Onda de greves no estado coloca governadora contra a parede

O primeiro “Rio Greve do Norte” ocorreu em 2011 com a entrada em greve de várias categorias do funcionalismo público, entre elas policiais civis e professores da rede estadual, além dos motoristas e cobradores do transporte coletivo, e outras categorias como os funcionários do Detran e da Secretaria de Tributação.

Em 2012, surgem as mobilizações de rua que levaram a derrubada da prefeita de Natal, Micarla de Sousa (PV). Ela foi afastada em 31 de outubro sob a acusação de cometer irregularidades com recursos da saúde e sob uma reprovação popular quase unânime, superior a 95%.

Hoje se anuncia uma combinação dos dois processos anteriores. Os trabalhadores e estudantes continuam indo às ruas reivindicando o passe-livre e mais verbas para a saúde e educação, com passeatas, ocupações da prefeitura e da Câmara Municipal; e o funcionalismo público entrando em greve por suas reivindicações específicas e pelo “Fora Rosalba” (Rosalba Ciarlini, do DEM, é a governadora do Rio Grande do Norte).

Trabalhadores da saúde na vanguarda
Diferente dos anos anteriores, este ano quem está na vanguarda das mobilizações são os servidores da saúde, que já estão em greve há mais de uma semana.

Foram realizadas muitas atividades de rua, como a marcha do dia 2 de agosto até a governadoria e a ocupação temporária da Secretaria de Administração; assim com a vigília no hospital Walfredo Gurgel no dia 7, onde acenderam 200 velas lembrando a quantidade de mortes mensais ocorridas lá por falta de insumos, condições de trabalho e funcionários. Nos 3 anos de governo Rosalba são cerca de 8 mil mortos. No dia 8 houve a entrada na Assembleia Legislativa juntamente com os policiais civis, quando encostaram na parede o Secretário de Planejamento.

Isso sem descuidar da greve em cada local de trabalho, montando comando de greve nos principais hospitais. Comandos que organizam os plantões, as trocas e as principais atividades, além de realizarem palestras temáticas, produzidas pelo ILAESE a cada dois dias. Nesta quarta-feira, dia 14, haverá a primeira reunião do Comando Geral da Greve.

Tal atuação faz com que essa seja a greve mais forte que a categoria já realizou. Por isso, na assembleia da sexta-feira, 9 de agosto, eles decidiram continuar em greve. Afinal, o governo, de fato, não contemplou nenhum ponto da pauta de reivindicações e somente acenou com propostas de formar uma Comissão de Revisão do Plano de Carreira e pagar, dia 31 de agosto, os cortes ilegais que ele fez na folha de pagamento (parcelas de férias pagas, incorporação no salário base das gratificações negociadas no ano passado, transformadas em lei e não cumprida, e de diversas gratificações).

 “A criação de uma comissão é muito positivo, pois precisamos fazer uma revisão urgente nas distorções que existem, mas não dá pra sair da greve com isso. Até porque durante três meses eles não nos receberam. A negociação só ocorreu depois que a greve começou”, confirmou a coordenadora do sindicato Simone Dutra. Por isso a disposição de luta é grande, Adriana de Sousa, técnica de enfermagem e membro da diretoria adiantou: “Vamos esperar até essa semana. Se não fomos atendidos, vamos reduzir ainda mais o número de gente trabalhando aqui”.

Os grevistas também exigem melhores condições de trabalho, pois a saúde no estado é um caos absoluto. Há falta de materiais básicos em todos os hospitais. No Monsenhor Walfredo Gurgel, por exemplo, o maior do estado, “faltam desde sondas vesicais, cânulo de traquéia, até luvas, ampolas e fitas de HGT (aparelho que mede a glicose). O Hospital está superlotado com pacientes espalhados em macas pelos corredores, inclusive aguardando leitos para a UTI e ortopedia” como explica a diretora Rosália Fernandes. Seus corredores estão tão cheios que às vezes não há espaço nem para a circulação do carrinho que distribui a alimentação dos pacientes.

Quando o governo tentou transferir os pacientes para outros hospitais, para evitar o escândalo público, não tinha ambulâncias pois, das 12 do Samu, apenas 5 estão funcionando, devido à retenção de macas no interior do Hospital.

No Hospital Santa Catarina, onde trabalha Simone Dutra, a história é a mesma: “São 51 leitos na maternidade para cinco pessoas que trabalharam no final de semana todos com excesso de trabalho”. O governo, que se diz tão preocupado com a repercussão da greve junto à população, tentou fechar a UTI deste hospital, mas foi barrado pela mobilização dos trabalhadores e da comunidade.

Os serviços ambulatoriais, testes do pezinho e vacinas, no caso da maternidade, estão sendo encaminhados para as Unidades de Pronto-Atendimento (UPA) e Unidades Básicas de Saúde da Família. Mas estas, como as dos bairros Pajuçara e Potengi, estão superlotadas.

O caos na saúde é tanto que até o líder do prefeito na Câmara de Natal, Júlio Protásio (PSB), está demissionário e anuncia uma manifestação para o dia 17 em protesto contra fechamento do Posto de Saúde do Conjunto Jiqui.

