descartado como uma peça que não serve mais à linha de produção.

Hoje, após passar pelos traumas da cirurgia na coluna, Júlio expressa este temor. “Não posso mais praticar esportes como futebol, mas, mesmo assim, trabalho em pé nesta longa jornada e tenho que conviver com o grande fantasma chamado demissão”, diz.

O problema é ainda mais grave porque muitos trabalhadores lesionados não possuem nenhuma proteção. A maioria dos sindicatos ligados à CUT e à Força Sindical abre mão da cláusula que garante estabilidade no emprego aos lesionados. O Sindicato dos Metalúrgicos em São José dos Campos, contudo, é um dos poucos a manter essa garantia. “Em todos estes anos, as centrais governistas colaboraram para o avanço das políticas neoliberais de parceria com a patronal, cujo resultado foi a precarização do trabalho graças à reestruturação produtiva. A defesa do banco de horas por parte deles é uma clara demonstração dessa política”, conclui Hebert Claros.

Reduzir a jornada de trabalho já!
A insatisfação dentro das empresas é cada vez maior. Além dos salários arrochados, as condições de trabalho estão cada vez piores. A crise provocou um aumento brutal da jornada de trabalho e o governo é cúmplice da super exploração. Além de serem obrigados a cumprir muitas horas-extras sob ameaça de demissão, os trabalhadores ainda enfrentam doenças. O problema das lesões é extremante grave para a classe trabalhadora e criam limitações que interferem na sua vida profissional e pessoal. Exigimos do governo Lula uma legislação que proteja os lesionados, que estão à mercê dos patrões nas fábricas.

Diante do aumento brutal do ritmo de trabalho, defendemos o fim do banco de horas e a imediata redução da jornada de trabalho para 40 horas, sem redução de salários e de direitos. Precisamos conquistar a jornada de 40 horas para arrancar dos patrões e do governo a redução para 36 horas. Além de gerar empregos, a medida vai proteger os trabalhadores das jornadas extenuantes

* colaborou Felix Mann, de São José dos Campos (SP)

Post author Jeferson Choma, da redação*
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