Os servidores apresentaram uma contraproposta para o fim da greve, com cinco pontos para cumprimento imediato. Eles exigem: devolução imediata do que foi tomado em julho, através de uma folha suplementar; aplicação da tabela salarial calculada pelo Dieese; pagamento dos 22% e demais gratificações aos aposentados; convocação imediata de 380 concursados e manutenção da comissão criada para rever o PCCR.

 “Não dá pra ficar com um técnico de enfermagem cuidando de 17 pessoas. Isso é assim todos os dias, não só na greve”, afirma Simone.

Rosália informa que por isso “na próxima terça-feira (13), os grevistas sairão em caravana em direção ao município de Mossoró, com a finalidade de suspender as atividades do Hospital Regional Tarcísio Maia. Para quarta (14) já esta marcada a reunião do Comando Geral de Greve e na sexta (16) vai ocorrer um ato e uma manifestação do conjunto do funcionalismo estadual pelo Fora Rosalba”.

Mas ataques vão vir. O Ministério Público, seguindo as determinações do governo, que recentemente chamou a categoria de “filho que está com a mesada cortada”, já publicou o procedimento preparatório para a investigação da greve no Diário Oficial, que pode resultar em inquérito e responsabilização criminal.  O que surpreende os trabalhadores é que o MP não faz nada contra o descaso da governadora com a saúde e nem quando o governo não cumpre a lei municipal, que lhe obriga a integrar as gratificações ao salário base da categoria, que ele mesmo assinou.

Policiais promovem enterro simbólico
Também sem proposta do governo, os agentes da Polícia Civil continuam com sua greve, e esta semana realizaram um protesto em frente à sede da Governadoria. Fincaram na grama 365 cruzes, em alusão aos homicídios não resolvidos no Rio Grande do Norte.

De acordo com órgãos fiscalizadores da Segurança Pública estadual, em torno de 95% dos homicídios não são desvendados por falta de provas técnicas. Um levantamento recente feito pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos comprovou que dos 444 homicídios ocorridos em Natal ao longo de 2012, somente 22 deles foram elucidados, um percentual de 4,95% do total. O instituto técnico de perícia potiguar está entre os de pior estrutura humana e material em todo o país.

Com a paralisação da Polícia Civil, as delegacias especializadas não estão funcionando. Nas Distritais, os policiais estão fazendo apenas flagrantes e BO’s para liberação de corpo no Instituto Técnico e Científico de Polícia do Rio Grande do Norte (Itep-RN).

Mas a situação vai se agravar pois esta semana o Itep deve entrar em greve também. Afirmam que somente vai funcionar o serviço de recolhimento de cadáveres e não serão feitas perícias ou emissões de documentos.

Professores também entram em greve
Os servidores em Educação deflagraram também sua greve na segunda-feira, 12. A pauta de reivindicações tem nove pontos, entre os quais o pagamento das horas de trabalho excedente aos professores; pagamento da carga suplementar e das gratificações dos diretores e vice-diretores, cortadas no mês de julho; e pagamento aos professores recém-ingressos que estão sem receber – alguns desde fevereiro de 2013 e outros há 3 meses.

Sem falar no pagamento da tabela salarial devida desde 2011. Outra reivindicação é a implementação imediata do planejamento para quem está em sala de aula. Assim como a reforma e manutenção das escolas. Um levantamento realizado pelo sindicato demonstra que 94,6 % das escolas estão comprometidas com a precária estrutura física das unidades.

“Fora Rosalba!”
 Todo este processo de luta pode se unificar no “Fora Rosalba” com o grande dia estadual de luta que ocorre nesta sexta-feira (16). Muitos dos grevistas comentam que “o fim de Rosalba será pior que o de Micarla” e que “se derrubarmos Rosalba já esta bom, não precisamos ganhar mais nada”.

Seus próprios aliados como os senadores Garibaldi Alves (PMDB) e José Agripino Maia (DEM) já estão abandonando o barco. Na semana passada, para piorar, ao não repassar o duodécimo integral do Poder Judiciário e do Poder Legislativo, Rosalba abriu uma crise institucional entre os poderes.

O povo exige sua saída. O repúdio é total e sua aprovação está em apenas 8%. Seja por impeachment, renúncia ou derrubada, o povo do Rio Grande do Norte quer “Fora Rosalba”. E são unânimes em dizer que não dá para esperar o finalzinho do mandado, igual Micarla. Tem que ser agora.

Amanda Gurgel do PSTU apresenta projeto do passe-livre
Em meio a todo este processo de mobilização no estado e na cidade de Natal, a vereadora Amanda Gurgel do PSTU apresentou, junto com os vereadores do PSOL, um Projeto de Lei que poderá instituir o passe-livre em Natal e que deverá ser apreciado pela Câmara de Vereadores. O projeto apresenta iniciativas que poderão efetivar o passe-livre para estudantes de todos os níveis e desempregados natalenses.

Os protestos nas ruas da capital são a base do projeto. Principalmente em relação à diminuição do lucro dos empresários do setor de transporte e, além disso, ao impedir que a Prefeitura de Natal isente as empresas privadas, reservando 1% do orçamento anual do Município para subsidiar o transporte público. “O transporte deixou de ser um direito do cidadão e passou a ser uma fonte de lucro. Nós defendemos o passe-livre não somente como uma bandeira, mas sim como um direito”, demonstrou Amanda.